É vital aumentar a vacinação com o avanço de casos de coqueluche
O Globo
Registros da doença deram um salto no
primeiro semestre, e cobertura vacinal segue abaixo da meta
A morte de um bebê de 6 meses por coqueluche em
Londrina (PR) acendeu um alerta nas autoridades de saúde em todo o Brasil. O
estado não registrava óbito pela doença havia cinco anos. No país, o último
ocorreu há pelo menos três anos. O fato aconteceu no fim de junho. Segundo a
Secretaria de Saúde de Londrina, a vítima era uma criança prematura que estava
com as vacinas em atraso. Um segundo caso está sob investigação.
A morte acontece num momento de avanço da doença no Brasil, acompanhando tendência mundial. Dados do Ministério da Saúde mostram que, de janeiro a julho, já foram registrados 339 casos, o maior número desde 2020, o que representa um aumento de 56% em relação a todo o ano passado.
O aumento é mais preocupante em alguns
estados, especialmente no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Entre 2023 e 2024, o
número de casos em Santa Catarina disparou, saltando de um para 14; em São
Paulo, mais que triplicou no mesmo período, subindo de 54 para 194; no Paraná,
onde foi registrado o óbito, mais que dobrou (de 17 para 36); em Minas Gerais,
cresceu de 14 para 35; no Rio de Janeiro, de oito para 13; e no Distrito
Federal, de cinco para nove.
Causada pela bactéria Bordetella
pertussis, a coqueluche pode ser transmitida por meio de gotículas da
tosse, espirro ou até mesmo pela fala de alguém infectado. Os sintomas são
semelhantes aos de um resfriado, com tosse seca e febre. Quando não vacinada, a
criança pode desenvolver um quadro grave, correndo risco de morte.
A proteção é dada pela vacina pentavalente
infantil (DTP, HB, Hib), contra difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e
infecções pela bactéria H. influenzae tipo B. O imunizante faz parte
do calendário infantil e está disponível no SUS. As crianças devem tomar três
doses (aos 2, 4 e 6 meses), além de dois reforços com a tríplice bacteriana
infantil (DTP), aos 15 meses e aos 4 anos.
É verdade que, apesar das dificuldades para
elevar as taxas de vacinação depois de forte queda nos últimos anos, há
progressos importantes. No mês passado, ONU e Unicef anunciaram que o Brasil
conseguiu deixar a lista nefasta dos 20 países com maior número de crianças não
vacinadas no mundo. Isso foi possível porque o número daquelas que não
receberam nenhuma dose da DTP (usada como termômetro da cobertura vacinal) caiu
de 418 mil em 2022 para 103 mil em 2023.
Embora o avanço seja louvável (a cobertura da
DTP passou de 67,4% em 2022 para 76,8% em 2023), o índice ainda está abaixo da
meta de 95% preconizada pelo Ministério da Saúde. Por isso governo federal,
estados e municípios precisam facilitar o acesso às doses e fazer campanhas
para conscientizar os pais a levar seus filhos aos postos de saúde dentro dos
prazos estabelecidos. Não é aceitável que crianças morram de coqueluche —ou de
qualquer outra doença prevenível.
Fogo no Pantanal expõe necessidade de mais
prevenção
O Globo
Conexão entre tragédias climáticas exige
atenção do governo para minimizar efeitos de eventos extremos
O governo federal liberou créditos
extraordinários da ordem de R$ 137 milhões para o combate ao fogo no Pantanal,
triplicou o contingente de pessoal e, nos próximos dias, é provável que anuncie
novas medidas. Entre janeiro e julho, o número de focos de incêndio chegou a
4.696, 11% a mais que o recorde anterior, registrado em 2020. Embora distantes
no espaço e no tempo, as queimadas em Mato Grosso
do Sul, a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, a seca
causticante na Amazônia e os furacões devastadores no Hemisfério Norte estão
relacionados. Em comum, todos exigem revisões de planos, principalmente com a
aprovação de orçamentos maiores para esforços de prevenção. Como os focos no
Pantanal acontecem em áreas isoladas e de difícil acesso, uma vez iniciados, os
incêndios são difíceis de combater.
