Igor Gielow | Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Presidente do Instituto Teotônio Vilela, do PSDB, e um dos principais articuladores da velha guarda da sigla, o ex-senador José Aníbal (SP) afirma que o partido cedeu a práticas "com elementos de transgressão" e que "uma autocrítica é imperativa".
Defensor do apoio a Michel Temer (PMDB), ele diz que o PSDB pode sair do governo após votar reformas e vê uma janela até o fim do ano para isso. Considera Geraldo Alckmin (SP) o presidenciável do partido e critica o prefeito paulistano, João Doria.
"Não está claro o que ele significa como gestor", diz Aníbal, que faz 70 anos dia 9 e afirma não saber se irá disputar eleição em 2018 –é citado para o governo paulista.
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Folha - Como o sr. vê a situação do governo Temer após a "rejeição da denúncia da PGR"?
José Aníbal - Propícia para encaminhar as reformas. Com certeza avançar na reforma previdenciária, a idade mínima e acabar com regimes especiais. O Brasil tem de ter de uma noção de tudo o que se faz contra essa reforma. E não é nas ruas não, é nos escaninhos do poder, dentro das instituições.
Na política, além da cláusula de barreiras e do fim das coligações, temos de tentar o voto distrital. Isso nos resolve em grande medida a questão do financiamento da campanha. Com o voto distrital, é adesão ao candidato em cada distrito, é privado. Imagine o eleitor com voto distrital, com 10 ou 12 candidatos num ambiente de 500 mil eleitores aqui em São Paulo. Aí alguém diz: "Mas o Centrão...". Bom, o Centrão tem práticas com as quais não concordamos, incompatíveis com uma postura republicana.
É viável com a turbulência política?
É. Veja os 21 votos do PSDB contra Temer na votação da denúncia, eles reiteraram o compromisso com as reformas. E há o DEM, o PSD. A votação da Previdência será um desafio maior.
Há um desejo difuso na sociedade por um novo Brasil. O sistema político que está aí acabou e as contas públicas estão devastadas. Você não faz novo Brasil com um "fiat lux", você faz com enfrentamento de desafios.
O principal é o sistema de privilégios que abocanha os recursos públicos. Agora mesmo a nova procuradora-geral [Raquel Dodge] falou em aumento de 16% [para procuradores]. Isso é um insulto à sociedade brasileira. Leia jornal, veja a realidade das contas! Está na hora de mais sensatez.
Os políticos no Brasil têm um medo de conversar objetivamente com a sociedade. Reforma não derruba prestígio de parlamentar. O que derruba é corrupção, é manter o sistema político que está aí.
A campanha já começou, é exequível uma agenda mais ampla?
O Brasil perdeu quase 10% do PIB, com desemprego, perda de renda. Se não fizermos isso, o próximo presidente começa o mandato como pato manco. É pegar ou largar. Tem um lado positivo. Esses políticos que estão aí votaram o teto, a mudança do ensino médio, a mudança na lei do petróleo e a reforma trabalhista. É preciso trabalhar esse lado. É evidente que precisa fazer isso até outubro, novembro.
Portanto, temos três meses de oportunidade que não se pode desperdiçar. Todas as forças políticas comprometidas com a mudança têm de estar nela. Por isso eu vejo a posição do PT como profundamente conservadora, atrasada.
Desde a delação da JBS, o PSDB está num divã público. No plenário na quarta, o ministro Antonio Imbassahy negociava emendas para obter apoio ao governo, e deputados votavam contra Temer. Como explicar isso?
O PSDB foi colocado em uma situação inusitada. Desde as denúncias atingindo a direção do partido até as dificuldades enormes que o governo teve de criar uma maioria em torno da ideia de que o presidente não cometeu crime. Muitos viram o afastamento do presidente como uma solução, mas a maioria identificou corretamente que isso não resolveria coisa nenhuma. A manutenção do presidente, por si só, não resolve também. Mas há um compromisso reiterado agora de fazer o avanço final nessas duas ou três reformas.
