DEU NO VALOR ECONÔMICO
Ao abrir a elaboração de seu programa de governo na internet, o PSDB parte da premissa segundo a qual o PT terá dificuldade para para discutir "conteúdo" na campanha. A apresentação de "novidades" é sempre mais difícil para o candidato chapa-branca, seja ele de "continuidade sem continuísmo", como José Serra, em 2002, ou de "continuidade da mudança", como Dilma Rousseff, na campanha eleitoral em curso. Mas a atual situação da economia torna mais difícil a abordagem tucana.
O "espetáculo do crescimento" está há seis meses em cartaz, sem um registro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - em vez dos costumeiros autoelogios, Lula preferiu atacar os que o criticaram por chamar de "marolinha" os efeitos sobre o país do tsunami financeiro de 2008. O crescimento no primeiro trimestre deste ano foi de 9% em relação a igual período de 2009, a inflação está estável e a taxa de desemprego, em queda - em abril foi a menor desde 2002, início da série histórica medida pelo IBGE.
A empreitada tucana é difícil mas não impossível. Há margem para a crítica, apesar do excelente portfólio petista. Antes de tudo o PSDB também precisa dizer como o Brasil "pode mais", ideia-mãe do discurso eleitoral de José Serra, quando são conhecidos os gargalos que impedem o país de continuar crescendo no ritmo em que cresceu no primeiro trimestre de 2010.
Pouco ou quase nada adianta dizer que o time perdia por 6 X 0 no primeiro tempo (2009, na sequência da crise financeira internacional do ano anterior), se na segunda etapa o jogo terminou 6 X 9 (2010, o ano da escolha do novo presidente).
O "espetáculo do crescimento" é sucesso de público, sem dúvida. Prova disso, para citar um exemplo, é a evolução do mercado do crédito nos últimos sete anos, que saltou de 25% para 45% do PIB. Cabe aos tucanos demonstrar que é um espetáculo vulnerável à crítica. E não só à crítica especializada, mas também ao grande público eleitor que se sente confortável com a situação atual e deve pensar duas vezes antes de apostar na mudança, nas eleições.
Um dos principais responsáveis por este sucesso é o mercado interno, que respondeu positivamente à aposta do governo. Em grande medida, graças à política de transferência de renda bancada pelo Estado brasileiro. De acordo com dados do Ministério da Fazenda, houve um aumento de 2,6 pontos percentuais do PIB na transferência de renda feita pelo governo, nos últimos sete anos. Em 2002, no último ano dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso ela foi de 6,4% PIB; ano passado chegou a 9% e aponta para um resultado semelhante em 2010.
Isso significa que o Estado transferiu R$ 81,7 bilhões a mais de renda para as pessoas, em 2009, do que no oitavo e último ano de FHC. Na prática, foram cerca de R$ 282 bilhões para a Previdência Social (aposentadorias, notadamente), benefícios sob o guarda-chuva da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) e programas como o Bolsa Família, Seguro Desemprego e abono salarial, entre outros.
Como resultado, no governo Lula, 19,4 milhões de pessoas cruzaram a linha da pobreza e 31,9 milhões passaram a fazer parte da classe média, de acordo com dados da Fundação Getúlio Vargas. São esses números que animam a campanha do PT e levam a candidata a falar da erradicação da miséria extrema num horizonte de tempo visível - 2014, portanto, na próxima Copa do Mundo. Para o mesmo período, mantida a atual tendência, as projeções governamentais apontam para mais 36 milhões de pessoas ingressando na classe média e outras 14,5 milhões saindo da pobreza.
Para a crítica especializada faltam, ao espetáculo, as condições de sustentabilidade do crescimento no longo prazo: poupança interna, maior investimento e a melhoria de uma infraestrutura em que não cabe a manutenção do que o país cresceu no primeiro trimestre de 2009.
