- Folha de S. Paulo
Presidente usa ainda as Forças Armadas, que se deixam usar, para seus propósitos criminosos
A interferência ilegal de Jair Bolsonaro na Polícia Federal pode estar nos fatos, mas não no vídeo tarja-preta. Ingerência sim, crime não. De gravidade inédita é outra coisa: o presidente não investe num autogolpe, mas numa guerra civil. Confessou ainda ter um sistema particular de informações. E usa as Forças Armadas, que se deixam usar, para seus propósitos criminosos.
Trata-se de confissão, não de interpretação: “Por que eu tou armando o povo? Porque eu não quero uma ditadura! (...) É escancarar a questão do armamento aqui. Eu quero todo mundo armado! Que povo armado jamais será escravizado”. A arma é um fermento político. E o crime tem atos de ofício, como evidencio abaixo.
Na reunião, dá ordem a Sergio Moro e a Fernando Azevedo e Silva (Defesa): “Eu peço ao Fernando e ao Moro que, por favor, assine essa portaria hoje que eu quero dar um puta de um recado pra esses bosta!” No dia seguinte, saiu a portaria, que elevou a munição que pode ser comprada por um civil de 200 unidades por ano para 550 por mês.
No dia 18 de abril, ele já havia baixado a portaria 62/20, pondo fim ao rastreamento de armas e munições. Escreveu no Twitter: “Determinei a revogação das Portarias Colog nº 46, 60 e 61, de março de 2020, que tratam do rastreamento, identificação e marcação de armas, munições e demais produtos controlados por não se adequarem às minhas diretrizes definidas em decretos".
As portarias revogadas tinham sido assinadas pelo general de brigada Eugênio Pacelli, do Comando de Logística do Exército. O presidente mandou exonerá-lo da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados sem poderes para isso.
Pacelli passou para a reserva no dia 24 de março. Na despedida, desculpou-se com empresários do ramo de armas por não ter atendido a seus interesses: “Nosso maior compromisso será sempre com a tranquilidade da segurança social”. O de Bolsonaro é outro. O PSOL entrou com uma ação no STF contra a portaria 62. O relator é Alexandre de Moraes.
Não menos grave é a outra confissão: “Sistemas de informações: o meu funciona. O meu particular funciona. Os que têm oficialmente, desinforma.” Que sistema é esse? A deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), ex-aliada da turma, disse à CPMI das Fake News que Carlos Bolsonaro, o amigão de Alexandre Ramagem, queria criar a “Abin paralela”.
Bolsonaro maratonou os crimes de responsabilidade previstos na lei 1.079. E arregaçou a 7.170, de segurança nacional. Poderia pegar até 19 anos de cadeia. General Augusto Heleno ameaçou o país com um golpe, na sexta-feira (22), assinando, literalmente de próprio punho, uma nota que evoca, sub-reptícia e erradamente, o artigo 142 da Constituição.
O golpe de 1964 foi desferido “contra a subversão e a corrupção”. Os corruptos já estão sendo contratados junto ao fundão do centrão. E o subversivo confesso usa o aparelho de Estado e as Forças Armadas para organizar a guerra civil. Um novo Brasil, certo, senhores oficiais-generais?
A propósito: não fosse a demissão de Maurício Valeixo, Moro teria ficado calado em abril, como ficou em março, assistindo ao planejamento da guerra civil?
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