O melhor
modo de escapar ao excesso de otimismo é incorporar o princípio da mediocridade
Contra
os vieses lutam os próprios deuses em vão. Uma das ilusões cognitivas mais
danosas e esquisitas de que se tem notícia é a falácia do planejamento, que
pode ser definida como a tendência de pessoas e instituições de subestimar o
tempo e os recursos necessários para a realização de um projeto.
Ela é danosa porque leva governos, empresas e indivíduos a comprometer-se com orçamentos e cronogramas que não conseguirão cumprir, incorrendo em custos adicionais. E é esquisita porque, mesmo sabendo que o viés existe —qual governo ignora que orçamentos estouram e obras atrasam?—, temos enorme dificuldade para compensá-lo —e é por isso que orçamentos continuam estourando e obras atrasando.
Algo
parecido ocorre em relação à Covid-19. Ao menos desde outubro, quando países
europeus começaram a apresentar expressivos aumentos de casos, sabíamos que
segundas ondas eram possíveis. Aqui no Brasil, mesmo cientes desse perigo,
escolhemos ignorá-lo e relaxamos os cuidados assim que os números da primeira
onda trouxeram um alívio.
Não
somos só nós. Os indianos, mesmo tendo assistido ao que aconteceu na Europa,
nos EUA e no Brasil, julgaram-se imunes ao problema e decretaram a volta à
normalidade antes da hora. O resultado é a tragédia numa escala que ainda não
havíamos visto.
A
falácia do planejamento foi identificada pela dupla de psicólogos Daniel
Kahneman e Amos Tversky e é uma das modalidades do viés de otimismo que afeta
nossa espécie quando julgamos nossas próprias capacidades. Mesmo sabendo que
não há razões objetivas para tal, nos comportamos como se operássemos sempre
acima da média e não precisássemos nos preocupar com os cenários mais
negativos.
O melhor modo de escapar ao excesso de otimismo é incorporar o princípio da mediocridade. Não temos nada de especial. Se em algum lugar do mundo houve terceira onda, temos de estar prontos para ela.
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