No fim da semana passada, o país foi surpreendido com a decisão do presidente Jair Bolsonaro de cancelar o reajuste de 5,7% no preço do óleo diesel determinado pela Petrobras. Bolsonaro revelou que ligou para o presidente da estatal do petróleo, Roberto Castelo Branco, exigindo explicações e pedindo que recuasse da decisão.
O presidente questionou o motivo do reajuste do óleo diesel ficar acima da inflação projetada para este ano. Em entrevista na sexta-feira, Bolsonaro disse que estava preocupado também com o transporte de cargas no Brasil e com os caminhoneiros, que "são pessoas que realmente movimentam as riquezas, de norte a sul, leste a oeste e que tem que ser tratadas com o devido carinho e consideração".
Ele disse que quer "um preço justo para o óleo diesel" e informou que terá uma reunião nesta terça-feira com técnicos da Petrobras e ministros de Estado, pois deseja perguntar como o percentual de reajuste do diesel é calculado, quanto custa um barril de petróleo que é retirado no Brasil em comparação com outros países, onde é que o Brasil refina o óleo, a que preço, a que custo e qual é o custo final.
As frases de Bolsonaro levantam uma série de questões, algumas inacreditáveis e outras surpreendentes. É inacreditável, por exemplo, que, passados mais de 100 dias de governo, o presidente da Petrobras ou algum diretor da empresa ou até mesmo o ministro da Economia, Paulo Guedes, não tenham colocado o presidente da República a par da sistemática de reajuste dos preços dos combustíveis, que é pública.
É natural que o chefe da Nação se preocupe com os aumentos dos preços dos combustíveis, pois eles repercutem sobre toda a cadeia produtiva e afetam diretamente os bolsos dos consumidores/eleitores. O impacto da elevação destes preços sobre a inflação e o nível de atividade é conhecido por todos. Assim, é indispensável que o presidente seja informado sobre como esses preços são fixados, com base em que parâmetros. No entanto, isto deveria ter sido feito antes mesmo de sua posse.
Bolsonaro já disse numerosas vezes que não é economista, que não entende de economia e que tem Paulo Guedes para o orientar nessas questões. Mas é surpreendente que o presidente considere estranho que o reajuste do óleo diesel seja maior do que a inflação prevista para o ano.
Não é necessário conhecer os complexos meandros da economia para saber que o preço do petróleo é definido no mercado internacional, cotado em dólar, não mantendo qualquer relação com a inflação brasileira. Quando o preço do óleo sobe, afeta os consumidores do mundo inteiro e não apenas os brasileiros.
Ao questionar o preço do barril de petróleo produzido pela Petrobras, em comparação com o custo em outros países, o presidente da República insinua que se o custo para a estatal brasileira for menor, ela poderia cobrar menos pelos combustíveis. Somente fazendo este raciocínio é possível entender a defesa que Bolsonaro faz de um "preço justo para o óleo diesel". Com toda a certeza, Bolsonaro tinha um público alvo quando fez as declarações: os caminhoneiros, que apoiaram, em sua maioria, o candidato do PSL nas eleições presidenciais. Eles ameaçam nova paralisação e o aumento de 5,7% no preço do óleo diesel poderia ser o estopim do movimento.
Na época da primeira paralisação, Bolsonaro apoiou a greve e criticou os preços dos combustíveis cobrados pela Petrobras. Há um video na internet em que o então candidato à presidência diz que o preço de extração da Petrobras está em torno de US$ 10, enquanto no mercado internacional o preço gira em torno de US$ 80. Para ele, a Petrobras não pode acompanhar os preços internacionais. O mínimo, segundo Bolsonaro diz no vídeo, seria fazer "uma média ponderada" dos preços.
O presidente vai discutir esta proposta da "média ponderada" amanhã, em sua reunião com os ministros e técnicos da Petrobras? Qual será a fórmula imaginada pelo presidente para chegar ao "preço justo para o óleo diesel" e fazer com que ele não suba acima da inflação?
As declarações do presidente adicionaram novas incertezas ao cenário econômico do país, já tumultuado com o lento andar da reforma da Previdência. As palavras de Bolsonaro reduziram o valor de mercado da Petrobras em mais de R$ 30 bilhões, apenas na sexta-feira. O estrago feito na Petrobras pela política de controle dos preços dos combustíveis, adotada no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, ainda está na memória dos brasileiros. O temor é de que essa política se repita.
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