Entre os diversos fatores que se conjugam
para desencadear esses eventos climáticos extremos estão o aquecimento das
águas do Oceano Atlântico e o resfriamento do Oceano Pacífico, causado pelo
fenômeno La Niña. O ano de 2024 tem demonstrado como a natureza reage de modo
violento em tempos de mudanças
climáticas. A temperatura do Atlântico está acima da média desde
2020. No momento, a anomalia — termo técnico que descreve a diferença entre uma
medição e a média — está entre 2 °C e 3 °C, marca prevista apenas para
setembro. Foi o suficiente para colocar fogo no Pantanal. E para transformar a
temporada de furacões deste ano no Hemisfério Norte numa das mais perigosas dos
últimos tempos.
O Furacão Beryl, formado no final de junho na
altura de Porto Rico, contrariou as expectativas. Com ventos acima de 240
quilômetros por hora, foi classificado na categoria 5, que reúne as
supertempestades com maior poder de destruição. Foi o mais precoce dessa
categoria a atingir o Caribe (a temporada se estende de junho a novembro).
Meteorologistas já estudam ampliar a escala até a categoria 7, para abranger
furacões de 320 quilômetros por hora.
O Beryl sugere uma mudança de padrão, por ser
o primeiro furacão de grandes dimensões a se formar mais ao sul da Bacia do
Atlântico Norte. Como essas supertempestades bloqueiam a umidade que deveria
chegar à Amazônia, contribuem para agravar a estação seca e influenciam as
condições meteorológicas do Brasil.
A ação do La Niña no Pacífico a partir de
setembro deverá aumentar a probabilidade de furacões mais violentos no
Atlântico. “É a receita do diabo para o desenvolvimento de furacões de
categoria máxima”, diz a oceanógrafa Regina Rodrigues, da Universidade de Santa
Catarina, coordenadora do grupo da Organização Meteorológica Mundial que estuda
ondas de calor no Atlântico.
Além da necessária atenção às consequências
dos eventos climáticos extremos no Brasil, o poder público precisa estar atento
ao que acontece no resto do mundo. As tragédias climáticas estão interligadas.
Nesse quadro, a prioridade é planejar e executar ações capazes de minimizar os
efeitos de tempestades avassaladoras e incêndios em série. As mudanças no clima
apenas começaram.
STF abre caminho para acabar de vez com
‘orçamento secreto’
Valor Econômico
É primordial que a transparência impere e que critérios técnicos -não políticos - sejam seguidos por deputados e senadores na hora de propor emendas parlamentares
O “orçamento secreto” ganhou novas formas no
Congresso e continua em pleno vigor, apesar de ter sido proibido pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) em 2022. Diante da falta de “comprovação cabal” de que a
decisão da corte estava sendo cumprida, o ministro Flávio Dino realizou ontem
uma audiência de conciliação sobre o assunto, abrindo caminho para enterrar de
vez a prática e exigir total transparência sobre as emendas parlamentares.
A reunião ocorreu em meio ao debate sobre a
necessidade de ajuste nas contas públicas e ao crescente volume de recursos
destinados às emendas parlamentares, parte do movimento de seu avanço sobre o
Orçamento iniciado sob a gestão de Jair Bolsonaro e que continua no governo
Lula. Na Lei Orçamentária Anual (LOA), elas somam cerca de R$ 52 bilhões, mais
de oito vezes os R$ 6,4 bilhões empenhados em 2014.
Desde que o STF decidiu tornar
inconstitucional o uso das emendas de relator (RP9) para a destinação de
recursos sem a devida identificação, entidades que fiscalizam os gastos
públicos denunciaram que os parlamentares passaram a recorrer a outros mecanismos
para manter a prática e nublar a origem das verbas. O desrespeito à
determinação contraria os princípios da boa administração pública e ocorre em
total descoordenação com projetos prioritários para o país, já que grande parte
do dinheiro acaba sendo investida em ações paroquiais nas bases eleitorais de
deputados e senadores, com potencial impacto nas eleições de outubro.
