Valor Econômico
Não há como imaginar que reserva de lugares
para mulheres piorará o país
Faleceu na quinta-feira (21) Tereza Grossi, diretora de Fiscalização do Banco Central entre 2000 e 2003. Servidora de carreira, ela galgou todos os postos de chefia no órgão, sendo a principal responsável pelo processo de modernização dos métodos de supervisão bancária num momento crucial da economia brasileira, quando a estabilização inflacionária expôs as vulnerabilidades das instituições financeiras logo após o Plano Real. Muito elogiada pelos seus contemporâneos em função de sua competência técnica, Tereza Grossi é também lembrada por ter sido a primeira mulher a ser nomeada para a diretoria do Bacen e a integrar o Comitê de Política Monetária (Copom), o colegiado que define a meta da Selic, a taxa básica de juros.
Criado em 1965, o Banco Central só veio a ter
uma mulher na sua instância mais elevada 35 anos mais tarde, depois de outros
89 homens terem sido escolhidos para dirigir alguma área da instituição. A
conquista de Tereza Grossi é notável por romper um longo passado de
predominância masculina, mas quando olhamos para a história desde então, pouca
coisa mudou. Desde que Armínio Fraga indicou Tereza Grossi para a diretoria, em
março de 2000, outras quatro mulheres foram nomeadas para a diretoria do Bacen,
contra 43 homens. Sim, os presidentes da República no Brasil escolhem dez vezes
mais homens do que mulheres para conduzir a política monetária no país.
Não se trata de falta de opções: algumas das
principais instituições financeiras têm mulheres como economistas-chefe ou
integrando seus núcleos estratégicos, assim como o próprio Banco Central e
outros órgãos da área econômica do governo possuem servidoras de carreira
qualificadas em posições de responsabilidade. Quando surge uma vaga na
diretoria do Bacen, porém, na imensa maioria dos casos a opção recai sobre um
homem.
O que acontece no Banco Central está longe de
ser uma exceção. Números do Conselho Nacional de Justiça indicam que desde 2000
candidatas mulheres preenchem entre 35% e 46% das vagas ofertadas nos concursos
públicos para a magistratura a cada ano. Graças a esses bons resultados, o
contingente de juízas vem subindo nas últimas décadas, estando hoje em dia na
casa de 38% de todos os magistrados (as) no Poder Judiciário.
Apesar da crescente entrada de mulheres para
a carreira judicial, sua ascensão aos postos mais altos da magistratura ainda
enfrenta resistências. As magistradas ocupam somente 21% dos postos de
desembargadores dos Tribunais de Justiça estaduais e nos Tribunais Regionais
Eleitorais, 19% nos Tribunais Regionais Federais e ridículos 5% na Justiça
Militar. A situação só é um pouco melhor nos Tribunais Regionais do Trabalho;
único órgão em que as juízas são maioria (51%), mesmo assim sua segunda
instância ainda é dominada em 60% por homens.
Foi apenas em 1999 que o Superior Tribunal de
Justiça empossou a primeira mulher, Eliana Calmon. Atualmente são seis
ministras, numa Corte com 33 integrantes (18,2%). No Supremo Tribunal Federal,
a primeira mulher foi nomeada em 2000, com a ministra Ellen Gracie. As outras
duas representantes femininas na história do Supremo estão na Corte atual:
Cármen Lúcia e Rosa Weber. Com a atual presidente do STF prestes a se
aposentar, Lula sinaliza que indicará um homem para o seu lugar, reduzindo
ainda mais a representatividade feminina na cúpula do Judiciário.
Desde a semana passada magistradas de todo o
país estão mobilizadas pela aprovação de uma resolução do Conselho Nacional de
Justiça que propõe a alternância entre homens e mulheres no preenchimento de
vagas abertas na segunda instância, segundo os critérios de antiguidade e
merecimento.
A causa é justa. São inúmeros os benefícios
de uma maior presença feminina nos postos mais altos do Judiciário. A atuação
séria e serena das ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, tão diferente de seus
colegas de toga, homens seduzidos pelos holofotes da mídia e dos contatos
políticos e empresariais, ilustra bem o potencial de ter mais mulheres
desembargadoras e ministras nas Cortes brasileiras.
O mesmo acontece no Legislativo. Dos 39
deputados e senadores investigado pela CPMI dos Anões do Orçamento, em 1993,
havia apenas uma mulher. Em 2006, o Congresso investigou o envolvimento de 90
parlamentares num esquema de superfaturamento na compra e distribuição de ambulâncias
e equipamentos médicos. Na lista da CPMI dos Sanguessugas estavam presentes
apenas sete deputadas e uma senadora.
Entre os arrolados no processo do mensalão no
STF, não havia nenhuma parlamentar. E entre dezenas de congressistas envolvidos
na Operação Lava-Jato, as investigações contra deputadas ou senadoras foram
raríssimas.
Diante de um Congresso historicamente
dominado por homens, não dá para vislumbrar que a instituição de uma cota de
50% para as mulheres nas cadeiras da Câmara gerará resultado pior do que essas
evidências apontam.
A exigência de 30% de mulheres nas listas de
candidatos e nem mesmo a determinação de que o dinheiro dos fundos partidário e
eleitoral fosse distribuído de modo proporcional às candidatas não foram
suficientes para fazer a participação feminina na Câmara passar de 20% das
cadeiras.
Com partidos dominados por homens, as
iniciativas de estimular a representação de mulheres na política é sempre
sabotada por laranjas, fraudes e anistias.
A única forma de termos um Congresso com mais
mulheres é instituindo uma cota de 50% das vagas para mulheres. Já.
*Bruno Carazza é professor associado da Fundação Dom Cabral e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
2 comentários:
Piorará sim, pois piorará a democracia.
MAM
Mulheres já!
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