- O Globo
Mudança para melhor, além do ganho fiscal. Foi o governo dizer que está pensando em sair da Eletrobras, e as ações subiram 50% num dia. Ainda que caiam um pouco para corrigir exageros, ficou claro que a avaliação geral é de que o Estado é um peso sobre a empresa. A privatização pode representar uma enorme mudança para melhor no setor de energia, e não apenas o caminho de atingir a meta fiscal.
“Temos que refletir sobre essa valorização da ação porque ela mostra como a presença do Estado aumenta a incerteza”, disse Paulo Pedrosa, secretário-executivo do Ministério das Minas Energia.
O setor está no meio de uma mudança de regulação para tentar expurgar todo o modelo desordenado e intervencionista criado pela MP 579. Não era bom antes, mas piorou bastante espalhando prejuízos e irracionalidades. Na semana passada, foi encerrada a fase de consulta pública e agora os técnicos do Ministério se dedicariam a redigir a MP do novo marco para setembro. Com a decisão de privatizar a Eletrobras, a prioridade passou a ser a MP que vai preparar a empresa para a venda. Mas o secretárioexecutivo do MME diz que a proposta do novo marco será feita e tem boa base para o trabalho:
— A qualidade do material que recebemos é excelente. Foram consultadas cinco universidades, recebemos estudos muito bons que nos permitem trabalhar.
Entre as correções a fazer no sistema está o que eles chamam de GSS. Por esse fator de escala de geração, as hidrelétricas, quando há risco hidrológico, são obrigadas a gerar menos e contratar a energia das térmicas para entregar:
— Por exemplo, se elas venderam energia a R$ 160, têm que comprar a R$ 500 para entregar e isso está destruindo a receita das hidrelétricas — explica Pedrosa.
Mas se o risco hidrológico não ficar com as geradoras, os preços da energia podem subir. Pedrosa explica que há outro caminho para que não haja impacto tarifário, que é dar mais tempo para concessão. E já existe um acordo nessa direção.
O setor de energia é um politraumatizado. Além da presença sempre grande do Estado, a intervenção da MP 579 causou fraturas múltiplas. Por outro lado, sempre foi cômodo para todas as empresas envolvidas, e caro para o Tesouro, a construção das grandes hidrelétricas feitas com subsídio embutido em empréstimos baratos e garantias dadas pelo Estado.
— O setor girou durante muito tempo com base nos subsídios altos e empréstimos muito baratos que favoreceram as hidrelétricas distantes e as linhas de transmissão que acabam tendo um preço artificial. Temos que parar de interferir e iludir a sociedade sobre o custo de certos projetos. Precisamos aumentar a eficiência do setor e não inibir a expansão das novas renováveis. Sair do modelo subsidiado para o de valorizar com realismo as fontes verdadeiramente competitivas — diz Pedrosa.
O diretor-executivo do Instituto Acende Brasil, Eduardo Müller Monteiro, compara o desempenho da Eletrobras com o da Engie Brasil, empresa originada da privatização em 1998 da Eletrosul, que era subsidiária da estatal. A Eletrobras acumulou prejuízo de R$ 27,4 bilhões entre 2012 e 2016, enquanto a Engie lucrou R$ 7,3 bi. Olhando apenas para o ano passado, a Eletrobras, com receita de R$ 60 bilhões, lucrou R$ 3,5 bi. A Engie com R$ 6 bi de receitas teve lucro R$ 1,5 bi. A Eletrobras tem 23 mil trabalhadores, a Engie opera com 1,1 mil. No final de junho, enquanto o valor de mercado da estatal era de R$ 18 bilhões, o da empresa privada chegava a R$ 22 bi:
— Em 2016, a Eletrobras gerou uma receita de R$ 2,64 milhões por empregado, enquanto a Engie gerou R$ 5,82 milhões. Em valor de mercado, a distância aumenta: R$ 780 mil por empregado (Eletrobras) contra R$ 20 milhões por empregado (Engie).
Contas assim começaram a ser feitas ontem, para calcular quanto a empresa tem a ganhar quando houver um sistema de governança que impeça a indicação de diretores por políticos, a interferência do governo, as regras limitadoras das estatais.
— Veja que mesmo com o Wilson (Ferreira) lá, o mercado ainda acha o Estado um risco. O Estado é como um leão na sala de visitas. O leão pode estar quieto, mas há sempre o risco de que ele ataque — compara Paulo Pedrosa.
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