Wilson Figueiredo
Jornalista
DEU NO SITE OPINIÃO E NOTICIA
O presidente da Câmara dos Deputados, em quem o senador Antônio Carlos Magalhães via a expressão sobrenatural de “mordomo em filme de terror”, não perdeu a oportunidade de revelar que está aí para restaurar, sem pagar direito autoral, o estilo parlamentar de Pacheco para dizer o óbvio com a imponência oral com que Eça o imortalizou. Michel Temer não deixou por menos, mutatis mutandi, o rompante com que seu antecessor luso foi direto ao ponto quando, da tribuna da câmara dos deputados de Portugal, se dirigiu ao plenário com a frase retumbante: “enquanto eu aqui desta tribuna faço ciência, vossas excelências ai do plenário fazem ruído”. A diferença entre o original e o eco na Veja desta semana é suficiente para garantir Temer, por todo o século, como sucessor de Pacheco.
Temer abriu o festival preocupado com a dilaceração da imagem do Congresso pelo emaranhado de escândalos de deputados e senadores. Arrogou-se a iniciativa de tomar as “medidas de transparência nos primeiros dois meses de gestão, com a divulgação dos gastos (dos deputados, claro) com a verba indenizatória, que permitiu a revelação desses escândalos.” E, num assomo de Pacheco, “há confusão entre o que se pode fazer e o que não se pode fazer”. Os casos serão apurados, mas “pouco a pouco. Não dá para chegar arrombando a porta”. Por que não? Quer melhorar a imagem da Câmara em cima desse pântano? Em tom paternal, “esses descuidos comportamentais são históricos” e, com ênfase, “número mínimo de casos” que precisam ser condenados. Bastaria fechar a tesouraria. Antes de mais nada, vai dispersar as idéias radicais que pedem plebiscito sobre fechamento do Congresso. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. A levar a sério proposta com tal teor, em nome da democracia, pode-se encomendar logo missa de sétimo dia. Primeiro porque não se conhece nenhum Congresso que tenha sido fechado por plebiscito. Talvez em conseqüência de um, sim. Segundo, porque a democracia não deve ao plebiscito senão a certeza de que se trata de cortesia do autoritarismo , se ela se distrair. Até agora, a única concessão ditatorial que se conhece da democracia é o plebiscito, entendido como manipulação consentida do eleitorado. Democracias não vivem dele e ditaduras o têm ao alcance da mão para o que der e vier.
Ação imediata para conter idéias radicais seria um exagero para a instituição que tem poucas idéias para o tamanho da crise de confiança do eleitorado nos eleitos. O senador Cristóvão Buarque foi metafórico para não ser confundido. Resolveu como outro Cristóvão, o Colombo, que foi pragmático quando, desafiado a equilibrar um ovo em pé, quebrou a casca na ponta maior e resolveu o problema. Sem citar Joseph Stalin, que – sem nada a ver com Pacheco - não se cansava de repetir, judiciosamente, que não se fazem omeletes sem quebrar ovos.
A partir daí, o presidente da Câmara destampou o óbvio: “já determinei (ao deputado que abusou dos gastos) que ele mandasse uma explicação”, “vou aguardar a resposta e enviá-la ao corregedor, para que ele examine o caso e uma eventual punição”. Pacheco, para não resolver, não diria melhor. “O problema da punição é que a ordem jurídica vigente diz apenas que o crédito das passagens (aéreas) é do deputado”. “Na norma legal, não houve erro”. E daí, Pacheco? Michel Temer concorda, como presidente da Câmara, que falta fiscalização das verbas e auxílios por fora da remuneração ( e que já virou salário): “foi por isso que surgiu a idéia de acabar com a verba indenizatória”, com valor de 15 mil para despesas de bolso. Surgiu e se escondeu? Qualquer presidente da Câmara (e do Senado) diria o mesmo e não desataria o nó. A culpa não é de Michel Temer. Nem de Pacheco. Também não é do eleitor. A desintegração do tecido de confiança política deixa o eleito com a garantia de que está acima do mal (do bem, não) e o eleitor percebe, com atraso, que lhe bateram a carteira. Não há democracia de punguistas dotada de vida longa e, em conseqüência, cada qual quer o seu quinhão antes que a festa acabe.
Mesmo no papel de Pacheco, Temer mandou fazer um estudo que “mostrou na ponta do lápis que haverá grande economia para os cofres públicos se esse auxílio de 15 mil reais (pelo secundário imagina-se o principal) fosse incorporado ao salário” de senadores e deputados federais e estaduais. Mas, há sempre uma adversativa no meio do caminho, “desisti de levar adiante a proposta”. Motivo: a confusão seria total. Certamente jornais, rádios e televisões iriam dizer que os congressistas estavam tratando do aumento de salários em plena crise. E não seria, Pacheco, ainda que por outro lado do raciocínio?
