- O Globo
O sistema financeiro teve que absorver R$ 200 bilhões de perdas das empresas com a recessão e a Lava-Jato. O crédito às famílias já voltou. No ano que vem, o país passará por momentos de muita volatilidade cambial, mas o BC reduziu de US$ 115 bilhões para US$ 24 bi sua posição nos swaps cambiais e tem enorme volume de reservas. Assim a economia se prepara para a eleição mais difícil desde a redemocratização.
A recuperação da economia será lenta pela natureza da crise. Foi uma recessão de alavancagem, como dizem os economistas. Houve um aumento grande do endividamento das famílias na época do boom, pelos estímulos dados pelo governo. Para quitar as dívidas, o consumo despencou. Neste caso, o padrão é a volta lenta ao nível de atividade. As famílias brasileiras tiveram que fazer o ajuste em situação difícil: a renda caiu, e mesmo assim as dívidas foram reduzidas. Após a desalavancagem, elas voltaram lentamente a aumentar o consumo e a tomar crédito. Há cinco meses cresce o crédito para as famílias. Em relação às companhias, voltará mais devagar, mas pode se normalizar nos próximos dois meses.
Na origem da crise, houve também o endividamento das empresas. Elas foram abatidas pela queda do PIB e enfrentaram ainda o problema do envolvimento das grandes companhias nos casos de corrupção. Grupos empresariais foram à lona, pediram recuperação judicial, acumularam passivos com as multas ou acordos de leniência, e tiveram que enxugar atividades e ativos para continuar operando. Tudo isso provocou, por reflexo, um abalo numa série incalculável de firmas pelo Brasil afora. Alguns economistas temiam que a crise das investigadas da Lava-Jato fosse provocar uma onda de inadimplência e quebras sucessivas de empresas. Uma crise sistêmica. Tudo foi grave, mas a economia conseguiu digerir esse volume colossal de dívidas não pagas.
Na avaliação de quem acompanha com minúcias o que se passa no sistema financeiro, o pior passou e a situação do crédito ao mundo corporativo começa a dar sinais de normalização. Na semana passada a FGV, através do Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos, anunciou oficialmente que a recessão, que havia começado em meados de 2014, terminou no fim de 2016. Mas essa recuperação será diferente das outras por estes dois fatores: a recessão teve na sua origem o excesso de alavancagem e houve o fator complicador de empresas estarem envolvidas em escabrosos casos de corrupção. Todas as grandes empreiteiras e a maior empresa de alimentos do país foram apanhadas em atividades criminosas. Além disso, a maior empresa do país, a Petrobras, foi abalada diretamente. Tem sido uma crise tripla: econômica, corporativa e política.
Agora está começando a recuperação. A ideia de que o PIB está subindo porque caiu é uma explicação simplista. Houve acertos na condução da política econômica e muito esforço privado para esse resultado. Os dados têm oscilado, mas a tendência está clara em todos eles: o Brasil recomeça a crescer. Porém, será uma recuperação diferente das outras. Nas duas grandes recessões anteriores, dos anos 1980 e 1990, a alta foi forte. Desta vez, será bem mais difícil.
Uma das razões é a incerteza política. Muitas empresas que têm planos de investir vão esperar um ano antes de realizar os projetos porque dependem do que ocorrerá na eleição do ano que vem. Os bancos estão com liquidez e capacidade de financiar o investimento, mas não haverá demanda porque o grau de incerteza nesta eleição é maior do que nas anteriores. O crédito vai parar de cair em breve, mas as grandes operações devem ficar em suspenso por enquanto.
O ritmo do crescimento no ano que vem será modesto, mas os economistas começam a ter previsões mais otimistas. O governo mandou ao Congresso, embutida no Orçamento, a projeção do PIB de 2%. O Banco Central divulgou seu cenário com uma taxa de 2,2%. Alguns economistas apostam em 2,5% ou até 3%. O país começa a deixar para trás a mais prolongada recessão da sua história, mas será uma saída lenta e sujeita às turbulências políticas dos tempos atuais.
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