Entre as novas roupagens que foram usadas
para contornar a proibição do STF está o aumento das “emendas Pix”, modalidade
que permite transferências diretas às prefeituras, com desembolso mais rápido,
já que não há necessidade de firmar convênio técnico com o governo federal. Em
recente nota técnica, a Transparência Brasil destacou que apenas 1% das 941
emendas incorporadas à LOA de 2024 informa o destino e como os recursos serão
gastos. O volume de recursos destinado pelo mecanismo também chama a atenção, passando
de R$ 3 bilhões em 2022 para R$ 7 bilhões no ano passado. Para este ano, a
previsão é de outros R$ 8 bilhões.
Um segundo caminho alternativo que ganhou
força com o cerco às RP9 foram as emendas de comissão (RP8), em que os próprios
colegiados aparecem como autores dos repasses, ocultando os reais responsáveis
pela indicação. Segundo dados apresentados ao STF, o valor autorizado para essa
modalidade passou de R$ 329,4 milhões, em 2022, para R$ 15,2 bilhões neste ano.
Chamam a atenção a cobiça dos deputados por emendas encaminhadas pela Comissão
de Saúde da Câmara e a distribuição desigual desses recursos, privilegiando com
mais verbas Estados como Alagoas, base eleitoral do presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), em detrimento de outros mais populosos, como Minas Gerais
e São Paulo.
Há ainda o caso do uso dos “restos a pagar”
de emendas de relator que já haviam sido reservados pelo Executivo antes da
decisão do STF que proibiu a prática. De janeiro a julho, o governo Lula
desembolsou R$ 1,1 bilhão pelo mecanismo, segundo a Transparência Brasil.
Ao abrir a audiência de conciliação, que
trata de um processo apresentado pelo Psol sobre as emendas de relator, Dino
afirmou não ser possível que a prática tornada inconstitucional persista com
outros nomes e leis. O encontro ocorreu após o ministro ter enviado pedido de
esclarecimentos ao governo e ao Congresso sobre o cumprimento da decisão. Um
sinal claro de que a prática continua foi a resposta do Ministério do
Planejamento, que afirmou que parte das emendas parlamentares ainda não atende
às exigências de indicação de beneficiário nem de ordem de prioridade por seus
autores (Valor, 24/7).
Outra frente de questionamento à falta de
transparência foi aberta pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo
(Abraji), que entrou com uma ação no STF contra trechos da Emenda 105/2019 que
instituíram as “emendas Pix”. Em liminar concedida ontem, Dino atendeu parte da
reivindicação da entidade e decidiu que a liberação dos recursos só pode
ocorrer se os requisitos constitucionais de transparência e rastreabilidade
forem atendidos. O ministro também determinou que o Tribunal de Contas da União
(TCU) e a Controladoria-Geral da União (TCU) fiscalizem a modalidade. A CGU
também deverá auditar as emendas em execução no prazo de 90 dias.
O STF já havia acertado ao proibir o “orçamento secreto” em 2022 e deve garantir que a determinação não vire letra morta. É primordial que a transparência impere e que critérios técnicos -não políticos - sejam seguidos por deputados e senadores na hora de propor emendas parlamentares. O uso paroquial dos recursos, com privilégio a regiões controladas por apadrinhados de membros influentes do Congresso, se configura como um descalabro em um país com tantas carências em diferentes setores. O país também deve rever, no futuro, o montante para emendas que dependem apenas do desejo dos parlamentares no orçamento público, algo sem paralelo no restante do mundo.
Aumentam os riscos no Oriente Médio
Folha de S. Paulo
Assassinatos de líderes terroristas por
Israel são aposta perigosa, que dificulta cessar-fogo e pode expandir conflito
Desde que o Hamas atacou Israel em
outubro do ano passado, o maior temor era de que o grupo terrorista palestino
lograsse o objetivo de incendiar o Oriente Médio.
Isso se daria com a inevitável resposta
militar que Tel
Aviv daria à chacina, seguida pelo socorro do maior apoiador de seus
rivais, o Irã —ainda
que por meio de prepostos regionais da teocracia de Teerã, como o Hezbollah libanês.
