- O Globo
Volatilidade do dólar é elemento a mais de incerteza na economia e sua principal causa é o desgaste na relação de Bolsonaro com o Congresso
Entre os vários problemas da economia brasileira está a instabilidade do dólar. Em pouco mais de três meses, o dólar subiu 12%, saindo de R$ 3,65 para R$ 4,10, no pior momento. Nos últimos dias, caiu um pouco, mas permanece acima de R$ 4,00. Mais do que o patamar em que está, o problema é a volatilidade. Os consumidores têm a sensação de perda de poder de compra, e os empresários têm aumento de custos. Os importadores se retraem, os exportadores aguardam novas altas. Entre as grandes empresas, há aumento das dívidas corporativas. O dólar afeta a inflação e eleva alguns dos preços mais sensíveis, como os combustíveis.
O economista Nathan Blanche, especialista em câmbio e sócio da Tendências Consultoria, diz que a principal variável que está pressionando a moeda brasileira é a crise política, resultado da incapacidade de o presidente Jair Bolsonaro estabelecer uma relação estável e produtiva com o Congresso. Ontem, o presidente da República tomou café da manhã com os presidentes da Câmara e do Senado para firmar um “pacto” a favor das reformas. Mas isso aconteceu na esteira das manifestações que ele estimulou no último domingo e nas quais os líderes do Legislativo, especialmente Rodrigo Maia, foram bastante atacados. Será preciso muito mais do que um simples encontro.
A alta recente do dólar sofreu grande influência desse descompasso entre os poderes.
— O dólar é o principal sensor de risco do mercado, e hoje o que mais pesa sobre o câmbio é a incerteza política. Acreditou-se, após as eleições, que a saída do PT e a base eleita pelo PSL dariam sustentação forte às reformas. Mas estamos vendo que não há harmonia entre o Executivo e o Legislativo. O ritmo das votações foi afetado —afirmou Nathan Blanche.
A XP Investimentos colocou em números essa avaliação. Uma sondagem divulgada esta semana com investidores do mercado financeiro mostrou que a aprovação do governo caiu de 28% para 14%, e os que avaliam o desempenho governista até agora como ruim ou péssimo saltou para 43%. De modo geral, há a confiança na aprovação da reforma da Previdência, mas vem crescendo a visão entre os economistas de que os atritos entre o Executivo e o Legislativo vieram para ficar.
—O mercado acredita na aprovação da Previdência. Mas se antes eu entendia que o dólar cairia para a casa de R$ 3,35 depois da reforma, hoje eu vejo em R$ 3,75. Houve uma perda de confiança e isso se reflete no câmbio de equilíbrio. A moeda americana só não dispara porque temos o Paulo Guedes no Ministério da Economia e políticos como o Rodrigo Maia, no Congresso, que estão atuando intensamente pela aprovação —diz Nathan.
O Banco Central deve anunciar hoje o primeiro dos diversos pacotes que está preparando de mudanças micro com o objetivo de mudar a economia no longo prazo. Desde que assumiu a presidência do BC, Roberto Campos Neto organizou 14 grupos de trabalho para estudar as alterações que pretende continuar fazendo, dentro do que é chamado na instituição de Agenda BC+. Uma das mudanças mais importante é na legislação sob recâmbio. Há regras de entrada e saída de dólar de 1930 a 1950. A burocracia é enorme e as taxas bancárias são muito altas nas pequenas transações.
No Banco Central se trabalha comum calendário de medidas de simplificações que levem o país ater um dia um amoeda conversível. Hoje há demanda de parceiros menores, próximos de nós, de fazer negócios em reais. O Brasil tem uma moeda estável há muitos anos e alto volume de reservas cambiais. No balanço de pagamentos, não há risco de crise cambial, porque o déficit em conta-corrente é baixo. Ainda assim, o BC anunciou que vai manter a venda de dólares no mercado futuro, para suavizara alta do dólar. Hoje, a instituição tem um estoque de US $65 bilhões vendidos, contra US $16 bino melhor momento do governo Temer.
Há um curto prazo de volatilidade do dólar provocada não pelos fundamentos cambiais, mas pelas trapalhadas políticas do presidente e alguns integrantes do seu grupo. Por outro lado, o Banco Central prepara medidas para aumentara liberdade cambial, eliminando burocracias envelhecidas. O Brasil precisa construir o futuro em todas as áreas, inclusive na moeda, mas está prisioneiro das emergências políticas que impedem a superação do devastador momento econômico.
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