A porção pachecal de Michel Temer é sufocante: Jarbas Vasconcelos foi, a seu ver, “genérico demais” quando abriu o bico. Em compensação, ele, Temer, foi de menos. Pressionado a levá-lo ao Conselho de Ética ou expulsá-lo do PMDB (acumula presidências), Temer acendeu uma vela a Deus e outra ao Diabo. Pediu-lhe que especificasse, com caligrafia de dedo duro, as suspeitas que lançava a esmo. E aí Pacheco deu o aparte por intermédio de Michel Temer: “Não há condições de apurar essa corrupção”. E ai se enrola: “quando há corrupção é preciso punir os responsáveis e não generalizar”. Só que tem uma coisa: para punir, é preciso chegar aos responsáveis, mas o corporativismo não separa o joio e o trigo e, dependendo da quantidade de um e de outro, na incerteza prévia o melhor é não punir ninguém.
Sobre três eleições a que o PMDB compareceu sem candidato próprio, embora seja o maior partido, a explicação não está nos limites do que parece, mas do que esconde. O maior partido é o fiel da balança, e seu peso é decisivo em vantagens que lhe perpetuam a importância eleitoral em altos cargos. Joga direto com o presidente da República. Dobrou o número de ministros. Mas Temer sempre foi pela candidatura própria. Na última sucessão presidencial, teve a iniciativa de propor eleição prévia para escolher candidato próprio, mas ninguém acreditou, nem os próprios pretendentes enrolados na farsa. Pobres Germano Rigotto e Garotinho.
Mas o que ressalta no atual Michel Temer são as frases que fariam a glória do próprio Pacheco e com o qual ele passa a ser visto como muito mais do mesmo: “em política as surpresas acontecem”. Não só em política, deputado. O soneto, segundo um ditado famoso, também. A modéstia não perde oportunidade: “dizem que vou ser vice da Dilma”, “como já se falou da possibilidade de ser vice de Serra”, e mais não disse nem lhe foi perguntado por ser ocioso.
Tem mais: “não há possibilidade de limitar o poder das CPIs”. Melhor saber para lhe levarem ao conhecimento o que excede ou falta às noticias. Há quem considere que elas abusam, “mas eu discordo da tese”. Porque as CPIS passam ao Ministério Público o que apuram e não, certamente, o que fica por ser apurado.
Nem no elogio ao presidente, Temer deixaria passar a oportunidade: “os grandes segredos de Lula são a espontaneidade e a intuição política extraordinárias”. Tudo bem, mas deixaram de ser segredo desde que ele se elegeu e, principalmente, depois que se reelegeu. E ter emprestado dinheiro ao FMI, mais do que uns trocados, vale um prêmio político com que o presidente deveria retribuir para estimular o hábito de pensar por conta própria.
Na seqüência, o presidente (da Câmara e do PMDB) garante que só falta a este governo pegar o pessoal que veio “das classes D e E para a classe C, e dar um espaço de trabalho para incorporá-lo à nacionalidade”. Por que não? “É este o ponto que deve ser a seqüência do governo”. Ao fundo, Pacheco é o maestro: “Não se pode ficar só no Bolsa Família”, evidentemente, para que não ocorra a volta em massa à classe E. Não deixa de ser alfabetização em massa.
“O Legislativo só é enaltecido, diz Michel Temer (ou seria Pacheco?) quando o país está saindo do regime autoritário”. Conclusão, trabalha mal na democracia. “Na história brasileira sempre foi assim”. Foi resignação, e não piedade. Lembra que, de 1964 a 82, o Legislativo apagou-se (mas os legisladores receberam em dia). Da eleição de Tancredo Neves a Fernando Collor, porém, a democracia foi um festival. Claro que a memória nacional, como a Lua, tem diferentes fases.Todas previsíveis.E, por último e para aliviar a atmosfera, “o processo penal e o processo político são duas coisas totalmente distintas”. É o melhor estilo Pacheco. “E, de uma maneira ou de outra, todos os deputados envolvidos em escândalos foram punidos”. Mas, qual das duas?
Dá-lhe Rigoni: “A avaliação política é muito pessoal. Há influência psicológica para cassar e para não cassar”. Ora, bolas. “No processo político (tomem nota) tudo se baseia na hipótese de conveniência”. A hipótese: um presidente é julgado e se confirma a suspeita. “Pode perder o cargo e levar o país à guerra civil”. Que fazer? “Evitar o caos institucional” ao preço da interrupção de cassação do presidente.” Freud explicaria melhor.
