segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Angela Bittencourt: PIB fraco ou dólar forte, cabos eleitorais de arrepiar

- Valor Econômico

Custo do "hedge" dispara e investidor busca alternativas

Taxa de crescimento é informação relevante na agenda econômica em qualquer país do mundo. Raramente o resultado surpreende, por ser perseguido rigorosamente por analistas. Bom ou ruim, o dado oficial sinaliza se manter projetos de investimentos vale a pena e ajuda o cidadão a ter uma ideia sobre questões do seu interesse imediato. A economia vai andar o bastante para gerar mais empregos ou as demissões podem aumentar? O juro pode subir e encarecer o crédito ou existe alguma chance de cair e abrir uma brecha para o consumo? O resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do 2º trimestre, que o IBGE divulgará na sexta-feira, esclarecerá poucas dúvidas, mas deve aquecer o debate sobre as perspectivas de crescimento em 2019.

O PIB do 2º trimestre, se existir algum, será de 0,1% em relação ao anterior, projetam, em média, 22 economistas consultados pelo Valor Data. Esse desempenho é largamente esperado. A greve dos caminhoneiros comprometeu duramente a atividade em diversos setores e nem todos os efeitos foram dissipados. Somando-se a isso a persistência de um câmbio pesado, é improvável que o PIB do 3º trimestre seja mais que medíocre. No ano, o PIB poderá avançar 1% ou um pouco mais. Afinal, 2018 recebeu uma herança estatística de 1% do PIB de 2017. Na prática, porém, o Brasil não terá crescido neste ano.

Em paralelo aos impactos da greve, a falta de dinamismo da economia reflete a falta de confiança compartilhada de A a Z. Em 2018, provavelmente, a taxa de investimento da economia será a menor desde 1947. E não tem escapatória, uma vez que investimentos baixos que pesam no PIB do ano corrente do lado da demanda, pesam no PIB futuro pelo lado da oferta.

A propósito, para 2019 a expectativa do mercado é de expansão de 2,50% - um crescimento até modesto para a necessidade. O novo presidente, afinal, será cobrado a atender os anseios de 13 milhões de desempregados e mais 13 milhões de subempregados.

A encrenca que o próximo presidente vai enfrentar é cristalina. Não está claro, porém, qual é o "presidente" que os 2,5% de crescimento comportam. Será o reformista que o mercado defende como o indicado para executar os ajustes e as reformas fiscais pendentes? E se o presidente eleito for menos reformista ou for um reformista sem convicção? O PIB continuará crescendo 2,5%? Quais são os pressupostos que o mercado está embutindo em suas contas?

O fato de o candidato Geraldo Alckmin (PSDB), o preferido do mercado para assumir a Presidência, não avançar nas pesquisas de opinião tem sido a principal variável a pressionar a taxa de câmbio, uma vez que o ex-presidente Lula se mantém na liderança das enquetes. E, inelegível, poderá transferir votos a Fernando Haddad (PT) ou a Ciro Gomes (PDT).

Investidores consideram que o horário eleitoral na TV e no rádio poderá resgatar Alckmin do porão, mas não deixam de buscar hedge cambial para suas operações no país. A campanha na TV estreia na sexta-feira, 31. Os presidenciáveis marcam ponto no sábado, 1º de setembro.

Na sexta, o dólar fechou a R$ 4,10. As incertezas eleitorais e as artimanhas fiscais em que assessores próximos de Donald Trump estão metidos determinam o ritmo da volatilidade da moeda para aflição dos mercados emergentes. Mas o estresse cambial também reflete o problema que não foi delimitado pelo governo Temer e está fora do debate entre os presidenciáveis: o imenso desafio fiscal que bate à porta do próximo governo. Entre os principais candidatos à Presidência da República, alguns não olham a questão fiscal com a atenção esperada por especialistas; outros preferem dizer que não existe um problema; e há ainda quem pense em soluções que poderão tornar o abismo fiscal ainda mais profundo.

Lucas Hirata, especialista em Câmbio e Juro do Valor PRO, escreve no Caderno de Finanças desta segunda-feira, que o mercado volta sua atenção para o Banco Central (BC), e dele aguarda algum pronunciamento sobre eventual intervenção no câmbio. Contudo, relata o jornalista, um estudo da MCM Consultores avalia que, por ora, a instabilidade é menor que em outros momentos em que o BC lançou mão de swaps cambiais. A volatilidade média do preço do dólar em cinco dias permanece em nível "relativamente baixo", próximo a 15%. Para efeito de comparação, o "evento JBS " de maio de 2017 levou a volatilidade do intervalo de 5% a 20% (anualizada) para 70%. Foi quando o BC fez sua primeira venda de swap na gestão de Ilan Goldfajn.

Pablo Spyer, diretor de operações da Corretora Mirae Asset, disse à Coluna que a volatilidade reduziu significativamente a liquidez no mercado à vista de dólar, provocando forte alta no custo do "hedge", o que incentivou o investidor a buscar outras soluções para proteger suas operações das variações da moeda. "O cenário internacional e local fez a volatilidade implícita da taxa de câmbio aumentar muito. E nossos clientes relatam dificuldade para comprar até mesmo US$ 1 milhão no mercado (spot), um montante pequeno dada a dimensão das operações cambiais", explica.

O executivo da Mirae pondera que diante de custos crescentes, investidores como "fundos de private equities", que captam recursos no exterior para aplicar em ativo real, estão considerando uma operação até agora impensável: "Até que seja tomada a decisão de investir em determinada empresa ou ativo, cogita-se a possibilidade de remeter ao exterior o dinheiro que foi captado lá fora e já foi internalizado no Brasil. Essa operação começa a ser vista como uma saída para proteger recursos de variações cambiais até a confirmação dos investimentos aqui", relata.

No exterior, explica Spyer, esses recursos de investidores, que evitam arcar com operações caríssimas de "hedge" no Brasil, são aplicados em renda fixa - títulos do Tesouro americano com prazo de 10 anos - com rendimento de quase 3%, já em dólar e livre de riscos cambiais.

"Chegamos a um ponto em que essas soluções alternativas nem fazem sentido, inclusive porque são muito caras. Se o dinheiro já está no país, porque sacar e reinternalizar? Faz sentido um mesmo dinheiro fazer três viagens entre o mercado internacional e o local, sendo duas desnecessárias?", pergunta o diretor.

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