- O Globo
A expectativa de que o país chegasse ao último trimestre do ano com crescimento mais forte, como prometia o governo, está indo por água abaixo desde a divulgação da conversa entre Temer e Joesley Batista. De lá para cá, as projeções para os últimos três meses do ano, comparados a 2016, caíram de 1,9% para 1,4% e há números mais baixos. A recuperação deve ser mais lenta que o previsto no segundo semestre.
Logo após o dia 17 de maio, quando o colunista Lauro Jardim divulgou a gravação em O GLOBO, houve uma mudança completa nos preços dos ativos financeiros. Dois meses e meio depois, o dólar, a bolsa, o risco-país voltaram aos níveis de antes. Tudo pareceu absorvido. Mas nos indicadores que realmente importam, como as projeções do PIB, as mudanças foram significativas. Para o ano cheio de 2017, as estimativas recuaram de 0,5% para 0,34%, e o pessimismo começa a contaminar os números do ano que vem. Para 2018, houve queda de 2,5% para 2%, segundo o boletim Focus.
— Antes da divulgação, a gente previa um crescimento entre 2% e 2,5% no último trimestre do ano, sobre o mesmo período de 2016, que era um número forte. Agora, já baixamos para 1%. O segundo semestre será mais de estagnação do que de recuperação — explicou o economista Alexandre de Ázara, da Mauá Investimentos.
Olhando os dados trimestre contra o trimestre anterior, esse cenário fica mais claro. O Ibre/FGV, por exemplo, projeta uma alta de apenas 0,1% no terceiro trimestre, e crescimento zero no quarto. Na média do ano, alta de apenas 0,2%, diz o economista Júlio Mereb.
— A boa notícia é que ninguém vislumbra um cenário de volta à recessão. É um quadro de estagnação. Mesmo com a postergação das reformas, a direção da equipe econômica foi mantida e isso evitou o pior cenário — explicou.
Mereb destaca a queda das importações de bens de capital nos sete primeiros meses do ano. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, houve retração de 29% em relação ao mesmo período do ano anterior. As importações já voltaram a dar sinal de vida nos bens intermediários (+12%) e nos bens de consumo (+5%), mas ainda mostram um cenário de baixo investimento.
O choque político sobre a economia ocorreu no momento em que a retomada começava a ganhar tração. O PIB cresceu 1% no primeiro trimestre, o desemprego teve a primeira queda desde 2014, a inflação despencou, os juros caíram a um dígito e as importações voltaram a subir no acumulado em 12 meses, após três anos consecutivos de queda. Algumas linhas de financiamento também melhoraram na ponta, segundo o economista Nicolas Tingas, da Acrefi, e houve queda da inadimplência no primeiro semestre. Mesmo assim, ninguém espera uma explosão do crédito, apesar da redução da taxa Selic:
— Para as empresas, já se observa queda em algumas taxas para capital de giro, o que favorece o fluxo de caixa e a renegociação de dívidas. O custo do endividamento está em queda. Mas não será o crédito que irá puxar a retomada, ele é pró-cíclico, segue a tendência do PIB. O cenário é de mais qualidade e seletividade nos empréstimos.
Esse cenário de fim da recessão traz o alívio de diminuir o temor do desemprego. Quem está empregado ficará com a sensação de ter “sobrevivido”, diz Alexandre de Ázara, e isso terá um efeito positivo sobre o consumo. Ele avalia que haverá mais vendas, mesmo com a estabilização dos salários. O grande problema é que o número de desempregados no país é enorme, são 13,5 milhões de brasileiros sem trabalhar.
— Um ponto interessante da queda do desemprego é que, mesmo com o PIB estagnado, ele começou a cair. Isso mostra que o PIB potencial diminuiu. No curto prazo, será um alívio, porque a taxa deve continuar caindo mesmo. Mas, no longo prazo, revela que o país tem pouca capacidade de crescer sem gerar inflação. Por isso, é preciso aprovar as reformas — pontua Ázara.
A economia chegou ao mês de agosto evitando uma nova recessão, após o agravamento da crise política, mas perdeu força na recuperação. A divulgação da delação de Joesley Batista atingiu o cenário de melhora gradual e constante que estava na maioria dos painéis.
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