Folha de S. Paulo
Com Trump, estão suas promessas de usar força
militar, conter livre arbítrio feminino e deportar imigrantes
É plausível imaginar um reality show
com Chucky concorrendo ao lado de humanos. Em filme de terror
americano, Chucky é o boneco que ganha vida, assassinando a faca os incautos.
Mas entre nós, esse é o apelido popular de Trump, recém-eleito presidente. Não
só o alaranjado do boneco enseja a analogia, também o comum de traços
assustadores como violência, misoginia, xenofobia. Em termos das promessas
reais: usar força militar contra inimigos, conter o livre arbítrio feminino e
deportar os milhões de imigrantes chegados depois de 2020.
Reality show é o tipo de espetáculo que mimetiza a democracia na forma mais abrangente, aquela que contempla o andar de baixo. No caso americano, operários e rurais desesperançados sob o globalismo. O mesmo com latinos descrentes do progressismo neoliberal. Transporte-se uma base dessas para o Brasil, e o resultado apontará para consciências periféricas numa série amorfa, distinta de classe social, povo e comunidade. Serialidade em vez de socialidade.
Isso é propriamente a massa, que surge quando
os mecanismos sociais de identificação se enfraquecem. Pode-se pensar em fim de
democracia liberal, mas o reality show sugere que a radicalidade democrática
está na contemplação do homem sem qualidade nenhuma, ou seja, na possibilidade
de escolha coletiva do pior.
No clássico "A Democracia na
América", Alexis de Tocqueville descreve com entusiasmo o regime americano,
assinalando a supremacia da organização moral, mais do que política, da
sociedade. Jean
Baudrillard observa em "América" que Tocqueville
descreve com a mesma lucidez o extermínio dos indígenas e a escravidão, sem
jamais confrontar as duas realidades, "como se o bem e o mal fossem
desenvolvidos em separado". Haveria então um paradoxo no enigma insolúvel
da relação "entre os fundamentos negativos da grandeza e a própria
grandeza". Conclui-se que "a América é potente e original, tanto
quanto é violenta e abominável".
Daí o fascínio americano pela simulação, que
encobre o paradoxo por meio do espetáculo, do país inteiro como um reality
show. Simular não é mentir, mas tornar verossímil o que não existe. Tudo se
exterioriza na publicidade, que há um século faz apologia do modo de vida
americano junto com cinema, televisão e show business. A palavra
"show" conota desde uma exposição de pintura ao mais banal noticiário
de tevê.
Esse show verdadeiramente epidêmico inclui a
eleição presidencial, que hoje funciona mais por contágio psíquico do que por
influência política. O medo é centro-motor dos sentimentos e comportamentos
sociais, existe até mesmo o voto envergonhado ("shy voter"). E epidemia não
se limita a doença física. Quando a viralização se torna categoria mental por
efeito das redes sociais, o medo viral contagia o corpo social contra a
proximidade dos imigrantes, a autonomia das mulheres, a suposta excelência
intelectual.
A visão cenográfica dessa massa amedrontada e
ressentida cristalizou-se em Chucky/Trump,
nomes publicitários para a oligarquia financeira empenhada na privatização do
Estado. Não há inocentes, a facada metafórica de Chucky/Trump no peito do velho
liberalismo foi confirmada nas urnas. Elon Musk,
cerca de 30 bilhões mais rico com a vitória de Trump, já timbra seus papéis
como "Estados
Unidos da América S.A." A expressão "guinada para a
direita" pouco explica, chegou a hora da lógica sóciocorporativa do pior.
Um comentário:
Para esquerda Mundial o povo americano Errou em não votar na Harris
Os esquerdistas não admitem a liberdade Democrática e ficam com essas conversa fiada de que o mundo vai se acabar o povo não é bobo e votou no futuro e na liberdade
Mas o choro é livre!
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