DEU EM O GLOBO
A Selic não subiu, mas os juros bancários já subiram, e economistas de bancos e consultorias apostam que a alta da taxa oficial não passa de abril. Será mesmo que tem que subir? O Brasil está há oito meses com a menor taxa de juros da história recente, mas mesmo assim ela é altíssima se comparada com o resto do mundo, que continua na era dos juros negativos.
O dilema do Brasil é este.
Quase 16 anos depois do plano de estabilização, após 10 anos de metas de inflação, o país continua com uma taxa de juros alta demais, e em qualquer descuido a inflação sobe.Dos Brics, é o que possui a maior taxa de juros real: 4%. A China tem juros reais de 2,5%; e a Rússia, de 1,4%. O Brasil não quer correr o risco que a Índia está correndo. Lá, a inflação está em 16%, e claramente se acelerando nos últimos anos. Com isso, os juros reais estão negativos em 11%. Comparando as taxas de 40 países, a consultoria econômica Up Trend concluiu que os juros da Índia são os mais fortemente negativos, porque a inflação é mais alta.
O risco é que a inflação se acelere ainda mais. Os juros reais baixos da Rússia,de 1,4%, também são causados pela inflação alta, que está em torno de7%.
Esse certamente não é um risco que o Brasil queira correr,dado o nosso passado inflacionário e o compromisso do país com a inflação sob controle. É tão grande esse compromisso que inflação subindo traz mais risco eleitoral para o governo do que juros subindo.
Portanto, o BC se não elevar os juros por ter afinal cedido às pressões internas do governo estará errando duplamente.
Há uma divergência genuína sobre a natureza da inflação deste começo de ano. Ela subiu fortemente agora. O IGP-10 acumulou em três meses 2,4%.Isso é assustador para quem tem uma meta de 4,5%. Mas os IGPs têm movimentos mais nervosos, que não são necessariamente confirmados pela inflação ao consumidor.
Antigamente se dizia que os índices que têm uma parte de preços do atacado seriam uma espécie de aviso prévio da inflação ao consumidor. O avanço da estabilização acabou com esse automatismo.
A pressão do boom das commodities internacionais levou os preços das matérias-primas a subir no Brasil no começo de2008. Em julho, o IGP-M acumulado em 12 meses chegou a 15%, e o IPCA,também em 12 meses, estava em 6,3%. Daí para diante, o IGP-M caiu e terminou o ano em 7,8%, enquanto o IPCA terminou o ano em 5,9%. Não houve o tal repasse. Em seguida, foi a vez de os IGPs despencarem e terminarem o ano passado em deflação, já o IPCA caiu e ficou em 4,3%.
Conclusão: os IGPs são mais voláteis e não são uma prévia dos índices ao consumidor.
O mistério que continua no Brasil é porque o país precisa de taxa de juros tão alta para atingir o objetivo de evitar a inflação acima da meta, que é o mandato do Banco Central.
Houve um tempo em que o mercado dizia que o BC tinha que pagar o preço da reputação, porque ninguém confiava que ele pudesse ter independência para decidir. Tantas batalhas vencidas pelo Banco depois, poucos continuam a duvidar da decisão independente.
O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que entrevistei esta semana na Globonews, explica que a decisão do Copom foi estritamente técnica. Houve divergências no diagnóstico, eo placar apertado da decisão seria uma indicação de que os juros podem subir em abril. Quando perguntei se ele estava então convencido da autonomia do BC no atual governo, ele disse que sim, e que as reclamações públicas sobre a taxa de juros de outros setores do governo são normais, e exatamente por serem públicas não são pressões, seriam uma espécie de desculpas para o seu público. Luiz Chrysostomo, sócio da Neo Investimentos, também acha que o Banco Central decide autonomamente.
Portanto,se o BC tem reputação de independente, se a estabilização ocorreu há tantos anos, se o mundo inteiro está com juros baixos, por que o Brasil não pode ter juros mais parecidos com o resto do mundo? A nossa taxa básica hoje está em 8,75%, mesmo sendo a mais baixa da nossa história recente, continua sendo muito alta na comparação com outros países.
Será que está mesmo escrito que os juros terão que subir em abril? Gustavo Franco acha que pode acontecer uma novidade boa em termos de inflação que permita ao Banco Central adiar mais uma vez.
Chrysostomo acha que há uma pressão de demanda das famílias que pode manter a inflação subindo, mas admite que os incentivos de IPI estão sendo removidos, e que os compulsórios voltaram a subir, retirando nos próximos dias cerca de R$ 70 bilhões da economia.
Além disso, a demanda externa continuará fraca já que a crise internacional ainda não foi resolvida.
Gustavo Franco acha que, apesar de tanto tempo depois do início da nova moeda,ainda existem uma bactéria presente na economia brasileira,desequilíbrios fiscais crônicos, o peso de uma história muito longa de convivência com inflação alta que fazem com que o Brasil permaneça sendo o campeão mundial dos juros altos. Pode ser que seja ainda herança desse passado, mas o fato é que já era tempo de o mercado de juros brasileiros ser mais normal. Mais escandalosamente anormais são as taxas de juros cobradas pelos bancos, no crédito ao consumidor e às empresas. Neste ponto mesmo é que o Brasil parece um E.T., tal a discrepância entre as taxas dos outros e as nossas.