O plano logo fracassou. Ainda que mantivessem
a retórica afiada e, no caso do Hezbollah, uma frente de atrito diário com
Israel, ninguém escalou a crise.
A novidade no cenário geopolítico foram os
rebeldes houthis financiados pelo Irã no Iêmen, com ataques a navios mercantes
no mar Vermelho e grandes danos causados ao comércio mundial.
O problema é que a guerra de Israel em Gaza,
justa que fosse em seu começo, tornou-se um pesadelo humanitário indefensável e
sem saída militar visível. Com quase 39,5 mil mortos e a obliteração de boa
parte do território, a
operação tem como fim manter Binyamin Netanyahu
no poder.
Assim, até os mais aguerridos apoiadores de
Israel, os Estados
Unidos, passaram a pressionar o premiê a aceitar um cessar-fogo. Ele não só
não veio como Netanyahu voltou de uma viagem a Washington com surpresas.
Entre terça-feira (30) e quarta, Israel matou
dois de seus principais inimigos regionais: Ismail
Haniyeh, líder político do Hamas, que estava em Teerã como convidado de
honra na posse do novo presidente do país, e Fuad Shukr, chefe operacional do
Hezbollah, em Beirute.
Ademais, na quinta (1º) foi confirmada a
morte, há 20 dias, do chefe militar do Hamas em Gaza.
Israel faz com isso uma aposta. Se Netanyahu sabe que os ataques não passarão
impunes, parece acreditar que haverá limite na retaliação devido ao temor do
impacto de uma guerra ampla —a começar pelo regime iraniano, que
vive dias de contestação popular e dificuldades econômicas.
O premiê ampara-se na eficácia da defesa de
Israel, com ajuda dos EUA e de outros aliados, contra o único ataque direto do
Irã ao seu país na história, em abril. Talvez dê certo, e ainda se crie
oportunidade de tréplica para conter as suspeitas instalações nucleares no Irã.
Mas também é possível que se abra uma caixa
de Pandora com ataques multidirecionais, engolindo consigo os EUA em meio a uma
campanha eleitoral e atores como Rússia, Turquia e Arábia
Saudita, num temerário e imprevisível jogo.
Paliativo orçamentário
Folha de S. Paulo
Contenção extra de gastos indica cuidado com
contas públicas, mas é insuficiente
Sem alarde, a área econômica do governo Luiz
Inácio Lula da
Silva (PT)
introduziu um novo —e ainda nebuloso— mecanismo de contenção de gastos
orçamentários.
No decreto presidencial que promoveu o já
esperado congelamento
de R$ 15 bilhões em despesas programadas para este ano, acrescentou-se que
outros R$ 31,6 bilhões não poderão ser liberados pelos ministérios antes de
outubro. É o que está sendo chamado
de "faseamento" pela área técnica.
Ao que tudo indica, trata-se de um
reconhecimento dissimulado do que já estava claro para os analistas
independentes —vale dizer, que o valor anunciado de início é insuficiente para
dar um mínimo de segurança quanto ao cumprimento da meta de aproximar de zero o
déficit orçamentário neste ano.
Assim, a medida é bem-vinda, embora não
passe, na melhor das hipóteses, de um paliativo.
Rememorando: o governo se comprometeu a
eliminar em 2024 o desequilíbrio entre receitas e despesas federais, sem
incluir nas contas os encargos da dívida pública. Tal objetivo tem sido
encarado com descrédito geral.
As regras em vigor permitem uma generosa
margem de tolerância para essa tarefa, correspondente a 0,25% do Produto
Interno Bruto. Dito de outra maneira, se o Tesouro Nacional terminar o ano com
déficit de R$ 28,8 bilhões (já descontados os desembolsos extraordinários com a
tragédia gaúcha), a meta estará cumprida.
A contenção de R$ 15 bilhões já mira esse
objetivo menos ambicioso, o que constitui uma temeridade —ainda mais porque as
projeções oficiais de receitas e despesas soam muito otimistas.
Daí se compreende a contenção extra de gastos
até outubro, que parece ter sido adotada de modo a evitar protestos de natureza
política. Afinal, o presidente da República e seu partido se mostram avessos ao
controle de despesas públicas em bases mais duradouras.
