Valor Econômico
PSB cobra aliança na Paraíba, onde PT
fechou com MDB
Na política, como no amor, não raro se
processa o acordo dos contrários. A frase é do ex-ministro das Relações
Exteriores João Neves da Fontoura, que serviu aos presidentes Getúlio Vargas e
Eurico Gaspar Dutra. A reflexão era sobre o conturbado relacionamento entre
dois aliados que volta-e-meia rompiam e, mais tarde, se reconciliavam: Vargas e
seu ex-ministro da Justiça, da Fazenda e das Relações Exteriores Osvaldo
Aranha.
Para Neves da Fontoura, os temperamentos de
Vargas e Aranha contrastavam totalmente e, talvez por isso, se completassem.
“Aranha - homem-multidão - vivia sempre cercado, falando sem cessar, com
plateia permanente”, descreveu o ex-chanceler em suas memórias. Vargas, embora
comunicativo e sorridente em público, era reservado e contido nas rodas
privadas.
A citação do “acordo dos contrários” é oportuna. Após a confirmação da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência, no dia 21 de julho, a homologação do nome do ex-governador Geraldo Alckmin como vice do petista, que se dará na convenção nacional do PSB na sexta-feira (29), sacramentará uma das chapas mais improváveis da história política recente do país.
“Na
política, como no amor”, está posta a união dos ex-adversários: Lula, o
“homem-multidão”, e Alckmin, o vice reservado, mas capaz de desarmar um petista
radical com seu arsenal de piadas sobre Pindamonhangaba. Em tempos em que as
campanhas ainda eram republicanas, sem notícias falsas e ameaças à democracia,
Lula e Alckmin trocaram farpas quando se enfrentaram na campanha de 2006.
“Trocamos botinadas”, Lula costuma dizer, sobre as desavenças do passado.
Pois 16 anos depois, o entrosamento entre
Lula e Alckmin é de despertar inveja em muitos casais. “Eu tenho sorte com
vice”, derramou-se Lula no dia 12 de julho, em evento na Confederação Nacional
do Comércio (CNC). Relembrou a afinidade com o empresário José Alencar, morto
em 2011, que foi seu vice de 2003 a 2010, para elogiar o novo aliado na
sequência: “minha relação com Alckmin hoje é de fidelidade e companheirismo.
Ele não será um vice de brinquedo, será um vice de verdade”. A história recente
ensinou que a experiência do PT com vices decorativos não acaba bem.
As cúpulas de PT e do PSB querem tentar
reproduzir essa harmonia na convenção desta sexta-feira, à qual Lula
comparecerá. Nos bastidores, os presidentes do PT, Gleisi Hoffmann, e do PSB,
Carlos Siqueira, estão afinados, mas o clima está longe de uma lua-de-mel entre
os dois partidos em pelo menos três Estados, onde o quadro é considerado mais
tenso: Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraíba.
Segundo interlocutores de Gleisi e
Siqueira, após meses de negociações, ambos consideram os impasses nos
diretórios gaúchos e fluminenses incontornáveis. Diante desse diagnóstico, a
ideia quanto a esses dois Estados é deixar tudo como está, liberando as candidaturas
dos dois lados. Na Paraíba, entretanto, Siqueira ainda cobra o apoio do PT à
reeleição do governador João Azevêdo, mas os petistas estão se coligando ao
MDB.
No Rio Grande do Sul, PT e PSB são inimigos
figadais e, ao contrário de Lula e Alckmin, não superaram as diferenças para
unir a esquerda local. No dia 23 de julho, o diretório estadual do PSB
oficializou a candidatura do ex-deputado federal e vice-presidente da legenda,
Beto Albuquerque, ao Palácio Piratini. Ele deve concorrer com chapa pura, após
as tentativas frustradas de atrair PDT e PSD.
Em outra frente, o PT gaúcho adiou para 31
de julho a convenção em que vai homologar a candidatura do deputado estadual
Edegar Pretto ao governo. Para imprimir fôlego à chapa, o PT, na federação com
PV e PCdoB, vai lançar ao Senado o ex-governador Olívio Dutra, fundador do PT e
amigo de Lula.
No Rio de Janeiro, o PSB formalizou, no dia
20 de julho, as candidaturas de Marcelo Freixo ao governo e do deputado federal
e presidente regional da sigla, Alessandro Molon, ao Senado. O gesto irritou o
PT, que reivindica a vaga de candidato ao Senado na chapa de Freixo ao deputado
estadual André Ceciliano.
O PT acusa o PSB de trair acordo, enquanto
a legenda de Molón e Freixo nega a existência desse entendimento. Além disso,
pessebistas argumentam que o PT não retirou a candidatura de Edegar Pretto em
apoio a Albuquerque no Rio Grande do Sul. Por isso, não se justificaria a
contrapartida no Rio de Janeiro em relação a Molon.
Dirigentes do PT fluminense têm defendido o
rompimento com o PSB e uma aliança com o PSD do prefeito Eduardo Paes, mas
pessebistas duvidam que essa articulação avance. A candidatura de Freixo ao
governo do Rio foi uma das primeiras chapas costuradas pessoalmente por Lula,
ainda em meados de 2021.
Na Paraíba, o principal obstáculo para que
as duas siglas caminhem juntas é a oposição do ex-governador Ricardo Coutinho,
que trocou o PSB pelo PT em setembro do ano passado. Padrinho político do
governador João Azevêdo (PSB), Coutinho rompeu com o ex-aliado e agora quer
disputar o Senado. Para viabilizar o projeto, articulou o apoio do PT à
postulação do senador Veneziano Vital, do MDB, ao governo, com o apoio de Lula
- e contra Azevêdo.
A cúpula do PSB argumenta, entretanto, que
Coutinho é inelegível. Portanto, não faria sentido o PT deixar de apoiar a
reeleição de um governador do PSB para investir em uma postulação sem futuro.
Em 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) declarou Coutinho inelegível por
abuso de poder político quando concorreu à reeleição em 2014. Mesmo com a
decisão do TSE, Coutinho ainda concorreu à Prefeitura de João Pessoa naquele
ano, mas terminou em sexto lugar.
O PSB pondera que, quando chegar o momento
do registro das candidaturas em agosto, o requerimento de Coutinho será negado
pela Justiça Eleitoral.
Na política, o “acordo dos contrários” molda-se no plano nacional. Nos Estados, não raro se processa a luta dos contrários.
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