Presidente
não é estatista nem Roosevelt e segue certa tradição econômica dos EUA
Joe
Biden quer o “Estado máximo”. Seria um Franklin Roosevelt. A gente lê essas
tolices sobre os planos do presidente americano e seu primeiro
discurso para o Congresso, nesta semana. Anos de mercadismo tosco e
a degradação geral da inteligência no país talvez expliquem a incapacidade de
apenas ler ou ouvir o que disse Biden. Quem sabe a tolice na verdade seja
contrapropaganda prévia, receio de que mesmo a brisa de conversa mais
progressista sopre por aqui.
“Wall Street não construiu este país. A classe média construiu este país. E os sindicatos constroem a classe média. E por isso que estou pedindo ao Congresso que aprove a Lei de Proteção ao Direito de se Organizar... Por falar nisso, vamos aprovar o salário mínimo de US$ 15 [por hora]. Ninguém deveria trabalhar 40 horas por semana e ainda viver abaixo da linha de pobreza. E precisamos garantir mais igualdade e oportunidade para as mulheres”, discursou o presidente.
Biden
quer gastar mais? Quer. Se todos os seus
planos forem aprovados, o aumento de gasto deve ficar em 1,5% a
2% do PIB americano, por ano, em parte coberto por aumentos de arrecadação e de
impostos sobre ricos e empresas (que estão em baixa histórica, de oito
décadas). Nem de longe há o “risco” de que os EUA comecem a se parecer com a
Escandinávia, com o Canadá ou, “pior”, menos ainda com a França.
Biden propôs alguma mudança econômica institucional maior? Ainda não. Talvez o faça na regulação ambiental, que terá vida dura no Senado.
No mais,
os planos Biden têm duas linhas maiores e uma linhazinha: 1) emprego para gente
pobre, que estudou menos e minorias; 2) subsídios para a pesquisa cientifica e
tecnológica —até prometeu cura do câncer; 3) remendos na seguridade social.
Biden
fala de criar empregos que não serão terceirizados, exportados, para o resto do
mundo e de trabalhos que tão cedo não serão feitos por máquinas: gente que
cuida de creches, professores de escolas infantis, cuidadores de idosos e
deficientes, operários de construção civil e serviços conexos (90% das vagas do
plano de empregos não exigem formação universitária, disse).
Fala de
pagar a faculdade comunitária: dois anos de ensino superior técnico em escolas
locais. Jill, a primeira-dama, dá aula em
uma faculdade dessas. Fala de licença familiar e médica paga de 12
semanas, de desconto de impostos para quem tem filhos, de baixar o preço do
remédio e do plano de saúde. “Estado máximo”?
De
início, o plano não dá conta, por si só, de fatores fundamentais da polarização
de renda e educação, dos riscos socioeconômicos da automatização e dos empregos
que migram para países em que se paga salário menor.
“Roosevelt”?
Roosevelt praticamente inventou o Estado americano, em tamanho de gasto e instituições,
e fez com que a figura do presidente americano se ocupasse decisivamente de
economia (antes, era mais comandante em chefe, líder diplomático e
político-moral).
Sim,
Biden tem grandes planos, consideradas as expectativas reduzidas e a
desumanidade reacionária do nosso tempo. Caso não invente um projeto de mudança
ambiental profunda, pode fazer guinada importante, retomando linhagens antigas
de política econômica americana, “hamiltonianas”, mas não reviravolta. Vai
subsidiar a pesquisa e desenvolvimento das empresas (o que foi feito
maciçamente desde a Segunda Guerra até o desmonte Reagan, que não foi total,
aliás).
No mais, vai tentar remendar a selvageria dos últimos quase 40 anos de desigualdade crescente e de esvaziamento do miolo social americano.
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