É incerto o que será feito do montante
congelado, dado que os compromissos de Lula com a responsabilidade variam
conforme as pressões de ocasião. Fato é que medidas no varejo podem mitigar
resultados piores no curto prazo, mas estão longe de bastar para um ajuste mais
sólido das finanças públicas.
A contenção da escalada da dívida só será obtida com uma revisão ampla das regras que impõem alta contínua de despesas obrigatórias.
O Estado de S. Paulo
Com expectativas de inflação acima da meta e
câmbio depreciado, BC dá um voto de confiança ao governo e conta com melhora no
ambiente externo para decidir o que fazer com a taxa de juros
A manutenção da taxa básica de juros em 10,5%
ao ano não surpreendeu o mercado financeiro. Pesquisa realizada pelo Projeções
Broadcast dias antes da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central (BC) revelou uma rara unanimidade entre os investidores, com nada
menos que 65 casas apostando na estabilidade da Selic na reunião desta semana.
Houve, no entanto, certa divergência sobre a
mensagem que o Copom tentava repassar após divulgar a decisão. O comunicado
enumerou vários indicadores que, em outros tempos, seriam motivo para elevar a
taxa básica de juros de imediato, e evidenciou que o BC prefere esperar um
pouco mais até sinalizar quais serão seus próximos passos.
O BC reconheceu que a desaceleração da
inflação tem arrefecido, enquanto os núcleos continuam acima da meta. Desde a
última reunião, as expectativas dos agentes colhidas no Boletim Focus para
o IPCA deste ano e de 2025 subiram de 4% e 3,8%, respectivamente, para 4,1% e
4%, ambas acima do centro da meta de 3%.
Incluída no comunicado pela primeira vez, as
projeções do BC para a inflação do primeiro trimestre de 2026 estão em 3,4%, no
cenário de referência, e em 3,2%, no cenário alternativo. As projeções do BC
para 2024 e 2025 também subiram, respectivamente, para 4,2% e 3,6%, no cenário
de referência, e para 4,2% e 3,4%, no cenário alternativo.
Em outras palavras, mesmo que a taxa de juros
seja mantida em 10,5% até o fim de 2025, a inflação vai superar o centro da
meta neste ano, no próximo e no seguinte. E entre os fatores que podem
pressionar os preços para cima, além da desancoragem das expectativas por
período mais prolongado e da resiliência da inflação de serviços, o BC
mencionou, pela primeira vez, “uma taxa de câmbio persistentemente mais
depreciada”.
O Copom, que até então trabalhava com um
dólar a R$ 5,30, alterou sua projeção para R$ 5,55, uma correção relevante, mas
ainda inferior ao que tem sido praticado no mercado. Na quinta-feira, por
exemplo, o dólar superou a marca de R$ 5,70, o que não ocorria desde 2 de
julho.
O Banco Central também foi mais enfático ao
falar sobre a política fiscal. Além de citar que acompanha os impactos da
política fiscal do governo nos juros e nos ativos financeiros, como já alerta
há alguns meses, o Copom mencionou que a desconfiança dos agentes econômicos
sobre o tema tem causado impactos nos preços dos ativos e nas expectativas.
Em contrapartida, o ambiente externo parece
bem mais favorável do que nos últimos meses, o que ajuda a explicar a cautela
do BC brasileiro neste momento. O Federal Reserve (Fed) manteve os juros no
patamar entre 5,25% e 5,50%, mas considerou a possibilidade de que as taxas
caiam já na próxima reunião, em setembro. Por lá, a inflação anual caiu a 2,5%
em julho, cada vez mais próxima da meta de 2%. “Está chegando a hora, pois
outros bancos centrais estão enfrentando a mesma questão”, disse o presidente
do Fed, Jerome Powell.
Ainda que dividido, o Banco da Inglaterra
(BoE) decidiu reduzir os juros em 0,25 ponto porcentual, para 5% ao ano. Na
Europa, analistas da Oxford Economics avaliam que o recuo nas expectativas de
inflação abriu espaço para o Banco Central Europeu cortar os juros nas reuniões
de setembro e dezembro.
