• 2015 também trouxe a conta do primeiro mandato
- Valor Econômico
O ano de 2015 ainda não terminou, mas quando 31 de dezembro chegar, o saldo será muito diferente do que foi imaginado no seu início. No dia 2 de janeiro, a média dos 100 analistas consultados pelo Banco Central esperava um crescimento de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), acompanhado por uma inflação de 6,56% ao ano quando medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), uma taxa Selic de 12,50% no fim do ano, quando a taxa de câmbio estaria em R$ 2,80.
Os mesmos analistas hoje projetam uma queda real do PIB de 3,05% (estimativa em constante revisão para baixo), com inflação em 9,91%, Selic de 14,25% e câmbio em R$ 4,0.
O que saiu tão diferente?
Na campanha presidencial de 1992 nos Estados Unidos, James Carville, assessor de Bill Clinton na disputa com George Bush pai cunhou a frase "É a economia, estúpido!", que acabou resumindo o espírito dos eleitores, mais preocupados com a recessão do que com a guerra do Golfo. Como se sabe, Clinton venceu.
Os brasileiros hoje estão preocupados com seu emprego e com a inflação que corroi a renda e faz com que eles saiam dos supermercados com sacolas cada vez mais vazias, mas a política é um dos elementos que explicam porque 2015 ficou tão pior que o esperado. Outro conjunto de justificativas está na herança deixada pelo governo Dilma 1 para Dilma 2. No lado externo, nada veio muito diferente do projetado, com exceção do "atraso" na decisão do Federal Reserve sobre o aumento dos juros, uma das poucas notícias boas do ano. A China deu alguns sustos, mas cumpriu o script.
Em janeiro, poucos analistas acreditavam que o governo encerraria o ano entregando um superávit primário de 1,2% do PIB, que vinha com a chancela do novo ministro Joaquim Levy. Nenhum analista, porém, previa um novo déficit. As apostas "factíveis" giravam entre um primário de 0,5% e 0,7% do PIB.
Principalmente por uma brutal frustração de receitas, a expectativa de pequeno superávit virou um déficit que pode chegar a 2% do PIB (se todas as "pedaladas" forem pagas e nenhuma receita extra for confirmada). No orçamento aprovado para 2015 (inflado pelo governo e mantido pelo Congresso) projetava-se R$ 1,447 trilhão de receitas com um PIB crescendo 0,8% no ano. A última revisão (ainda otimista e construída com um PIB que cai 2,44%) já aponta arrecadação bruta de R$ 1,318 trilhão, R$ 129 bilhões a menos! Pelo lado das despesas, o "corte" de R$ 70 bilhões sobre o orçamento desenhado (e não sobre o realizado em 2014) pouco vale, mas a redução de R$ 40 bilhões em gastos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e em despesas discricionárias é bom sinal.
Em parte, a frustração de receitas é conjuntural e reflete a recessão desse ano, a menor lucratividade das empresas em 2014 e 2015 e a queda no nível de emprego formal. Mas analistas têm apontado que a mudança estrutural da economia nos últimos anos (com menor peso da indústria e maior participação dos serviços) e a perspectiva de menor formalização dos trabalhadores projetam, para o futuro, uma dinâmica menos favorável entre PIB e arrecadação, indicando que parte da frustração com receitas também é estrutural e veio para ficar.
Um segundo elemento com consequências além do esperado é a operação Lava-Jato. O fim do esquema que ela revelou obrigou a Petrobras a rever planos de expansão e o envolvimento das maiores empreiteiras do país ampliou ainda mais suas consequências negativas sobre o investimento. Some-se a falta de confiança dos empresários de todos os setores e a ausência de qualquer perspectiva de retomada e o investimento vira pó. No fim de 2014, a média de 15 analistas consultados pelo Valor Data estimava alta de 0,4% no investimento em 2015. Hoje, já há quem projete queda de 15%.
A Lava-Jato e o fiscal se juntam no político. E esse trio explica e alimenta a falta de confiança, que por sua vez afeta as intenções de investimento e de consumo das empresas e das famílias. Quanto mais demora a reação da confiança, menos o país cresce, menos a arrecadação reage, maior fica o problema fiscal. E a recessão caminha para 3%.
Parte do ajuste fiscal proposto pelo governo no começo do ano foi rechaçada no Congresso Nacional, inclusive com o voto do PSDB, partido antes conhecido pelo compromisso com a austeridade fiscal. Nesse embate, a oposição farejou espaço para ampliar ainda mais a fragilidade do governo, mas não operou sozinha. Em meio à falta de comando da presidente, PT e Lula fizeram - e fazem - oposição ao ministro Levy e à mudança de rumo na política econômica, enquanto o vice-presidente, Michel Temer, apresenta seu programa de orçamento base-zero e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, prepara sua defesa no Conselho de Ética ao mesmo tempo em que mantém os pedidos de impeachment da presidente sobre sua mesa.
A crise política amplia, mas não explica sozinha a insegurança dos agentes econômicos. 2015 também apresentou a conta de mal feitos do primeiro mandato. Nela, o que cabe à presidente nas denúncias envolvendo a Petrobras não é a do benefício pessoal com atos de corrupção, mas o permitir que uma empresa pública fosse gerida da forma como o foi, com indicações políticas e não técnicas. No fiscal, a conta que cabe é das más escolhas, entre elas o aumento das renúncias e desonerações fiscais (R$ 100 bilhões a mais em quatro anos), a excessiva concessão de crédito subsidiado pelos bancos públicos e o uso dos preços administrados e do câmbio para controlar a inflação, todos componentes da chamada nova matriz econômica.
No começo de 2015, os analistas se dividiam sobre o momento em que a economia voltaria a crescer. Os cenários embutiam realinhamento dos preços, volta do compromisso fiscal, aumento da taxa de juros pelo Banco Central, um pouco de recessão nos primeiros trimestres e a inflação fazendo o ajuste de outros preços, como salários. Essa combinação, aos poucos, permitiria a volta da confiança dos agentes. Para alguns, o Brasil voltaria a crescer só em 2016; para outros, no fim de 2015. Essa possibilidade aparecia, inclusive, em cenários ortodoxos.
O que estava fora da conta era a crise política na proporção em que se instalou em 2015. E que ameaça 2016.
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