Folha de S. Paulo
Um ano depois, pouco se avançou na punição de
golpistas graúdos
Passado um ano do fatídico 8 de janeiro,
pouco se avançou na punição de golpistas graúdos. Nenhum político, militar,
grande empresário ou proprietário foi responsabilizado, ainda, com rigor
similar ao dispensado àqueles que não ostentam altos cargos, patentes ou
grandes posses.
Entre estes figuram pessoas como Matheus Lima de Carvalho Lázaro, um entregador de Apucarana (PR) que portava um canivete, e Raquel de Souza Lopes, uma cozinheira de Joinville. Ambos foram acusados de cometer cinco crimes, incluindo golpe de Estado. O paranaense deve passar os próximos 17 anos em regime fechado, pena similar a da catarinense, 16 anos e meio de reclusão.
Tais descrições se assemelham aos perfis que
integram um mapeamento de cerca de 90 mil contas extremistas no X (antigo
Twitter), realizado
entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023. De acordo com os
pesquisadores responsáveis pelo estudo, Rosana Pinheiro-Machado, Debora Diniz,
Athus Cavalini, Fabio Malini e Wagner Silva Alves, parte expressiva do
ecossistema comunicacional que demandava "intervenção militar" na
rede social era formada por profissionais como manicures, cabeleireiras,
vendedores e eletricistas, que, por motivações ideológicas, preferem se
autodenominar empreendedores ou empresários em vez de trabalhadores autônomos.
Perfis identificados como policiais,
militares, ou ex-agentes, contudo, não teriam aparecido de forma significativa
no mapeamento por receio de exposição e punição. O que faz sentido considerando
que, como afirmou o secretário-executivo do Ministério da
Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappelli, durante os atos
golpistas houve enfrentamento com homens com tática de combate e equipamentos,
mas que, ao contrário de milhares de civis presos preventivamente, sequer foram
identificados.
Até o momento, apenas cinco oficiais da
cúpula da Polícia Militar do Distrito
Federal haviam sido presos preventivamente pela Polícia
Federal (PF) acusados de omissão durante os atos do dia 8. No
entanto, não houve mais notícias sobre o assunto desde então. O Exército, por
sua vez, informou em uma nota dirigida à imprensa, no último dia 4, que dois
militares foram punidos disciplinarmente por
"transgressões disciplinares", as quais não foram especificadas no
comunicado.
No que diz respeito aos financiadores dos
atos golpistas, em setembro foram
cumpridos 53 mandados de busca e apreensão pela PF. O alvo principal
foram pessoas que financiaram ônibus que transportaram os golpistas até Brasília.
Porém, até agora, apenas um
empresário, acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de fretar 4 ônibus,
foi formalmente denunciado.
O intuito da operação da PF, denominada
"Lesa Pátria", é mais amplo: investigar financiadores, executores,
autoridades omissas e autores intelectuais dos ataques golpistas praticados por
bolsonaristas. Sendo que entre possíveis autores intelectuais estão políticos
como o ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL). Resta saber agora se haverá força e vontade
políticas suficientes para punir os maiores responsáveis pelo o que ocorreu no
dia 8 de janeiro, ou se, como de costume, quem irá pagar o pato serão apenas
aqueles que possuem menos dinheiro e poder.
*Doutora em ciência política pela USP e
pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento
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