A se confirmar um quadro mais benigno no
exterior, a pressão sobre o câmbio deve arrefecer nos próximos meses e
facilitar, em parte, o trabalho do Banco Central brasileiro. Restarão os riscos
associados a uma política fiscal expansionista, mas, aparentemente, o BC optou
por dar um voto de confiança ao governo e deixar os próximos passos em aberto.
A próxima reunião do Copom está marcada para
os dias 17 e 18 de setembro. Até lá, o governo já terá enviado a proposta de
Orçamento de 2025 ao Congresso. A expectativa é que o Executivo cumpra a
promessa de cortar gastos para provar que o compromisso fiscal do governo é
crível. Do contrário, as expectativas para a inflação podem se afastar ainda
mais da meta. Neste caso, para preservar sua credibilidade, só restará ao BC
ser ainda mais duro na condução da política monetária e subir os juros.
Isso sim é diplomacia
O Estado de S. Paulo
Brasil assume a Embaixada da Argentina em
Caracas e o cuidado dos opositores de Maduro ali refugiados, mostrando o valor
da diplomacia em meio ao caos produzido pela ditadura
O Estado brasileiro assumiu a custódia da
Embaixada da Argentina na Venezuela após o ditador Nicolás Maduro, movido
exclusivamente por vingança, expulsar de seu país todo o corpo diplomático
argentino. A Casa Rosada, como se sabe, não endossou a farsa eleitoral do
caudilho, expressando de forma inequívoca, em conjunto com outros seis países
da região, suas fundadas dúvidas em relação à “vitória” de Maduro ao final de
um processo eleitoral que foi fraudado por ele do início ao fim.
O resultado material desse diálogo de alto
nível entre Brasil e Argentina, não apenas entre dois indivíduos – os
presidentes Lula da Silva e Javier Milei –, produziu uma cena a um só tempo
inusitada e pungente: o hasteamento da bandeira brasileira em plena sede da
representação diplomática argentina em Caracas. Na prática, isso significa que
ora cabe ao Brasil muito mais que o cuidado físico com o imóvel. O País passou
a ser responsável pelo resguardo dos interesses da República Argentina na
Venezuela e os dos cidadãos argentinos que estão no país, residentes ou
temporários.
Ademais, em digno gesto humanitário, o
governo Lula da Silva concordou em abrigar opositores do regime chavista que
acorreram à Embaixada da Argentina em busca de proteção contra a brutal
repressão ordenada por Maduro. As Forças Armadas da Venezuela, as polícias e as
milícias que o ditador controla já deixaram um saldo de dezenas de mortos e
desaparecidos, além de centenas de feridos e presos arbitrariamente. O “banho
de sangue” prometido por Maduro em caso de derrota, como está claro,
materializou-se, como sói acontecer em qualquer ditadura: uma política contra
dissidências a um governo ilegítimo.
Por tudo isso, Milei, que já ofendeu Lula
diversas vezes, veio a público “agradecer enormemente” a disposição do Brasil
de vir em socorro da Argentina e de seus cidadãos nessa hora grave. O
presidente argentino ainda enfatizou que “os laços de amizade que unem Brasil e
Argentina são muito fortes e históricos”.
O simbolismo dessa concertação entre Brasil e
Argentina em um momento de gravíssima crise política e social na Venezuela não
pode ser subdimensionado. O gesto é bastante revelador do empenho diplomático
que tem sido realizado, em particular pelo Itamaraty, para construir uma
solução negociada para a intrincada crise venezuelana. Esses louváveis esforços
da diplomacia brasileira não raro são feitos fora dos holofotes, longe dos
ruídos desnecessários e irresponsáveis causados pelo voluntarismo lulopetista.
Decerto conscientes de que, a esta altura, o
ditador Nicolás Maduro jamais reconhecerá que perdeu a eleição de domingo
passado, as diplomacias de países como Brasil, Colômbia e México parecem
trabalhar para ao menos arrefecer os ânimos e elaborar alguma forma de diálogo
que poupe vidas e dê alguma perspectiva tanto para a oposição quanto para os
milhões de venezuelanos que fugiram do caos de seu país.
