- O Globo
Venda da Eletrobras deveria modernizar o setor. O governo vai usar parte do dinheiro da privatização da Eletrobras para subsidiar energias fósseis, sujas e caras. É isso que significa o fundo que ele está propondo para tornar mais atraente a venda da empresa para os políticos. Está sendo apresentado como uma fórmula que vai reduzir altas futuras de energia. É falso, porque os recursos acabarão. Além disso, é um equívoco.
O modelo que está sendo proposto é criar um fundo para ser usado quando houver queda do volume de água nos reservatórios e for preciso usar as térmicas. Seria uma espécie de mitigador da alta da energia provocada pelo uso das térmicas. Por que o governo não pensa em forma mais contemporânea de resolver esse problema?
Existem soluções verdadeiras e atuais. Pode-se estimular o desenvolvimento de energia fotovoltaica, eólica, biomassa e geração distribuída. O argumento contra as fontes solar e eólica são de que elas são intermitentes e que é preciso energia firme que a térmica pode garantir. Quando não chove, venta e faz sol. Quando tem menos vento, é o período úmido. Pode-se pensar num programa de fechamento das térmicas mais caras. O governo não só não faz, como no ano passado cancelou um leilão de energia de reserva com fontes renováveis e, além disso, marcou para este dezembro um leilão de energia a carvão.
Há problemas ainda não resolvidos. Para vender as seis distribuidoras estaduais que foram federalizadas, a Eletrobras terá que assumir a dívida dessas empresas, que é enorme. As empresas do Acre, Amazonas, Alagoas, Piauí, Roraima e Rondônia são deficitárias, endividadas e tiram valor da Eletrobras. A estatal tem valor de mercado de R$ 30 bi, e valor patrimonial de R$ 46 bi.
Outro atrativo que o governo quer incluir no projeto de privatização é reservar parte do dinheiro para a transposição do Rio São Francisco. O importante é saber se haverá águas a transpor no futuro. O Brasil precisa levar a sério a proteção das seus cursos de água. Alguns rios estão entrando em colapso com a sucessão de anos secos e o uso intensivo e sem critério. É preciso um programa verdadeiro para proteger as margens do São Francisco e um plano de salvação dos rios brasileiros. Além de punir o crime sem castigo cometido pela Samarco contra o Rio Doce.
Nada se pensa com visão no futuro. A privatização da maior empresa do setor deveria ser o início de mudanças na geração e transmissão de energia. O governo Dilma tomou muitas decisões erradas na área. Basta ver o que aconteceu com as hidrelétricas da Amazônia, feitas a ferro e fogo. As usinas do Madeira cortaram 50% da produção porque a linha de transmissão não foi corretamente aterrada. Foi feita em cima de pedras de granito. As duas custaram R$ 40 bi e foram feitas à custa de muitos absurdos. Houve até uso da Força Nacional em Jirau para que a obra prosseguisse em determinado momento.
No Nordeste, o aumento da eólica nos últimos anos ocorreu por insistência da indústria do setor, porque o governo tratava essa fonte com o mesmo desprezo com que olha a fotovoltaica. E se não fossem os bons ventos a região teria enfrentado rigorosa escassez de energia nos últimos anos de seca prolongada.
Hoje o país só não tem crise de abastecimento porque o PIB não cresce. Se crescer 4% pode ter um aumento de 6% no consumo. Isso significa que a oferta teria que crescer 4 GW. Não há essa previsão de entrada no sistema. É preciso olhar esses pontos de estrangulamento, mas com visão nova e não para fortalecer os velhos lobbies que povoam o setor.
A privatização da Eletrobras tem um fato promissor que é o fim das indicações políticas para os cargos de direção das várias empresas da estatal. Ou seja, é boa pelo que ela evita. Mas ideias como a de subsidiar energia fóssil mostra que não se pensa em como modernizar o setor de energia no Brasil, mas sim em como fechar o caixa do ano que vem.
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