Progressistas avançam na Dinamarca, Finlândia e Suécia, enquanto esquerda fraqueja na maior parte da Europa
Lucas Neves / Folha de S. Paulo
PARIS - O Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) ganhou com folga a eleição legislativa de abril passado. Mas até agora seu líder, Pedro Sánchez, não conseguiu se pôr de acordo com o Podemos (mais à esquerda), aliado natural, para formar uma base de sustentação que o credencie a iniciar seu segundo mandato como primeiro-ministro.
Talvez devesse olhar para o norte da Europa e se aconselhar com os chefes da social-democracia na Escandinávia, onde o movimento progressista emplacou três governos na primeira metade de 2019.
Enquanto a esquerda tradicional míngua na França, na Alemanha e na Itália, partidos na Dinamarca, na Finlândia e na Suécia fazem contrapeso à ascensão notável do populismo de direita no continente.
Na Dinamarca, os social-democratas lideraram a votação de junho, mas com índice insuficiente para reconquistar o comando do país sem a anuência do restante do bloco de centro-esquerda. Três semanas depois da eleição, a líder Mette Frederiksen fecharia acordo com sociais-liberais, Partido do Povo Socialista e Aliança Rubro-Verde (de esquerda radical) para virar a mais jovem primeira-ministra dinamarquesa, aos 41 anos.
Ela está à frente de um governo minoritário, algo comum por lá, mas por ora goza do apoio dessas três agremiações para fazer avançar temas centrais de sua agenda, como o combate à mudança climática e o reforço do Estado de bem-estar social, depois de uma década de austeridade.
Na Finlândia, a social-democracia até integrou duas gestões, mas não capitaneava uma coalizão governamental desde 2003. O jejum terminou em abril, quando Anti Rinne, líder esquerdista, desbancou por menos de 8.000 votos o líder do Finlandeses (de direita ultranacionalista) e obteve a prerrogativa de buscar pilares de sustentação para seu mandato. Pactuou com nada menos que quatro outros partidos para isolar o conservadorismo radical.
Já na Suécia, Stefan Löfven pelejou como Sánchez faz agora na Espanha. Após uma eleição inconclusiva em setembro de 2018, em que a diferença entre os blocos de direita e de esquerda foi de uma cadeira no Parlamento, o premiê perdeu um voto de confiança.
Teve de ceder a seu oponente, Ulf Kristersson (Moderados), uma chance de buscar alianças para liderar o país. Este fracassou, assim como novamente Löfven, numa segunda tentativa. Por fim, em janeiro, o social-democrata obteve o suporte de verdes, centristas e liberais para dar a partida a seu segundo mandato.
“O que é comum aos três países é que, sozinha, a esquerda tradicional não vai tão bem em nenhum deles”, diz Rune Stubager, professor de ciência política na Universidade de Aarhus (Dinamarca).
“Seu trunfo é o fato de ser capaz de negociar acordos. Na Suécia, a social-democracia conseguiu inclusive atrair dois grupos que sempre integram o bloco conservador: os centristas e os liberais. Eles romperam com a direita tradicional para manter os Democratas Suecos [terceiros colocados e força que mais cresceu na eleição], de ultradireita, longe do poder.”
O pesquisador vê aí uma diferença fundamental entre as cenas sueca e dinamarquesa, apesar do alinhamento ideológico. Na Suécia, atravessa o espectro político-partidário a convicção de que um “cordão sanitário” deve isolar os radicais de direita. Na Dinamarca, a centro-esquerda flerta com o programa dos nacionais-populistas do Partido do Povo Dinamarquês, sobretudo no que se refere à abordagem linha-dura na imigração.
“Assim, conseguem atrair parte do ‘eleitorado-pêndulo’ de classe média, que é mais conservador em relação ao controle das fronteiras, mas se importa com questões ambientais e é sensível à proposta de baixar a idade mínima para a aposentadoria de trabalhadores rurais”, explica Stubager.
Para assegurar o apoio das agremiações mais à esquerda, como Aliança Rubro-Verde e Partido do Povo Socialista, os sociais-democratas da Dinamarca atenuaram ou suprimiram pontos mais controversos de sua plataforma para questões migratórias. Aqui entram o envio de criminosos estrangeiros a uma ilha isolada e a instalação, em antigas bases militares, de famílias às quais tiver sido negado o asilo.
“Mas são mudanças cosméticas”, afirma o professor. “Os critérios para a concessão de asilo ou as exigências para trazer para cá um parceiro estrangeiro não mudarão.”
Segundo ele, uma boa estratégia para a social-democracia cambaleante do resto da Europa seria seguir o “mix” da dinamarquesa, combinação de reforço do Estado-providência com aceno ao zelo nacionalista de parte crescente do eleitorado. “Não dá para ignorar o partido anti-imigração, dizer que é puramente racista, como na Suécia.”
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