Jornalista
DEU NO SITE OPINIÃO E NOTICIA
O presidente da Câmara dos Deputados, em quem o senador Antônio Carlos Magalhães via a expressão sobrenatural de “mordomo em filme de terror”, não perdeu a oportunidade de revelar que está aí para restaurar, sem pagar direito autoral, o estilo parlamentar de Pacheco para dizer o óbvio com a imponência oral com que Eça o imortalizou. Michel Temer não deixou por menos, mutatis mutandi, o rompante com que seu antecessor luso foi direto ao ponto quando, da tribuna da câmara dos deputados de Portugal, se dirigiu ao plenário com a frase retumbante: “enquanto eu aqui desta tribuna faço ciência, vossas excelências ai do plenário fazem ruído”. A diferença entre o original e o eco na Veja desta semana é suficiente para garantir Temer, por todo o século, como sucessor de Pacheco.
Temer abriu o festival preocupado com a dilaceração da imagem do Congresso pelo emaranhado de escândalos de deputados e senadores. Arrogou-se a iniciativa de tomar as “medidas de transparência nos primeiros dois meses de gestão, com a divulgação dos gastos (dos deputados, claro) com a verba indenizatória, que permitiu a revelação desses escândalos.” E, num assomo de Pacheco, “há confusão entre o que se pode fazer e o que não se pode fazer”. Os casos serão apurados, mas “pouco a pouco. Não dá para chegar arrombando a porta”. Por que não? Quer melhorar a imagem da Câmara em cima desse pântano? Em tom paternal, “esses descuidos comportamentais são históricos” e, com ênfase, “número mínimo de casos” que precisam ser condenados. Bastaria fechar a tesouraria. Antes de mais nada, vai dispersar as idéias radicais que pedem plebiscito sobre fechamento do Congresso. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. A levar a sério proposta com tal teor, em nome da democracia, pode-se encomendar logo missa de sétimo dia. Primeiro porque não se conhece nenhum Congresso que tenha sido fechado por plebiscito. Talvez em conseqüência de um, sim. Segundo, porque a democracia não deve ao plebiscito senão a certeza de que se trata de cortesia do autoritarismo , se ela se distrair. Até agora, a única concessão ditatorial que se conhece da democracia é o plebiscito, entendido como manipulação consentida do eleitorado. Democracias não vivem dele e ditaduras o têm ao alcance da mão para o que der e vier.
Ação imediata para conter idéias radicais seria um exagero para a instituição que tem poucas idéias para o tamanho da crise de confiança do eleitorado nos eleitos. O senador Cristóvão Buarque foi metafórico para não ser confundido. Resolveu como outro Cristóvão, o Colombo, que foi pragmático quando, desafiado a equilibrar um ovo em pé, quebrou a casca na ponta maior e resolveu o problema. Sem citar Joseph Stalin, que – sem nada a ver com Pacheco - não se cansava de repetir, judiciosamente, que não se fazem omeletes sem quebrar ovos.
A partir daí, o presidente da Câmara destampou o óbvio: “já determinei (ao deputado que abusou dos gastos) que ele mandasse uma explicação”, “vou aguardar a resposta e enviá-la ao corregedor, para que ele examine o caso e uma eventual punição”. Pacheco, para não resolver, não diria melhor. “O problema da punição é que a ordem jurídica vigente diz apenas que o crédito das passagens (aéreas) é do deputado”. “Na norma legal, não houve erro”. E daí, Pacheco? Michel Temer concorda, como presidente da Câmara, que falta fiscalização das verbas e auxílios por fora da remuneração ( e que já virou salário): “foi por isso que surgiu a idéia de acabar com a verba indenizatória”, com valor de 15 mil para despesas de bolso. Surgiu e se escondeu? Qualquer presidente da Câmara (e do Senado) diria o mesmo e não desataria o nó. A culpa não é de Michel Temer. Nem de Pacheco. Também não é do eleitor. A desintegração do tecido de confiança política deixa o eleito com a garantia de que está acima do mal (do bem, não) e o eleitor percebe, com atraso, que lhe bateram a carteira. Não há democracia de punguistas dotada de vida longa e, em conseqüência, cada qual quer o seu quinhão antes que a festa acabe.
Mesmo no papel de Pacheco, Temer mandou fazer um estudo que “mostrou na ponta do lápis que haverá grande economia para os cofres públicos se esse auxílio de 15 mil reais (pelo secundário imagina-se o principal) fosse incorporado ao salário” de senadores e deputados federais e estaduais. Mas, há sempre uma adversativa no meio do caminho, “desisti de levar adiante a proposta”. Motivo: a confusão seria total. Certamente jornais, rádios e televisões iriam dizer que os congressistas estavam tratando do aumento de salários em plena crise. E não seria, Pacheco, ainda que por outro lado do raciocínio?
