Por Andrea Jubé | Valor Econômico
BRASÍLIA - Mesmo diante do empenho do presidente Jair Bolsonaro em afinar o diálogo com as principais lideranças para estabelecer uma interlocução com o Congresso, caciques políticos seguem refratários ao discurso de pacificação e ainda vislumbram dificuldades na relação de longo prazo com o Planalto. Uma solução discutida reservadamente nas cúpulas dos maiores partidos é criar alternativas para esvaziar os poderes do presidente da República: uma delas seria restringir a edição de medidas provisórias.
Nas últimas semanas, o Congresso já aprovou medidas que desidratam os poderes do Executivo, como as propostas de emenda constitucional (PECs) do Orçamento impositivo e da transferência direta de emendas aos municípios. E em meio à crise no Ministério da Educação, a Câmara criou uma comissão externa para fiscalizar ações de governo relativas ao ensino superior.
Bolsonaro reuniu-se com as cúpulas de 13 partidos nos últimos dez dias, mas o sentimento entre algumas lideranças em relação ao governo continua sendo de receio e incerteza. Persiste o ressentimento com a pecha de "velha política" criada por Bolsonaro, que atirou em um mesmo saco todos os políticos. Além disso, gestos imprevisíveis como a recente ingerência sobre a Petrobras reforçam entre alguns líderes a necessidade de criar mecanismos para refrear os impulsos presidenciais.
Dois dirigentes partidários ouvidos pelo Valor criticaram a proposta de criação de um "conselho de presidentes de partidos" que auxiliaria o presidente. "A criação de um conselho com partidos que não fazem parte da base não se sustenta", diz um líder partidário. "Serão chamados todos os partidos? Os maiores terão a mesma representatividade dos menores?", questionou outro dirigente.
Em meio ao embate com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Bolsonaro foi a público afirmar que já cogitavam a interrupção de seu mandato. "A mídia cria narrativas de que não governo, sou atrapalhado etc. Você sabe quem quer nos desgastar para se criar uma ação definitiva contra meu mandato no futuro", publicou em sua conta no Twitter.
Mas dirigentes das principais siglas ouvidos pelo Valor descartam iniciativas para afastar o presidente: pela ausência de embasamento legal, e porque o país não suporta novo processo dessa envergadura. A emenda do parlamentarismo é uma carta na manga, mas considerada complexa. Um presidente de partido se declara favorável ao novo sistema de governo, mas rechaça sua instituição por casuísmo.
É nesse cenário que os debates giram em torno de se criar mecanismos para esvaziar os poderes presidenciais. A ideia de limitar as medidas provisórias não é nova: em 2009, o então presidente do Senado, José Sarney, mencionou a possibilidade num cenário de esgarçamento das relações do Congresso com o governo Lula. Bolsonaro já editou nove MPs - uma média de três ao mês.
Um veterano do Congresso aponta dois caminhos para limitar as medidas provisórias. O mais simples é o ato de ofício do presidente do Congresso devolvendo a matéria ao Executivo, se constatar a ausência dos requisitos de relevância ou urgência. O outro é a rejeição da matéria pela comissão mista, antes da análise pelas respectivas Casas no plenário.
A opção mais complexa é aprovar uma nova emenda constitucional ampliando o rol de hipóteses em que é vedada a edição de MPs. Essa relação foi ampliada em 2001, e hoje contempla, entre outros temas, a proibição de MPs relativas a nacionalidade, cidadania, direitos políticos, organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, orçamento e planos econômicos.
A PEC do Orçamento impositivo foi aprovada a toque de caixa nas duas Casas, engessando as possibilidades do governo de manejar recursos da peça orçamentária. O texto torna obrigatório o pagamento das emendas parlamentares de bancada previstas no Orçamento. A PEC voltou à Câmara, e deve passar na frente da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Na semana passada, os senadores aprovaram em dois turnos a PEC que permite o repasse de emendas parlamentares diretamente a Estados e municípios sem intermediação do governo federal. Antes o processo passava pelo filtro da Caixa Econômica Federal e os valores poderiam ficar retidos na burocracia federal. Agora os recursos podem chegar diretamente aos caixas de prefeituras e governos estaduais.
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