O fato é que o país não "pode mais" com a atual rede de estradas, portos, aeroportos, usinas de energia. Mas os tucanos trabalham com uma proposta de crescimento de 7% durante uma década. Como vão fazer isso é a discussão que prometem alimentar nas próximas semanas, até a eleição de 3 de outubro, na internet.
Levantamento preliminar do Democratas (DEM) revela que o partido pode eleger uma bancada de cerca de 60 deputados federais, em 3 de outubro. Os caciques demistas já ficarão satisfeitos se esse número chegar aos 55, apenas três a menos que a bancada atual de 58 deputados. É um bom número para manter o Democratas no jogo, mesmo se José Serra perder a eleição. Neste caso, dificilmente o DEM - ou pelo menos a grande maioria- se manterá na oposição ao governo.
O DEM é o sucedâneo do PFL, que surgiu de uma dissidência do antigo PDS, o partido de sustentação do regime militar de 1964. Seus melhores momentos foram vividos na situação. Em 1998, na reeleição de Fernando Henrique Cardoso, o Democratas, que estava aliado ao PSDB, elegeu a maior bancada da Câmara. Exatos 105 deputados, fato que nem o PMDB nem o PT conseguiriam igualar (é o que os petistas projetam eleger agora em outubro).
Na eleição seguinte, rompido com o PSDB, o PFL perdeu representantes na Câmara, mas manteve o segundo posto, ao eleger 84 deputados. O PT, em plena onda vermelha, elegeu 91. O PMDB, então sócio da candidatura tucana de José Serra, conseguiu emplacar 75 deputados. A abstinência governamental se fez sentir com força em 2006, quando o PFL mandou para a Câmara 65 deputados - bancada que atualmente conta com 53 deputados, depois da ação predatória do governo no território demista. Além disso, elegeu só um governador, José Roberto Arruda, que se tornou símbolo do político corrupto e atrapalha os planos eleitorais do DEM, neste momento. O figurino de oposição, definitivamente, não caiu bem no Democratas que, longe do poder, sente-se vulnerável e desconfortável. E não é só no chamado baixo clero.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras.
Ao abrir a elaboração de seu programa de governo na internet, o PSDB parte da premissa segundo a qual o PT terá dificuldade para para discutir "conteúdo" na campanha. A apresentação de "novidades" é sempre mais difícil para o candidato chapa-branca, seja ele de "continuidade sem continuísmo", como José Serra, em 2002, ou de "continuidade da mudança", como Dilma Rousseff, na campanha eleitoral em curso. Mas a atual situação da economia torna mais difícil a abordagem tucana.
O "espetáculo do crescimento" está há seis meses em cartaz, sem um registro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - em vez dos costumeiros autoelogios, Lula preferiu atacar os que o criticaram por chamar de "marolinha" os efeitos sobre o país do tsunami financeiro de 2008. O crescimento no primeiro trimestre deste ano foi de 9% em relação a igual período de 2009, a inflação está estável e a taxa de desemprego, em queda - em abril foi a menor desde 2002, início da série histórica medida pelo IBGE.
A empreitada tucana é difícil mas não impossível. Há margem para a crítica, apesar do excelente portfólio petista. Antes de tudo o PSDB também precisa dizer como o Brasil "pode mais", ideia-mãe do discurso eleitoral de José Serra, quando são conhecidos os gargalos que impedem o país de continuar crescendo no ritmo em que cresceu no primeiro trimestre de 2010.
Pouco ou quase nada adianta dizer que o time perdia por 6 X 0 no primeiro tempo (2009, na sequência da crise financeira internacional do ano anterior), se na segunda etapa o jogo terminou 6 X 9 (2010, o ano da escolha do novo presidente).
O "espetáculo do crescimento" é sucesso de público, sem dúvida. Prova disso, para citar um exemplo, é a evolução do mercado do crédito nos últimos sete anos, que saltou de 25% para 45% do PIB. Cabe aos tucanos demonstrar que é um espetáculo vulnerável à crítica. E não só à crítica especializada, mas também ao grande público eleitor que se sente confortável com a situação atual e deve pensar duas vezes antes de apostar na mudança, nas eleições.
