O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro mostra um agravamento na situação de descontrole inflacionário justamente quando se esperava uma melhora, depois de o Banco Central colocar a taxa básica de juros no maior patamar em dez anos. Isso aumenta as incertezas no cenário econômico de 2016, que já era muito ruim devido à falta de um rumo claro para a política fiscal, e dificulta a retomada da confiança de empresas e consumidores.
A inflação medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi de 0,82% em outubro, uma considerável aceleração em relação aos 0,54% apurados em setembro. A variação do índice acumulada em 12 meses subiu de 9,49% para 9,93%. Foi a maior alta de preços capturada pelo IPCA para meses de outubro desde 2002.
Uma boa parte da inflação de outubro, é bem verdade, deve-se ao que os economistas chamam de choques de oferta, que não tendem a se repetir ao longo do tempo. É o caso, por exemplo, do reajuste de preços de combustíveis, que subiram 6,09% e, sozinhos, tiveram um impacto de 0,3 ponto percentual no IPCA do mês. A recente alta do dólar também puxou alguns preços.
A questão é que a inflação brasileira, que já era alta na partida, devido a descuidos na política monetária entre 2010 e 2012, tem se acelerado neste ano devido a uma sequência de choques. Quando não é a conta de luz, é o dólar. Quando não é o dólar, são as tarifas de ônibus. Quando não são as tarifas de ônibus, são os combustíveis e o dólar, de novo.
Esses eventos, que o Banco Central chama de ajuste de preços relativos, mas que para a maior parte da população representa nada mais do que a carestia, está levando os analistas econômicos a projetarem um ambiente permanente de inflação alta nos próximos anos. A inflação em dois dígitos, num país que ainda não se livrou dos mecanismos de indexação da época da hiperinflação, significa que o aperto monetário atual terá efeitos cada vez menores para conter o avanço de preços na economia, a despeito de a recessão ser uma das mais graves da história.
Para 2016, por exemplo, o mercado financeiro já prevê uma variação de 6,29% do IPCA e não será surpresa se nas próximas semanas as estimativas avançarem acima do teto da meta de inflação, de 6,5%. O consenso do mercado é que o centro da meta, de 4,5%, já não será cumprido em 2017.
O Banco Central parece ter certa razão quando diz que o cenário parecia mais promissor, até surgirem maus sinais do lado fiscal, como o envio ao Congresso de uma proposta orçamentária prevendo déficit no ano que vem. Até então, a perspectiva era de uma estabilização da inflação no segundo semestre de 2015 e uma queda pronunciada no começo de 2016. Inflação sob controle permitiria cortes de juros, abrindo caminho para a demanda doméstica atuar como motor auxiliar das exportações líquidas na retomada do crescimento econômico.
Diante do quadro fiscal em deterioração, o Banco Central reviu a sua estratégia para colocar a inflação na meta - seu horizonte agora é 2017, e não mais 2016. Mas como o governo e o próprio Banco Central agem para suprir o déficit de credibilidade acumulado nos últimos anos, a simples promessa é pouco. Os mercados cobram do Banco Central apertos adicionais na taxa de juros, como se a política monetária não fosse já severamente contracionista.
Na semana passada, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Altamir Lopes, disse, com uma rara clareza, que a instituição está pronta para aplicar o remédio amargo, caso seja mesmo necessário. Também afirmou que estaria disposto a agir "independentemente do nível de atividade que se apresente". Se isso de fato ocorrer, é possível que a recessão em 2016 seja ainda mais severa do que a queda de 1,5% no Produto Interno Bruto (PIB) hoje prevista pelos analistas econômicos.
Muitos deles dizem que, dada a frágil situação fiscal, apertos monetários não surtiriam efeito para baixar a inflação. O BC tem dito com todas as letras que não acredita nisso. É possível que os juros funcionem. Mas espera-se que o governo tenha a sabedoria de não combater a inflação - cuja origem é essencialmente monetária, mas hoje reflete muito da fraca posição fiscal - com mais juros. O ajuste nas contas públicas é, no momento, o caminho mais adequado.
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