Folha de S. Paulo
Pela violência que inevitavelmente encerra,
deve permanecer como 'ultima ratio'
"Ultima ratio regum" é a frase
que o cardeal Richelieu mandou inscrever nos canhões franceses utilizados na
Guerra dos Trinta Anos (1618-48). Significa "o último recurso dos
reis". No século 20, a expressão "ultima ratio", agora sem o
"regum", passou a ser usada para evocar o princípio da
proporcionalidade no direito, em especial no penal. Esse ramo do direito
recorre sempre a algum grau de violência.
Na versão "light", é intrusivo e abre flanco para o arbítrio de autoridades. Na pesada, joga pessoas na cadeia por longos períodos. Pelo princípio da proporcionalidade, leis penais deveriam ser o último recurso do legislador e dos órgãos repressores, usadas só para prevenir e reparar males piores do que aqueles que a própria violência estatal enseja.
Nos últimos anos, uma aliança entre
militantes de causas, legisladores progressistas e membros do Ministério
Público tenta transformar o direito penal numa ferramenta pedagógica. Se,
quando criamos um tipo penal, ensinamos para a população que é errado nele
incorrer, então deveríamos criminalizar todas as condutas que reforçam
preconceitos e outras formas de discriminação que tanto mal causam à sociedade.
Eu apoio a maioria dessas causas
progressistas, mas não creio que o direito penal deva ser usado como
instrumento de educação. Para isso existem a escola, o debate na arena pública
e até a boa e velha conversa de bar. O direito penal, pela violência que
inevitavelmente encerra, deve permanecer como "ultima ratio".
Algumas das coisas que li nos últimos dias
me assustaram. Houve quem sugerisse que basta uma pessoa defender que algo
deixe de ser crime para ela mesma incorrer no delito de apologia desse crime.
Fiquei preocupado. Venho já há décadas defendendo a legalização das drogas, do
aborto, da eutanásia e uma redução ampla e geral das penas restritivas de
liberdade. Se a moda pega, amargarei uns 30 anos de cana.
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