- O Estado de S.Paulo
Juro baixo é crucial para retomada, mas é insuficiente para destravar investimento
Ainda faltam duas semanas para a próxima reunião do Copom, mas os juros certamente ocupam posição de destaque nos “trending topics” da economia. Não porque haja grandes dúvidas sobre a trajetória da taxa Selic, como acontecia em passado não muito distante, mas porque a redução dos juros virou a grande esperança de fortalecimento da retomada, a curto prazo. Mais ou menos como o remédio único da homeopatia, que é específico para cada paciente, independentemente das doenças que o ataquem no momento. Varejo fraco? Juro baixo nele. Desemprego forte? Juro baixo nele.
O diagnóstico e a terapia, é claro, estão perfeitos. Não dá para imaginar uma reação vigorosa da atividade econômica sem uma derrubada igualmente vigorosa dos juros. Até porque a inflação continua escorregando para baixo e, na taxa acumulada em 12 meses, já está claramente abaixo do centro da meta fixada para o ano – 4,08% em abril frente a 4,5% –, a ponto de reavivar o debate sobre a conveniência de revisar o alvo para 2018. Além, é claro, de fixar uma meta mais reduzida para 2019. No momento, depois de cinco reduções consecutivas, a taxa Selic está em 11,25% ao ano, o que corresponde a um juro real pouco acima de 6%, ainda um recorde mundial e bem acima dos padrões civilizados.
Se é questionável o nível em que se encontra a taxa básica de juros, o que se pode dizer das taxas na ponta do crédito? Aquelas que o cidadão comum paga para financiar um carro ou que a pequena empresa paga para oxigenar seu capital de giro. Nesse caso, a questão não é mais de civilização, é quase de moral e bons costumes. O culpado, como sempre, é o tal de spread bancário, que mede a distância entre o que o banco paga aos investidores para captar recursos de investidores e o que ele cobra de quem toma empréstimos. Nas linhas de crédito para pessoas físicas, por exemplo, apesar do marketing do dia seguinte do Copom – em que bancos anunciam solenemente cortes de taxas de juros ao tomador final –, os juros situavam-se em março, em média, em 41,4% ao ano – chegando a 135% no caso de crédito pessoal não consignado e incríveis 328% no cheque especial.
O governo anuncia novo ataque indireto ao spread, com mudanças na legislação que facilitariam aos bancos a retomada do bem financiado, em caso de inadimplência, e, pelo menos em tese, dariam mais confiança na concessão de empréstimos. Mais uma tentativa bem-vinda, mas que, como sempre, acaba esbarrando na concentração bancária e nos efeitos nocivos sobre a competição – ou melhor, a falta de competição no mercado.
No balanço do primeiro ano de seu governo, o presidente Temer destacou a derrubada dos juros como um dos principais feitos na direção da retomada do crescimento. Temer e a equipe econômica certamente esperam melhorar o astral com relação ao quadro da economia real – afetado, nos últimos dias, pela divulgação de um punhado de indicadores negativos – com o balanço fechado da atividade econômica do primeiro trimestre, entre eles o IBC-Br, que será anunciado hoje. Tanto o IBC-Br como o PIB devem confirmar um avanço razoável no nível da atividade no início do ano. Segundo antecipou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no caso do PIB, essa evolução deve ficar pouco abaixo de 1% sobre o quarto trimestre de 2016 – um dado favorável, ainda que influenciado pela mudança de metodologia feita pelo IBGE nos números do comércio e de serviços.
Porém, se a terapia do juro baixo está sendo crucial para essa retomada, tudo indica que é insuficiente para funcionar como “puxadora” de um crescimento mais robusto. Já há indicações de que, depois desse primeiro trimestre positivo, virá um segundo mais acanhado, confirmando a tendência de que os espasmos de crescimento ainda convivem com uma paralisia da economia.
Especialistas alertam para a necessidade de combinação de vários outros fatores, além do juro baixo, para desinterditar o circuito que vai de uma retomada cíclica – como a que parece estar ocorrendo, no momento – para uma recuperação mais consistente. Entre eles, a volta dos investimentos – principalmente do setor privado, já que os investimentos públicos estão limitados pelo teto de gastos e os programas de concessões e parcerias só agora começam a engrenar. Tudo isso, contudo, ainda leva tempo e depende da derrubada de uma barreira resistente, que é o elevado endividamento das empresas.
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