Mesmo sem apoio das ruas, presidente atua para reformas avançarem
Leticia Fernandes e Eduardo Barretto | O Globo
-BRASÍLIA- O presidente Michel Temer completa um ano de governo na próxima sexta-feira com 9% de aprovação — mais impopular do que a ex-presidente Dilma Rousseff quando sofreu o impeachment — mas demonstrando força suficiente no Congresso para negociar a aprovação de reformas polêmicas, como a da Previdência e a trabalhista. O presidente centra esforços na recuperação da economia e na esperança de deixar um legado como um “presidente reformista”. Depois de muita articulação política, conseguiu aprovar a reforma trabalhista na Câmara, não sem precisar de reforço dos ministros-deputados para domarem suas bancadas e darem votos pró-governo.
Reconhecido por deputados e senadores como um homem do Parlamento e do diálogo, Temer começou sua gestão num clima de lua de mel com o Congresso, que lhe concedeu vitórias — que começaram ainda na interinidade à frente do Planalto — como a aprovação da proposta que limitou o crescimento dos gastos públicos e do projeto de renegociação da dívida dos estados, além da regulamentação da terceirização e o projeto de repatriação de ativos no exterior. Temer tem a fama de receber a todos em seu gabinete, e costuma encher a agenda com parlamentares e até autoridades municipais, além de ser frequentador de almoços e jantares de bancadas do Congresso, como a ruralista.
— Finalmente voltamos a ter diálogo com o governo. A Dilma nos recebia de pé, sem paciência para conversar com o Congresso — lembra um dos líderes do governo.
Se a largada foi fácil na relação com o Congresso, mais recentemente, porém, o presidente começou a lidar com dificuldades impostas pela própria base que sustenta o seu governo, e retaliou, exonerando aliados de cargos no governo para cobrar votos alinhados na reforma da Previdência, o carro-chefe de sua gestão. Esse gesto, feito depois de traições na votação da reforma trabalhista na Câmara, foi visto com preocupação por aliados próximos, que temem que a medida não se traduza em votos quando a Previdência chegar ao plenário.
— Se um deputado da base perdeu as indicações, por que vai votar com o governo nas reformas mais difíceis do Congresso? Os parlamentares não recebem bem essa pressão direta do governo. Seria melhor recebê-los e conversar. É uma postura muito arriscada — avalia um aliado de Temer.
Em reunião recente no Palácio da Alvorada, quando foi definida a estratégia de punir aliados infiéis, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), foi um dos entusiastas da ideia. Apesar das turbulências, Temer conseguiu na última semana aprovar a proposta sobre a Previdência na comissão especial da Câmara com bom placar: sem gordura, mas dentro do esperado.
Até mesmo a maneira de falar foi se transformando ao longo do primeiro ano. O presidente já não usa mesóclises, mas faz questão de manter a fala rebuscada e a formalidade, usando em seus discursos palavras como “acoelhar” e “higidez”, que confundem os seus interlocutores. Em um discurso em janeiro, chegou a brincar com o próprio estilo:
— Eu ia dizer “fá-lo-ei”. Não vou usar mesóclise, senão vão me criticar.
Contudo, expressões como “de fora a parte”, “ao depois” e “exata e precisamente”, são alguns de seus “bordões”.
A falta de apoio das ruas tem sido uma preocupação constante de Temer, a ponto de atrapalhar seus compromissos como chefe de Estado. Um dos casos mais marcantes ocorreu no velório do time da Chapecoense, depois de um acidente aéreo que matou 71 pessoas em novembro, e que teve a presença do presidente confirmada somente horas antes do evento. Nas aberturas da Olimpíada e Paralimpíada, no Rio, Temer havia sido vaiado, e desde então, sua popularidade não decolou, o que fez visitas a cidades passarem a ser analisadas cuidadosamente pela equipe de assessores. Eventos fora de Brasília acabam quase sempre ficando restritos a auditórios e lugares fechados, para evitar manifestações que atinjam ainda mais o presidente.
Quando a forte desaprovação persistiu, após os primeiros meses, Temer passou a ressaltar que não se preocupava em ser “populista”, e que seria mais cômodo “ter a burra cheia de dinheiro” e não fazer ajustes fiscais, mas que os fazia por serem importantes para o país.
SEM DISCURSO EM REDE NACIONAL
O envolvimento de boa parte de seus aliados e de vários ministros nas denúncias da Operação Lava-Jato também marcaram seu primeiro ano. Alguns de seus amigos mais próximos, como os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves, além do advogado José Yunes, tiveram de deixar o governo após denúncias. O próprio presidente foi citado por delatores, que descreveram sua participação em reuniões nas quais se buscava contribuições para campanhas do PMDB, e cujos recursos teriam sido repassados via caixa dois. Temer, no entanto, não será investigado enquanto estiver no cargo.
Seu principal problema jurídico é a ação no Tribunal Superior Eleitoral que pede a cassação da chapa que integrava com a ex-presidente Dilma Rousseff em 2014. A expectativa na corte é que o relator do caso, ministro Herman Benjamin, peça a condenação de Temer e Dilma, com a consequente cassação do mandato. O presidente, no entanto, joga com o tempo e acredita que diante dos prováveis pedidos de vista e dos recursos cabíveis completará o mandato.
Na próxima sexta-feira, 12 de maio, dia exato em que assumiu interinamente a cadeira de presidente, Temer fará uma cerimônia no Planalto. Está praticamente descartada uma fala do presidente em rede nacional na TV. O temor é que haja panelaços nas ruas.
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