Não será fácil, mas será ainda mais difícil
se irresponsáveis como o presidente Lula da Silva continuarem a prejudicar
esses esforços com bravatas e cinismo. O Brasil deve ser prudente ao lidar com
a Venezuela, um país com o qual compartilha uma fronteira de 2,2 mil km, além
de outros interesses de Estado em comum. Nesse caso, contudo, aceitar
pragmaticamente que Maduro continuará no poder porque se trata de um fato
consumado não é o mesmo que considerar como “normal” a situação na Venezuela,
como disse Lula, insultando a inteligência do mundo civilizado.
É preciso deixar claro que o Brasil preza a
democracia, aqui e em toda parte, e que considera inaceitável qualquer ruptura,
seja em países governados pelos desafetos de Lula, seja naqueles oprimidos
pelos companheiros do demiurgo. Mas, como mostra a bandeira brasileira hasteada
na Embaixada da Argentina, também é preciso deixar claro que, em diplomacia, é
necessário sempre deixar uma porta aberta.
Apagão yanomami
O Estado de S. Paulo
Colecionando fracassos na questão indígena,
governo agora sonega dados sobre mortes
O governo Lula da Silva esconde
deliberadamente, há pelo menos cinco meses, informações sobre a realidade do
povo yanomami. O apagão de dados impede a sociedade brasileira de acompanhar as
condições de vida dos indígenas que ganharam o noticiário em razão de
reiteradas violações em seu território no Norte do País.
Em fevereiro deste ano, último dado
disponível, o Ministério da Saúde informou que 363 indígenas morreram ao longo
de todo o ano passado por doenças e desnutrição na Terra Indígena Yanomami,
localizada em Roraima e no Amazonas, mais que os 343 óbitos de 2022, quando o
País era presidido por Jair Bolsonaro.
Os números mostraram que, apesar do discurso
em defesa dos povos indígenas como contraste com a administração Bolsonaro, o
governo petista foi incapaz de mudar a situação devastadora imposta aos
yanomamis, a despeito da organização de uma força-tarefa que prometia pôr fim
às agruras desse povo.
Incomodado, Lula chegou a fazer uma ligação
exaltada à ministra Nísia Trindade para cobrar explicações. Ao que parece, para
ele, o problema não era o número de mortes – incompatível com sua promessa de
levar assistência à região –, mas a forma supostamente descontextualizada com
que a verdade veio a público após reportagens com base em dados fornecidos pela
própria pasta por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Os yanomamis, há anos, têm sido vítimas de
uma mistura explosiva da negligência do poder público – que, como se vê, se
perpetua – com o garimpo ilegal, que polui rios e afugenta a caça. Sem os meios
de sobrevivência dessa população, tem-se um ciclo de malária, desnutrição,
conflitos e mortes.
Não há solução fácil, rápida ou barata para o
problema, e o governo Lula da Silva, aparentemente, optou simplesmente por não
falar mais do assunto. Até agora, nenhum dado referente a 2024 foi divulgado –
o que, sem dúvida, levanta suspeitas de que a situação, no mínimo, não
melhorou, se é que não está ainda pior.
Como sintoma dessa espécie de “operação
abafa”, pedidos de dados feitos por meio da LAI passaram a ser reiteradamente
negados. Ao Estadão, o Ministério da Saúde afirmou que “divulgará em breve
um balanço com dados atualizados” e precisos.
A transparência em um governo democrático não
é uma escolha da administração pública, mas um direito do cidadão. O governo
Lula tem a obrigação de mostrar – com dados sólidos, e o quanto antes – se suas
ações melhoraram de fato a vida dos yanomamis e de todos os povos indígenas. A
comoção causada por imagens de crianças esquálidas que rodaram o Brasil e o
mundo não pode ser esquecida.
No pronunciamento em cadeia de rádio e TV que fez no domingo passado, Lula disse que seu governo resgatou “políticas de proteção dos direitos das mulheres, do povo negro, dos indígenas, das pessoas com deficiência e LGBTQIA+”. Na falta dos números, porém, não há como saber se Lula está dizendo a verdade, pelo menos no que diz respeito aos yanomamis. A palavra do presidente da República tem grande valor, mas numa democracia essa palavra não basta.
