O presidente Donald Trump não para de demitir gente do primeiro escalão da Casa Branca e, a julgar por sua impulsividade, mais confusões são previsíveis, e mesmo inevitáveis. Dentro dos próprios padrões de Trump, ele se superou na semana passada, ao dizer que havia "gente boa" entre racistas e nazistas de Charlottsville, e mandar para casa um dos maiores responsáveis por sua vitória, Steve Bannon, ideólogo e estrategista-chefe. Incontrolável, o presidente diz asneiras em série com convicção, o que consolida a cada dia o quadro de franca desmoralização de sua administração.
Após os incidentes com uma morte na Virginia, Trump deu declarações escorregadias no sábado, atraindo ira e estupefação pela não condenação explícita à extrema-direita, na qual mantém boa parte de apoio. No dia seguinte, o chefe de gabinete John Kelly deu ao presidente um script do que deveria dizer e Trump condenou os "supremacistas" brancos. Dois dias depois, em uma entrevista que deveria ter como tema o programa de infraestrutura do governo, diante de um Kelly contrariado, e provavelmente surpreso, Trump reabriu a crise em potencial ao equiparar racistas da Ku Klux Klan à esquerda que se manifestava contra eles.
O caso do oitavo membro a deixar o governo Trump em sete meses, Steve Bannon, é mais ou menos semelhante aos anteriores e os motivos, iguais - desavenças na equipe. Bannon, em entrevista a um jornal de esquerda, desqualificou a posição de Trump sobre a Coreia do Norte, disse que uma guerra levaria a um morticínio impensável, e pregou uma luta sem armas contra a China país que, para ele, assumirá a liderança global no futuro, ultrapassando os EUA.
Há mais extremistas do protecionismo como Bannon no governo, mas ele bateu de frente com o genro do presidente, Jared Kushner e, especialmente com Gary Cohn, ex-executivo do Goldman Sachs e presidente do Conselho de Nacional de Economia da Casa Branca, qualificado pejorativamente de "globalista". Trump alinhou-se com o genro, enquanto que o fogo amigo sugeria que Bannon vazava informações do governo para a mídia. Vaidoso, Trump não gostava da ideia de que seguia as orientações de Bannon.
Não foi a primeira vez que o presidente teve de tomar partido entre a ala nacionalista e protecionista do governo e a outra, um pouco mais liberal. O fato é que a agenda protecionista pela qual o presidente se elegeu não está sendo levada a ferro e fogo, como advogava Bannon. Depois de prometer acabar com o Nafta, os EUA engajaram-se em negociações com México e Canadá. As investigações sobre dumping do aço chinês, com base no argumento da ameaça à segurança nacional, deixou de ser perseguida rapidamente por pressão de empresários, e a investigação contra a China por violações dos direitos de propriedade intelectual seguirá um ritual próprio, naturalmente demorado.
Sete meses de improvisação serviram para minar fortemente a credibilidade de Trump e dar razão aos que o julgavam um líder sem as mínimas qualidades para exercer o cargo e incapaz de governar. Os republicanos tiveram de engolir sapos para elegê-lo e o custo de apoiá-lo está se mostrando alto e crescente. O partido teme os efeitos das trapalhadas do presidente nas eleições de 2018. Uma pesquisa encomendada pela NBC e divulgada no fim de semana mostrou que os temores não são infundados. Em Estados que garantiram a vitória de Trump, os "swing states" de Michigan, Pennsylvania e Wisconsin, sua taxa de aprovação caiu abaixo de 40% (FT).
As defecções republicanas, poucas mas decisivas no caso do Senado, onde o predomínio sobre os democratas é de 2 votos, tendem a crescer no tenso ambiente criado pela volubilidade de Trump. Uma das opções para virar esse jogo, desde que o presidente não atrapalhe, é colocar na pauta do dia a reforma dos impostos, com corte para as empresas e os mais ricos, uma bandeira permanente do partido. As divergências internas sobre isso existem, especialmente por parte da ala mais fiscalista, que se preocupa com os déficits mais altos que a redução de tributos irá provocar. A coordenação política terá de avançar na questão mantendo o presidente afastado, pois ele já mostrou que é um desagregador e não tem o menor dote conciliatório.
É impossível dizer que a estratégia vai dar certo, porque Trump só segue sua própria cabeça e aumentará o custo do apoio político ou rebaixará o horizonte do que é possível obter com seus projetos.
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