Valor Econômico
Pesquisa indica que baixa qualidade de serviços de empresas privatizadas pairam acima de polarização
Privatizações sempre foram tabu no Brasil.
Pesquisas de opinião pública realizadas nas últimas décadas sempre revelaram
reservas da maioria da população quanto a esse tema.
Ao longo de nossa história, o Estado assumiu
a responsabilidade pelo provimento de serviços como telecomunicações, energia,
transporte ferroviário e saneamento básico. No entanto, com a crise fiscal que
se aprofundou nos anos 1980, cresceu a percepção de que o Estado não tinha mais
condições de manter e muito menos expandir as redes de infraestrutura
existentes.
É por isso que a Constituição de 1988, em seu art. 173, estabeleceu que “a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo”. Seguiu-se então uma onda de privatizações durante os mandatos de Collor, Itamar e Fernando Henrique Cardoso, depois contida durante as gestões de Lula e Dilma. Durante o governo Bolsonaro, a promessa de Paulo Guedes de obter US$ 1 trilhão em vendas de estatais acabou virando piada.
Num momento em que concessionárias privadas
vêm sendo questionadas pela qualidade do serviço que prestam (como o caso dos
seguidos apagões da Enel, em São Paulo) e a privatização de estatais como a
paulista Sabesp e
as mineiras Cemig e
Copasa em pauta, o instituto Quaest lançou uma importante pesquisa de opinião
sobre o tema.
Na mesma rodada em que foram às ruas medir o
apoio popular aos governadores Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG),
Ratinho Júnior (PR) e Ronaldo Caiado (GO), os pesquisadores da Quaest também
colheram as impressões desses eleitores sobre o processo de privatização em
seus Estados.
Além de oportuna, a pesquisa realizada pela
Quaest é interessante porque capta as percepções em relação a concessionárias
de serviços públicos em diferentes estágios de privatização. Enquanto a
Companhia Energética de Goiás (Celg) foi privatizada em 2016, tendo passado
pelas mãos de Enel e Equatorial Energia, o Paraná vendeu ações da Companhia
Paranaense de Energia (Copel) em agosto de 2023, deixando de ter o controle
sobre a empresa.
Por outro lado, vem sendo preparada a
privatização da Sabesp,
estatal paulista de saneamento, ao mesmo tempo em que as negociações sobre a
dívida de Minas Gerais com a União pode envolver as ações da Cemig,
a estatal mineira de energia.
De forma geral, goianos e paranaenses têm
visão pessimista sobre o processo de privatização da Celg e da Copel. Apenas
23% dos goianos, que vivenciaram o processo há mais tempo, sentiram melhora nos
serviços prestados após a privatização. Para a maioria, a gestão privada é
igual (27%) ou pior (48%) do que o antigo provimento estatal.
Para os paranaenses, o saldo dos primeiros
meses após a privatização também é negativo: 30% sentem que os serviços da
Copel pioraram, enquanto 23% veem melhoria. O restante (47%) não viu mudança
desde que a distribuição de energia passou às mãos do setor privado.
Entre os paulistas, 52% são contra a
privatização da Sabesp,
enquanto 36% a apoiam. Com relação à Cemig,
a federalização da companhia, que pode ser vista como primeiro passo para a
venda de suas ações, tem a rejeição de 49% dos entrevistados, enquanto os que
concordam com o processo são apenas 37%.
Sinal destes tempos polarizados, fenômeno
muito bem diagnosticado pelos pesquisadores Felipe Nunes (diretor da Quaest) e
Thomas Traumann no livro “Biografia do Abismo”, as percepções dos cidadãos
sobre a privatização guardam relação direta com a posição ideológica dos
entrevistados e suas afinidades políticas - pelo menos quando o assunto é
discutido em tese.
Enquanto os eleitores paulistas de direita em
sua maioria têm uma expectativa positiva com a privatização da Sabesp (54%
a favor, 38% contrários), no campo da esquerda observa-se o contrário (74%
contra, 19% a favor). Resultados parecidos são observados quando o recorte se
dá em relação à avaliação do trabalho de Tarcísio de Freitas: a venda da Sabesp é
apoiada por 54% dos fãs do governador, enquanto 80% dos seus críticos não
querem saber de privatização.
Quando se toma a experiência mais antiga de
privatização, porém, a insatisfação do eleitor é bem menos afetada pela
ideologia ou pela preferência política. Em Goiás, onde a população é atendida
por uma empresa privada de energia há oito anos, consumidores de direita se
mostram quase tão insatisfeitos (47%) quanto os de esquerda (51%) com os
serviços da Equatorial Energia. Da mesma forma, a avaliação de que o
fornecimento melhorou depois da privatização é minoritária tanto entre os
apoiadores de Caiado (26%) quanto entre os eleitores que não gostam do
governador (22%).
Em março, a Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel) elegeu a Equatorial Goiás a pior entre as grandes
distribuidoras de energia elétrica do Brasil, em termos de frequência e duração
de interrupções no fornecimento.
Polarização à parte, os números da pesquisa
Quaest parecem indicar que as próprias empresas privadas são as maiores
difamadoras do processo de privatização, graças ao péssimo serviço que prestam
aos consumidores.
2 comentários:
Excelente análise do colunista!
Privatizações são muito boas... para as empresas que adquirem o patrimônio público ao antigo "preço de banana", e para os governantes que vendem este patrimônio recebendo polpudas verbas "por fora" durante os processos. Quantos ministros e diretores de empresas privatizadas no governo FHC enriqueceram durante as transações? Incontáveis nos dedos das mãos! Foram dezenas e dezenas de tucanos e liberais (ou pefelistas como se autodenominavam então)! O então ENGAVETADOR GERAL DA REPÚBLICA nada via e nada queria saber... Foi mantido no cargo nos 8 anos dos governos FHC... Por que será?? Engavetou centenas de processos contra membros do governo, inclusive o próprio FHC. Muito pior que o recente Aras cúmplice do Jair Bolsonaro!
Tive problemas com a elektro.
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