Um dos principais responsáveis por este sucesso é o mercado interno, que respondeu positivamente à aposta do governo. Em grande medida, graças à política de transferência de renda bancada pelo Estado brasileiro. De acordo com dados do Ministério da Fazenda, houve um aumento de 2,6 pontos percentuais do PIB na transferência de renda feita pelo governo, nos últimos sete anos. Em 2002, no último ano dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso ela foi de 6,4% PIB; ano passado chegou a 9% e aponta para um resultado semelhante em 2010.
Isso significa que o Estado transferiu R$ 81,7 bilhões a mais de renda para as pessoas, em 2009, do que no oitavo e último ano de FHC. Na prática, foram cerca de R$ 282 bilhões para a Previdência Social (aposentadorias, notadamente), benefícios sob o guarda-chuva da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) e programas como o Bolsa Família, Seguro Desemprego e abono salarial, entre outros.
Como resultado, no governo Lula, 19,4 milhões de pessoas cruzaram a linha da pobreza e 31,9 milhões passaram a fazer parte da classe média, de acordo com dados da Fundação Getúlio Vargas. São esses números que animam a campanha do PT e levam a candidata a falar da erradicação da miséria extrema num horizonte de tempo visível - 2014, portanto, na próxima Copa do Mundo. Para o mesmo período, mantida a atual tendência, as projeções governamentais apontam para mais 36 milhões de pessoas ingressando na classe média e outras 14,5 milhões saindo da pobreza.
Para a crítica especializada faltam, ao espetáculo, as condições de sustentabilidade do crescimento no longo prazo: poupança interna, maior investimento e a melhoria de uma infraestrutura em que não cabe a manutenção do que o país cresceu no primeiro trimestre de 2009.
O fato é que o país não "pode mais" com a atual rede de estradas, portos, aeroportos, usinas de energia. Mas os tucanos trabalham com uma proposta de crescimento de 7% durante uma década. Como vão fazer isso é a discussão que prometem alimentar nas próximas semanas, até a eleição de 3 de outubro, na internet.
Levantamento preliminar do Democratas (DEM) revela que o partido pode eleger uma bancada de cerca de 60 deputados federais, em 3 de outubro. Os caciques demistas já ficarão satisfeitos se esse número chegar aos 55, apenas três a menos que a bancada atual de 58 deputados. É um bom número para manter o Democratas no jogo, mesmo se José Serra perder a eleição. Neste caso, dificilmente o DEM - ou pelo menos a grande maioria- se manterá na oposição ao governo.
O DEM é o sucedâneo do PFL, que surgiu de uma dissidência do antigo PDS, o partido de sustentação do regime militar de 1964. Seus melhores momentos foram vividos na situação. Em 1998, na reeleição de Fernando Henrique Cardoso, o Democratas, que estava aliado ao PSDB, elegeu a maior bancada da Câmara. Exatos 105 deputados, fato que nem o PMDB nem o PT conseguiriam igualar (é o que os petistas projetam eleger agora em outubro).
Na eleição seguinte, rompido com o PSDB, o PFL perdeu representantes na Câmara, mas manteve o segundo posto, ao eleger 84 deputados. O PT, em plena onda vermelha, elegeu 91. O PMDB, então sócio da candidatura tucana de José Serra, conseguiu emplacar 75 deputados. A abstinência governamental se fez sentir com força em 2006, quando o PFL mandou para a Câmara 65 deputados - bancada que atualmente conta com 53 deputados, depois da ação predatória do governo no território demista. Além disso, elegeu só um governador, José Roberto Arruda, que se tornou símbolo do político corrupto e atrapalha os planos eleitorais do DEM, neste momento. O figurino de oposição, definitivamente, não caiu bem no Democratas que, longe do poder, sente-se vulnerável e desconfortável. E não é só no chamado baixo clero.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras.
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