- O Globo
Quando se aventa a possibilidade de usar o parlamentarismo para superar a crise institucional que se avizinha no horizonte, parece que queremos repetir os acontecimentos como farsa política. Mas está se armando uma situação que nos faz regredir no tempo, justamente na montagem de um governo disfuncional como o produzido pelas eleições de 1960, quando Jânio Quadros foi eleito presidente com Jango, vice de outra chapa.
Naquela época havia a possibilidade de eleger o presidente de uma chapa e o vice de outra, pois todos os cargos recebiam votos diretamente. A chapa Jan-Jan, eleita pelo voto popular, não tinha nada entre si, e agora é lembrada para justificar possível ruptura entre PMDB e PT, prenunciada ontem por ninguém menos que o vice Temer, que explicitou a decisão do PMDB de ter candidato em 2018 à Presidência.
O compromisso do PMDB com o governo pode se esgotar na aprovação do ajuste fiscal, e a partir daí Temer poderia deixar a coordenação política para se dedicar ao plano anunciado. "Vamos viver o momento. Chegou nossa hora de apresentar proposta para construir no Brasil uma sociedade de classe média forte", diz o ex-ministro Moreira Franco, hoje presidindo a Fundação Ulysses Guimarães, responsável pela execução do projeto presidencial da sigla.
O primeiro passo foi dado ontem, com o lançamento da plataforma digital, pois "estávamos com uma presença nesse mundo digital muito pobre, e não há a possibilidade de pensar uma campanha presidencial viável se você não tem uma presença no mundo digital competente, poderosa", analisa Moreira Franco.
No fim do mês haverá reunião com governadores, prefeitos de capital, seus vices e presidentes de diretórios para falar sobre esses temas, e apresentar proposta de governo com 15 pontos para desenhar o Brasil que o PMDB quer. Essa proposta será levada para discussão país afora, a partir de meados de agosto, com o objetivo de fazer um congresso em Brasília em outubro com presidentes das Câmaras municipais, vereadores, prefeitos e vice-prefeitos, diretórios estaduais e as bancadas de Câmara e Senado, o conselho político, cerca de 3,5 mil a 4 mil pessoas com voto, para aprovar esse programa.
Ponto fundamental é garantir a estabilidade, os fundamentos macroeconômicos que, como ressalta Moreira, o PMDB tem apoiado desde FH, "e fomos críticos quando eles não estavam sendo cumpridos": equilíbrio fiscal, controle da inflação. Outro ponto essencial é a liberdade de imprensa. E a segurança jurídica.
Nas eleições de 2016 essa posição do PMDB já vai ficar clara. A disposição é ter candidatura competitiva, o que quer dizer, segundo a sigla: tropa, logística, modernidade tecnológica, programa que atenda às expectativas das pessoas. "Hoje há necessidade quase física de tranquilidade. O ambiente está tenso, tensão institucional, a pior de todas, pois gera insegurança", diz Moreira.
E ele tem razão. Com a Lava-Jato de terça, com busca e apreensão em casas de parlamentares, estamos caminhando para uma crise entre Judiciário e Legislativo. Tanto Renan quanto Cunha começaram essa ação pró-ativa no Congresso depois que foram indiciados na Lava-Jato. Estão reagindo a isso, criando fatos políticos que atrapalham o governo e mostram a força deles.
Querem criar um ambiente que lhes permita alegar, quando (e se) forem indiciados, que são perseguidos por questões políticas. Agora que a polícia está chegando mais perto do Congresso, a situação vai ficar mais tensa, tanto entre Congresso e Executivo, porque Cunha e Calheiros estão convencidos de que é o governo, por meio do ministro da Justiça, que está incentivando a ação contra eles de MP e PF, e também em relação ao Judiciário.
O procurador-geral Janot está sendo perseguido por Collor, Calheiros e Cunha há tempo. A tentativa de constranger o MP, desmoralizar Janot, é evidente.
Todos esses movimentos foram na expectativa do confronto. Como há cerca de 10% do Congresso investigados na Lava-Jato, e muitos serão presos e condenados, vai haver realmente esse confronto entre Legislativo e Judiciário, com o Executivo enfraquecido no meio.
É nesse ambiente conflagrado que o PMDB se pretende alternativa para 2018, mas pronto para eventualidades atuais. Só é bom lembrar que nossa experiência com uma chapa conflituosa, como a de Jânio e Jango, acabou na renúncia do presidente e no parlamentarismo. Estaríamos repetindo a crise com os sinais trocados.
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