A Selic não subiu, mas os juros bancários já subiram, e economistas de bancos e consultorias apostam que a alta da taxa oficial não passa de abril. Será mesmo que tem que subir? O Brasil está há oito meses com a menor taxa de juros da história recente, mas mesmo assim ela é altíssima se comparada com o resto do mundo, que continua na era dos juros negativos.
O dilema do Brasil é este.
Quase 16 anos depois do plano de estabilização, após 10 anos de metas de inflação, o país continua com uma taxa de juros alta demais, e em qualquer descuido a inflação sobe.Dos Brics, é o que possui a maior taxa de juros real: 4%. A China tem juros reais de 2,5%; e a Rússia, de 1,4%. O Brasil não quer correr o risco que a Índia está correndo. Lá, a inflação está em 16%, e claramente se acelerando nos últimos anos. Com isso, os juros reais estão negativos em 11%. Comparando as taxas de 40 países, a consultoria econômica Up Trend concluiu que os juros da Índia são os mais fortemente negativos, porque a inflação é mais alta.
O risco é que a inflação se acelere ainda mais. Os juros reais baixos da Rússia,de 1,4%, também são causados pela inflação alta, que está em torno de7%.
Esse certamente não é um risco que o Brasil queira correr,dado o nosso passado inflacionário e o compromisso do país com a inflação sob controle. É tão grande esse compromisso que inflação subindo traz mais risco eleitoral para o governo do que juros subindo.
Portanto, o BC se não elevar os juros por ter afinal cedido às pressões internas do governo estará errando duplamente.
Há uma divergência genuína sobre a natureza da inflação deste começo de ano. Ela subiu fortemente agora. O IGP-10 acumulou em três meses 2,4%.Isso é assustador para quem tem uma meta de 4,5%. Mas os IGPs têm movimentos mais nervosos, que não são necessariamente confirmados pela inflação ao consumidor.
Antigamente se dizia que os índices que têm uma parte de preços do atacado seriam uma espécie de aviso prévio da inflação ao consumidor. O avanço da estabilização acabou com esse automatismo.
A pressão do boom das commodities internacionais levou os preços das matérias-primas a subir no Brasil no começo de2008. Em julho, o IGP-M acumulado em 12 meses chegou a 15%, e o IPCA,também em 12 meses, estava em 6,3%. Daí para diante, o IGP-M caiu e terminou o ano em 7,8%, enquanto o IPCA terminou o ano em 5,9%. Não houve o tal repasse. Em seguida, foi a vez de os IGPs despencarem e terminarem o ano passado em deflação, já o IPCA caiu e ficou em 4,3%.
Conclusão: os IGPs são mais voláteis e não são uma prévia dos índices ao consumidor.
O mistério que continua no Brasil é porque o país precisa de taxa de juros tão alta para atingir o objetivo de evitar a inflação acima da meta, que é o mandato do Banco Central.
Houve um tempo em que o mercado dizia que o BC tinha que pagar o preço da reputação, porque ninguém confiava que ele pudesse ter independência para decidir. Tantas batalhas vencidas pelo Banco depois, poucos continuam a duvidar da decisão independente.
O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que entrevistei esta semana na Globonews, explica que a decisão do Copom foi estritamente técnica. Houve divergências no diagnóstico, eo placar apertado da decisão seria uma indicação de que os juros podem subir em abril. Quando perguntei se ele estava então convencido da autonomia do BC no atual governo, ele disse que sim, e que as reclamações públicas sobre a taxa de juros de outros setores do governo são normais, e exatamente por serem públicas não são pressões, seriam uma espécie de desculpas para o seu público. Luiz Chrysostomo, sócio da Neo Investimentos, também acha que o Banco Central decide autonomamente.
Portanto,se o BC tem reputação de independente, se a estabilização ocorreu há tantos anos, se o mundo inteiro está com juros baixos, por que o Brasil não pode ter juros mais parecidos com o resto do mundo? A nossa taxa básica hoje está em 8,75%, mesmo sendo a mais baixa da nossa história recente, continua sendo muito alta na comparação com outros países.
Será que está mesmo escrito que os juros terão que subir em abril? Gustavo Franco acha que pode acontecer uma novidade boa em termos de inflação que permita ao Banco Central adiar mais uma vez.
Chrysostomo acha que há uma pressão de demanda das famílias que pode manter a inflação subindo, mas admite que os incentivos de IPI estão sendo removidos, e que os compulsórios voltaram a subir, retirando nos próximos dias cerca de R$ 70 bilhões da economia.
Além disso, a demanda externa continuará fraca já que a crise internacional ainda não foi resolvida.
Gustavo Franco acha que, apesar de tanto tempo depois do início da nova moeda,ainda existem uma bactéria presente na economia brasileira,desequilíbrios fiscais crônicos, o peso de uma história muito longa de convivência com inflação alta que fazem com que o Brasil permaneça sendo o campeão mundial dos juros altos. Pode ser que seja ainda herança desse passado, mas o fato é que já era tempo de o mercado de juros brasileiros ser mais normal. Mais escandalosamente anormais são as taxas de juros cobradas pelos bancos, no crédito ao consumidor e às empresas. Neste ponto mesmo é que o Brasil parece um E.T., tal a discrepância entre as taxas dos outros e as nossas.
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