segunda-feira, 15 de abril de 2024

Carlos Pereira - O Executivo e o risco democrático

O Estado de S. Paulo

A eleição de populistas extremos geralmente não leva nem a rupturas nem a erosões democráticas

No artigo Beyond Democratic Backsliding: Executive Aggrandizement and its Outcomes, Melis Laebens dá uma nova interpretação ao conceito de alargamento dos poderes do executivo com o objetivo de identificar casos onde incumbentes eleitos tentam abusar do poder às custas das instituições democráticas.

Um incumbente estaria aggrandizing se tentasse implementar mudanças legais que enfraquecessem tanto o controle do executivo pelos outros poderes (accountability horizontal) como o controle do governo pelos eleitores e pela oposição (accountability vertical). O ataque conjunto a esses dois princípios do sistema democrático é o que distinguiria aggrandizement da política habitual com um executivo dominante.

A autora propõe três estágios de aggrandizement. No primeiro, a despeito do alargamento dos poderes do Executivo, a accountability vertical e a horizontal estariam preservadas e funcionais.

O Executivo não teria uma influência esmagadora sobre os outros poderes, a liberdade da mídia preservada e a sociedade civil atuante. Os populistas poderiam ser derrotados eleitoralmente ou afastados judicialmente. Se o incumbente for reeleito e o aggrandizement do Executivo progredir, levando a uma escalada de concentração de seus poderes, o regime erode e torna-se menos democrático. Nesse segundo estágio, fica muito mais difícil para a oposição e para as organizações de controle lhe impor limites.

Seriam necessários, entretanto, mais de dois mandatos consecutivos para que um populista se tornasse hegemônico. Nesse terceiro estágio, erosões ou mesmo quebras democráticas se tornariam mais plausíveis, ainda que não inexoráveis. Saídas do poder decorrentes de restrições institucionais, no entanto, são improváveis.

Dos 26 casos de aggrandizement, apenas em seis (Chavez , Erdogan, Orbán, Ortega, Vucic e Talon) houve quebra democrática. Em 12 não houve deterioração institucional, apesar de ações iliberais. Destes, 6 foram derrotados eleitoralmente (Voronin, Trump, Bolsonaro, Mejía, Lungu e Babis) e outros 6 saíram no final do segundo mandato (Uribe, Arroyo, Duterte, Khama, Medina e Correa). Quatro saíram do poder por outras causas (Gruevski, Zuma, Yanukovych e Morales) e, finalmente, em 4 casos ainda não está claro o que irá acontecer (Obrador, Modi, Kaczynski e Sall).

Embora a eleição de populistas seja uma ameaça para a democracia, geralmente não é letal. Uma certa distância temporal é necessária para tirarmos conclusões sobre o seu impacto na democracia mundial.

 

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