- O Estado de S. Paulo
Custo dos votos para barrar a denúncia contra Temer preocupa área econômica.
O governo pode enterrar de vez qualquer possibilidade de melhoria do resultado das contas públicas em 2018 se passar o carro na frente dos bois e deixar que a discussão de uma proposta de reforma tributária ganhe prioridade na agenda econômica do Congresso até o fim do ano.
Não vai ter espaço para nada além de mais barganha política com base nos amplos e complexos interesses que cercam toda mudança no campo tributário.
É muito estranho que lideranças políticas do governo tenham corrido para alardear que a agenda da reforma tributária poderá ganhar protagonismo (na frente da reforma da Previdência) bem no minuto seguinte à decisão do plenário da Câmara dos Deputados de barrar a denúncia contra o presidente Michel Temer.
A que serve essa estratégia a não ser tumultuar as negociações das medidas econômicas mais urgentes? Ainda mais na véspera de ano eleitoral. Será muito difícil, por exemplo, o governo negociar propostas de elevação de tributos para 2018 – como já está evidente que será proposto pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles – em meio à discussão de mudanças amplas no sistema tributário.
Cada projeto enviado ao Congresso na área tributária encontra estrada aberta para incluir “jabutis” muito bem compensados pelos beneficiários das mudanças. A “reforma tributária”, como está sendo colocada, a essa altura, não passa de termo elusivo e pode significar qualquer coisa.
Não há um projeto fechado, como ocorreu com a proposta de reforma da Previdência. Quando se coloca no papel as propostas para novos tributos, acabou consenso. Porque todo mundo é a favor da reforma, mas ninguém quer abrir mão de nada.
Os setores mais prejudicados pelas mudanças (e isso inclui não só empresas, pessoas físicas, mas também Estados e municípios) vão jogar todo seu poder de influência para se proteger de eventuais perdas. É nesse ponto que ganham os parlamentares com ações menos republicanas, enquanto um verdadeiro “exército” de advogados tributaristas já dominam há tempos os gabinetes parlamentares em Brasília.
Não é por menos que o governo vive hoje uma situação absolutamente surreal em torno das negociações dos diversos programas de refinanciamento de dívidas, o Refis. Em pouco mais de quatro meses, já foram quatro Refis oferecidos e, mesmo assim, os beneficiados ainda não estão satisfeitos com os descontos negociados.
Foi o que aconteceu com os prefeitos que foram recomendados a não aderirem ao Refis, criado para a quitação de dívidas dos municípios. O prazo de adesão mal acabou, mas novas negociações já começaram a ser feitas pelos líderes. A eles foram prometidos novos e maiores descontos para depois da votação da denúncia.
É isso que justifica a baixa adesão dos prefeitos, mesmo sob o risco de serem punidos por irresponsabilidade fiscal. Já sabem que terão nova chance de adesão. Líquido e certo. O mesmo vale para o Refis para empresas e pessoas físicas (o Pert) que já foi desfigurado por duas vezes pelo relator e os líderes do governo acenaram com uma nova negociação em “torno de acordo intermediário” à revelia da recomendação do Ministério da Fazenda.
É esse cenário que leva a equipe econômica a conviver com tamanha incerteza de receitas, que tem contribuído para o aumento do déficit, embora as despesas estejam abaixo do limite do teto de gastos. A preocupação do momento da área econômica diz respeito à incerteza em relação à dimensão do tamanho do custo oculto dos votos para barrar a denúncia contra Temer.
Enquanto a área econômica fica negociando as “pautas-bomba” na área de receitas, vai se perdendo tempo no avanço de outras medidas mais urgentes. A discussão da reforma tributária por um governo que continua na corda bamba da governabilidade vai só aumentar o alcance dessa barganha. É preciso preservar as receitas do governo para que a população não tenha de pagar com mais impostos nos próximos anos.
Balão de ensaio. Erra quem ainda avalia que a discussão do governo em torno da mudança da meta fiscal não passa de balão de ensaio. O debate está longe de ter vindo da área política, como se tenta difundir. Ele partiu da própria equipe econômica que não quer ser responsabilizada pelo descumprimento da meta ou por uma mudança tardia.
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