Os obstáculos ao aleitamento materno
Correio Braziliense
Como parte dos objetivos da Agenda 2030 da
ONU, a expectativa é alcançar uma taxa de 70% de amamentação exclusiva nos
primeiros seis meses de vida. Nas Américas, esse índice não chega a 38%
Agosto chegou e, com ele, a campanha
conhecida como Agosto Dourado, uma forma de conscientizar as pessoas sobre a
importância do aleitamento materno. A data completa 34 anos e foi um esforço da
Organização Mundial da Saúde (OMS), em parceria com o Fundo das Nações Unidas
para a Infância (Unicef), para ser implementada. O dourado é justamente
para simbolizar o padrão ouro da alimentação infantil — no caso, o leite
materno.
Dessa parceria, foi gerado o relatório
Declaração de Innocenti, com o objetivo de estimular os países a articularem a
promoção da amamentação, além de ter sido fundada a Aliança Mundial de Ação
Pró-Amamentação. No Brasil, a Lei n.º 13.435, de 2017, reforça as ações em prol
da saúde e do bem-estar do bebê. Segundo o Ministério da Saúde, o leite materno
reduz em 13% o risco de morte nos primeiros anos de vida. No caso da mãe, a
amamentação ajuda na recuperação pós-parto e reduz o risco de certas doenças como
câncer de mama e ovário.
Ainda assim, falar em leite materno no Brasil
e no mundo está muito distante do que preconiza a OMS. Dados da Organização
Pan-Americana da Saúde (Opas) mostram que, em todo o planeta, apenas 44% das
crianças são amamentadas de forma exclusiva nos primeiros seis meses de vida.
Nas Américas, esse índice não chega a 38%, e somente 32% das crianças continuam
sendo amamentadas até os 2 anos. No que diz respeito aos países da América
Latina e do Caribe, na primeira hora de vida dos bebês — primordial para a sua
sobrevivência —, menos da metade deles, 48%, é alimentada.
Como parte dos objetivos da Agenda 2030 das
Nações Unidas, a expectativa é alcançar uma taxa de 70% de amamentação
exclusiva nos primeiros seis meses de vida ou, a curto prazo, 50% até 2025.
Portanto, aumentar os índices de aleitamento materno no Brasil é mais que
urgente.
Aos desafios numéricos, somam-se questões que
afetam a sociedade brasileira como um todo. Embora a amamentação seja um gesto
valoroso e extremamente benéfico para mãe e filho, as mulheres ainda enfrentam
dificuldades que passam pelo próprio ato de amamentar. Dores e lesões por conta
da sucção muitas vezes requerem cuidados médicos, que nem sempre são
acessíveis. Algumas mães também sofrem com o formato dos mamilos e possíveis
infecções.
Também é fato que as mulheres ainda estão
sujeitas a pressão social e tabus ligados ao aleitamento materno. Muitas se
sentem obrigadas a amamentar seus bebês mesmo com dores severas e nem sempre
estando aptas por outras questões de saúde. Assim como são comuns os relatos de
constrangimento e até ataques quando se decide amamentar uma criança em
público.
A boa notícia é que o Brasil é reconhecido
mundialmente por seu programa de doação de leite humano, investindo, mais
especificamente, em bebês prematuros ou de baixo peso (menos de 2,5kg). A cada
ano, 330 mil crianças brasileiras nascem prematuras e dependem dos bancos de
doação de leite para receber os principais nutrientes. Esses bebês representam
aproximadamente 11% do total dos nascimentos no Brasil, que chegam a 3 milhões
por ano.
Há no país um movimento de aumento das doações — de 8% de 2022 para 2023 —, e a meta do governo é elevar em mais 5% de 2023 para 2024. Porém, mesmo com os avanços, os problemas persistem, sinalizando que o poder público não é o único ator capaz de adotar medidas que, de fato, protejam mãe e filhos desde as primeiras horas após o parto.
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