- O Estado de S.Paulo
Bolsonaro chegou ao poder prometendo descomplicar o licenciamento ambiental
O Ministério da Economia minimiza os seguidos e crescentes alertas para o risco de a política ambiental do presidente Jair Bolsonaro se transformar numa ameaça real à retomada mais rápida da economia brasileira depois da pandemia da covid-19.
Paulo Guedes foi o grande ausente da reunião dessa semana do vice-presidente, Hamilton Mourão, com representantes de 10 grandes fundos internacionais que cobram mudanças na política ambiental do governo para seguirem com novos investimentos no País.
A lista de presentes da reunião, divulgada pelo governo, contava com cinco ministros – Braga Netto (Casa Civil), Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Tereza Cristina (Agricultura), Fábio Faria (Comunicações) e Ricardo Salles (Meio Ambiente)–, mas sem a participação de nenhum dos secretários especiais que estão na linha de frente do superministério de Guedes.
Salvo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que no início do ano fez o primeiro alerta sobre o temor que os fluxos de dólares para o País sejam afetados pela imagem do Brasil na área ambiental, que participou da reunião e tem adotado uma postura independente em relação ao problema ambiental. Em março passado, Campos Neto incluiu o BC brasileiro na NGFS, a rede de BCs para “ecologizar” o sistema financeiro, lançada na Cúpula de Paris “One Planet” de 2017.
Na direção contrária, o Ministério da Economia tem preferido se afastar do problema ao invés de tomar a dianteira do diálogo com os investidores, o que seria o mais natural em se tratando dos interlocutores envolvidos: o mundo financeiro e empresarial. O argumento tem sido mesmo: o assunto é com Mourão, presidente do Conselho Nacional da Amazônia criado por Bolsonaro.
O governo faz de conta que ouve os alertas, mas segue com o diagnóstico equivocado de que a pressão faz parte de um movimento geopolítico para atacar os interesses do agronegócio brasileiro.
Ao menos em público, Guedes compartilha da avaliação de Bolsonaro, Mourão e de outros ministros do governo de que existe uma campanha de difamação do País no exterior com viés protecionista, sobretudo da França na área agrícola, e dos Estados Unidos que querem entrar com etanol no Brasil e não aceitam açúcar brasileiro.
Como disse o ex-ministro da Fazenda, Maílson da Nobrega, em entrevista ao Estadão, trata-se, na verdade, de teoria conspiratória. Os 29 fundos que demandaram do Brasil medidas de proteção à Amazônia estão mais preocupados com a perda dos seus aplicadores, cada vez mais exigentes e que não que querem botar dinheiro em países notadamente destruidores do meio ambiente. É o bolso que chama.
Enquanto o governo insiste nas suas narrativas para responder à questão ambiental, a pressão avança em novos terrenos. O gesto inédito de ex-ministros da Fazenda e de presidentes de BC de se reuniram para lançar uma carta em defesa de uma recuperação econômica verde no pós-coronavírus é de extrema importância para o momento delicado da política ambiental brasileira. Ocorre na esteira da chamada coalizão dos ministros de finanças pela ação climática, chefiada pela Finlândia e Chile.
A coalizão é um trabalho político, mas também técnico de como realmente botar a questão ambiental no coração da ação dos ministérios.
Seria essencial que o Ministério da Economia se integrasse de fato ao grupo para garantir um olhar ambiental para o plano de retomada, rompendo o ciclo histórico de afastamento da equipe econômica do debate sobre meio ambiente, com exceção de pontuais incursões ao longo dos últimos 20 anos na área de concessão de crédito e de formulação de políticas de economia energética e de incentivo, por exemplo, às montadoras que produzissem carros menos poluentes.
É preciso reconhecer que o tema ambiental sempre foi muito mais um acessório das políticas centrais de planejamento econômico e motivo de queixas de que é um entrave ao crescimento econômico do País, principalmente das grandes obras de infraestrutura.
Isso não mudou. Não podemos esquecer que a equipe econômica de Bolsonaro chegou ao governo prometendo a vários setores empresariais agilizar e descomplicar as regras de licenciamento ambiental. É para esses empresários que o governo fala e não aqueles que agora cobram o fortalecimento da política ambiental. Quem ganha o embate?
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