O PSDB teve seu presidente alvejado na Lava Jato, houve a ascensão dos cabeças pretas, há a ambiguidade no vaivém de ficar no governo. Isso não mostra um quadro de esfacelamento da sigla?
Não. A centralidade do PSDB está ficando clara nos últimos dias e será aprofundado nos próximos meses, principalmente nas reformas. O PSDB ficar ou sair do governo não é questão central. Passadas as votações, o PSDB pode decidir como quiser. Sobre nossos mais jovens, essa divisão é uma bobagem. Já disse que se eu pintar o cabelo, serei um cabeça preta. Nós estamos rompendo com isso.
O PSDB foi açodado na discussão sobre a substituição de Temer, depois da eclosão da delação? O [presidente interino do partido] Tasso Jereissati foi açodado?
Não. Olha, cada um procurou avaliar com as informações que tinha uma alternativa, tendo como pedra de toque a destituição do presidente. Mas com o tempo ficou claro que esse processo seria muito doloroso.
Como o sr. avalia a situação do [presidente licenciado do PSDB, senador] Aécio[Neves (MG), acusado na Lava Jato]? Ele deveria ter saído? Não parece que o PSDB protege os seus?
Não. Acho que ele entregou ontem a presidência para o senador Tasso. Ele quer fazer um programa de governo que realmente responda ao desafio imenso colocado pela exposição das vergonhas e possibilidades do Brasil.
Vergonhas do PSDB também. Não falta autocrítica? Onde o partido errou?
A autocrítica é imperativa. O partido errou em práticas políticas nas quais concedemos à cultura com elementos de transgressão. Participamos do processo de construção de maioria parlamentar. Mesmo a questão das emendas, que é legal, dá uma margem de manobra muito grande ao Executivo. Isso tem de acabar.
O sr. coloca uma solução dentro da política, institucional. Mas se fala de que há o desejo pelo "novo", que FHC identificou como Luciano Huck e João Doria no campo tucano. É possível mudar com as figuras que estão aí, ou será preciso sacar um novo nome?
Tudo pode acontecer. Se prevalecer o salvacionismo em 2018, teremos uma situação semelhante à de 1989, quando o segundo turno teve dois salvacionistas, Collor e Lula. Agora pode surgir alguém.
O quanto pior melhor só interessa aos salvacionistas. Sem detrimento ao combate à corrupção, a sociedade quer mudança, um Natal melhor. Cabe a nós políticos interpretar isso. A última coisa que a política deveria contemplar é a eleição do ano que vem.
Nesse cenário, o PSDB tem um candidato, o Alckmin, que representa a institucionalidade, e o Doria, que tem esse caráter salvacionista. O sr. concorda?
O Doria teve uma eleição magnífica, e tem pela frente um grande desafio, que é focar na gestão em São Paulo. É o que o PSDB e São Paulo esperam dele. Quando penso na eleição do ano que vem, falo de outro candidatos, destacadamente Alckmin.
Como o sr. avalia a agenda nacional do Doria, em contraposição às críticas que o sr. mesmo fez a pontos de gestão básicos, como capim, semáforos quebrados...
Buracos.
Buracos. Como o sr. vê essa dicotomia?
Eu entendo que ele está tentando vender São Paulo num sentido positivo. Mas o resultado disso é de longo prazo, o que não desconsidero. Na realidade, ele está sendo demandado como novidade, como político que confronta o PT, com o que poderia fazer. Aí é que está o problema. Não está muito claro o que significa o Doria como gestor público. Tem muitos enunciados, mas os resultados ainda são muito precários.
Alguns tucanos dizem que Doria chegou tarde e, como no ditado, "quer sentar na janelinha". O que o sr. acha?
Eu acho a expressão meio vulgar. Diria que ele, movido por um resultado eleitoral espetacular, achou que teria condição do ponto de vista de gestão que lhe daria uma projeção grande. Mas estamos vendo que isso é insuficiente.
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