A porção pachecal de Michel Temer é sufocante: Jarbas Vasconcelos foi, a seu ver, “genérico demais” quando abriu o bico. Em compensação, ele, Temer, foi de menos. Pressionado a levá-lo ao Conselho de Ética ou expulsá-lo do PMDB (acumula presidências), Temer acendeu uma vela a Deus e outra ao Diabo. Pediu-lhe que especificasse, com caligrafia de dedo duro, as suspeitas que lançava a esmo. E aí Pacheco deu o aparte por intermédio de Michel Temer: “Não há condições de apurar essa corrupção”. E ai se enrola: “quando há corrupção é preciso punir os responsáveis e não generalizar”. Só que tem uma coisa: para punir, é preciso chegar aos responsáveis, mas o corporativismo não separa o joio e o trigo e, dependendo da quantidade de um e de outro, na incerteza prévia o melhor é não punir ninguém.
Sobre três eleições a que o PMDB compareceu sem candidato próprio, embora seja o maior partido, a explicação não está nos limites do que parece, mas do que esconde. O maior partido é o fiel da balança, e seu peso é decisivo em vantagens que lhe perpetuam a importância eleitoral em altos cargos. Joga direto com o presidente da República. Dobrou o número de ministros. Mas Temer sempre foi pela candidatura própria. Na última sucessão presidencial, teve a iniciativa de propor eleição prévia para escolher candidato próprio, mas ninguém acreditou, nem os próprios pretendentes enrolados na farsa. Pobres Germano Rigotto e Garotinho.
Mas o que ressalta no atual Michel Temer são as frases que fariam a glória do próprio Pacheco e com o qual ele passa a ser visto como muito mais do mesmo: “em política as surpresas acontecem”. Não só em política, deputado. O soneto, segundo um ditado famoso, também. A modéstia não perde oportunidade: “dizem que vou ser vice da Dilma”, “como já se falou da possibilidade de ser vice de Serra”, e mais não disse nem lhe foi perguntado por ser ocioso.
Tem mais: “não há possibilidade de limitar o poder das CPIs”. Melhor saber para lhe levarem ao conhecimento o que excede ou falta às noticias. Há quem considere que elas abusam, “mas eu discordo da tese”. Porque as CPIS passam ao Ministério Público o que apuram e não, certamente, o que fica por ser apurado.
Nem no elogio ao presidente, Temer deixaria passar a oportunidade: “os grandes segredos de Lula são a espontaneidade e a intuição política extraordinárias”. Tudo bem, mas deixaram de ser segredo desde que ele se elegeu e, principalmente, depois que se reelegeu. E ter emprestado dinheiro ao FMI, mais do que uns trocados, vale um prêmio político com que o presidente deveria retribuir para estimular o hábito de pensar por conta própria.
Na seqüência, o presidente (da Câmara e do PMDB) garante que só falta a este governo pegar o pessoal que veio “das classes D e E para a classe C, e dar um espaço de trabalho para incorporá-lo à nacionalidade”. Por que não? “É este o ponto que deve ser a seqüência do governo”. Ao fundo, Pacheco é o maestro: “Não se pode ficar só no Bolsa Família”, evidentemente, para que não ocorra a volta em massa à classe E. Não deixa de ser alfabetização em massa.
“O Legislativo só é enaltecido, diz Michel Temer (ou seria Pacheco?) quando o país está saindo do regime autoritário”. Conclusão, trabalha mal na democracia. “Na história brasileira sempre foi assim”. Foi resignação, e não piedade. Lembra que, de 1964 a 82, o Legislativo apagou-se (mas os legisladores receberam em dia). Da eleição de Tancredo Neves a Fernando Collor, porém, a democracia foi um festival. Claro que a memória nacional, como a Lua, tem diferentes fases.Todas previsíveis.E, por último e para aliviar a atmosfera, “o processo penal e o processo político são duas coisas totalmente distintas”. É o melhor estilo Pacheco. “E, de uma maneira ou de outra, todos os deputados envolvidos em escândalos foram punidos”. Mas, qual das duas?
Dá-lhe Rigoni: “A avaliação política é muito pessoal. Há influência psicológica para cassar e para não cassar”. Ora, bolas. “No processo político (tomem nota) tudo se baseia na hipótese de conveniência”. A hipótese: um presidente é julgado e se confirma a suspeita. “Pode perder o cargo e levar o país à guerra civil”. Que fazer? “Evitar o caos institucional” ao preço da interrupção de cassação do presidente.” Freud explicaria melhor.
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