Valor Econômico
Qual é a dose necessária para colocar a inflação na meta? Quem dá a pista é a combinação das projeções do comitê com o balanço de riscos
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central não
assumiu nenhum compromisso firme sobre os seus passos futuros para os juros,
mas ainda assim deu indicações indiretas de que o ciclo de aperto iniciado
nesta quarta-feira poderá ser maior do que o previsto pelos economistas do mercado
– o que, teoricamente, poderia exigir um rimo mais forte de aperto.
O BC subiu a Selic de 10,5% para 10,75% ao ano. A rigor, não há um guidance, ou uma indicação firme, sobre como e quanto vai continuar subindo. O comunicado diz apenas que “o ritmo de ajustes futuros na taxa de juros e a magnitude total do ciclo ora iniciado serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”.
E qual é a dose necessária para colocar a inflação na meta? Quem dá a pista é a combinação das projeções de inflação do Copom com o balanço de riscos para a inflação.
O Copom projeta uma inflação de 3,5% nos 12
meses até março de 2026, que é o período em que o comitê se propõe a cumprir a
meta de inflação (o que, na linguagem do Banco Central, chama-se horizonte
relevante de política monetária).
A inflação projetada, em 3,5%, está acima da
meta contínua de inflação, definida em 3%. Ou seja, de partida precisa de uma
dose adicional de juros para fazê-la cair.
Um detalhe: as projeções do Copom foram
feitas tomando como base as estimativas para a taxa Selic dos economistas,
coletadas no boletim Focus. Os economistas já colocavam nas suas contas uma
alta de juro de 1 ponto percentual até janeiro. Ou seja, para colocar a
inflação na meta, precisa de uma dose a mais, superando o que os economistas
preveem nas suas contas.
Quanto? As simulações mais recentes do Copom,
divulgadas no Relatório de Inflação de junho, mostram que uma alta de juros de
1 ponto percentual tem um efeito máximo menor do que 0,3 ponto percentual para
baixar a inflação no horizonte relevante.
A julgar por esse parâmetro, o ciclo total de
aperto de juros precisaria ser de mais de 2 pontos percentuais. Em tese, a
Selic poderia até ter que se aproximar de 13% ao ano.
Mas tem um recado adicional importante do
Copom: o balanço de riscos para a inflação pende para o lado negativo. Ou seja,
as chances de a inflação superar os 3,5% projetados são maiores do que as de
ficar abaixo deles. No manual de um banqueiro central rigoroso, isso exigiria
uma dose de juros a mais.
Além das projeções, a avaliação qualitativa
do cenário econômico do comitê indica a necessidade de um aperto forte. O Copom
diz que o hiato do produto está no “campo positivo”, o que significa que a
economia está superaquecida. Nas condições atuais, a atividade econômica leva a
inflação para cima, não para baixo. Ou seja, precisa esfriar para a inflação
baixar.
Todos os sinais do Banco Central são de que o
ciclo de aperto precisa ser bem mais significativo, o que, naturalmente, abre a
discussão sobre se o ritmo de 0,25 ponto percentual será suficiente.
Os economistas consultados no Focus
projetavam altas de 0,25 ponto percentual por reunião, mas para cobrir um
orçamento por eles avaliado em apenas 1 ponto percentual. Esse ritmo parece
muito lento para cobrir uma distância que, a julgar pelas projeções de
inflação, pode ser bem maior.
O que pode fazer o Banco Central apertar
menos do que as projeções aparentam indicar? Uma hipótese é que, no segundo
trimestre de 2026, a inflação projetada seja menor. Deve-se lembrar que, a
partir da próxima reunião, em novembro, o horizonte relevante de política
monetária anda um trimestre adiante.
Se as projeções são menores para esse período
mais adiante, só vamos saber com certeza no Relatório de Inflação, que sai na
semana que vem. Mas é pouco provável que o Copom tenha feita toda essa revisão
de cenário, admitindo uma economia superaquecida, apenas para murchar as
projeções logo a seguir.
O que aparenta é que o Copom alinhou suas projeções com as do mercado. Os economistas privados projetam inflação de 3,81% nos 12 meses até março de 2026. Uma dose de 1 ponto percentual nos juros, em tese, deveria baixar esse percentual para cerca de 3,5%. Poucos no mercado fizeram essa conta porque, no fundo, estavam descrentes que o Copom iria fazer o seu trabalho. Com os sinais de que o ciclo é mais substancial do que se supunha, essas previsões do mercado financeiro podem mudar para melhor.
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