domingo, 13 de novembro de 2011

O Brasil nos Brics :: Merval Pereira

Os Brics, sigla que reúne os cinco países emergentes mais influentes neste novo mundo multipolar em que vivemos, ganharam relevância ainda maior dentro do contexto da crise econômica mundial que consome a União Europeia e os Estados Unidos.

Segundo o professor de História Contemporânea da UFRJ Francisco Carlos Teixeira, transformaram-se em "um grupo de consultas mútuas" de países com um bom comércio - Brasil/China, China/África, China/Rússia/Rússia/Índia - e que, de certa forma, possuem interesses parecidos: desconcentração do poder mundial, novas normas de comércio, estabilização financeira e cambial.

Teixeira diz que os Estados Unidos de Obama acabou por aceitar o inevitável: o sonho de hegemonia mundial se desmilinguiu no ar.

Na sua avaliação, "na Líbia, nas retiradas no Afeganistão e no Iraque, patenteou-se a nova política: intervenções só com as parcerias políticas, morais e financeiras".

Que será uma atitude permanente, Francisco Carlos Teixeira não aposta: curada a crise econômica, ele acredita que os americanos voltarão ao velho estilo. "Mas aí o mundo já será outro", diz ele, "os custos ainda maiores e as condições talvez irreversíveis."

Não se trata, adverte, de decadência americana, "isso ainda precisa do fim do século XXI para ser História". Trata-se de desconcentração de poder e a virada para um mundo mais multicêntrico, "o que para o Brasil é muito bom", avalia.

Para o embaixador Marcos Azambuja, especialista no assunto, os Brics são um efeito colateral da impossibilidade de se redesenhar a ordem internacional, já que as resistências à redistribuição de poder pela via institucional continuam muito grandes.

"Antes, só as grandes guerras provocavam os traumatismos e ofereciam a oportunidade para o redesenho da ordem internacional. Como o fator nuclear impede (ainda bem) uma Terceira Guerra Mundial, não se apresentam aquelas condições para que se reveja, em profundidade, a ordem internacional", avalia.

Assim, como o sistema central não pode ser reformado, a saída tem sido a criação de grupos com um grau maior ou menor de informalidade que refletem novas realidades e as novas hierarquias do poder mundial, analisa Azambuja.

Assim vão aparecendo entidades como a Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático), a Apec (Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico), o G -20 e os Brics.

O embaixador Azambuja ressalta que as estruturas criadas em São Francisco ainda sobrevivem, com os importantes acréscimos do que se negociou em Bretton Woods, pela contribuição das chamadas Agências Especializadas e pela criação, mais tarde, dos instrumentos para a defesa dos direitos humanos e proteção ambiental.

"Nunca foram reformadas, e não vejo sinal de que possam ser redesenhadas no futuro previsível", afirma.

Para ele, os Brics continuam a enfrentar seus pecados de origem: a) é uma tribo sem índios e composta só de caciques; b) não tem uma agenda comum nem sequer um mínimo de institucionalidade; c) o passado das relações entre alguns deles é antes de conflito e rivalidade do que de cooperação; d) perseguem políticas divergentes e não é fácil imaginar uma conciliação de seus interesses nacionais.

Azambuja diz que o que une os Brics - além do convencimento de seu peso (geográfico, demográfico, econômico etc.) - "é o sentimento de seus membros de exclusão, em maior ou menor grau, do processo central de definição da nova ordem mundial, a convicção de que essa revisão deve dar a cada um uma maior fatia de poder e que, pelo menos no nível das ideias e dos objetivos gerais, pode ser encontrado um denominador comum que permita um discurso em boa medida afinado entre os cinco".

Mas, lembra Azambuja, há a consciência dos limites da concertação entre os cinco: "o Brasil, a Índia, a África do Sul não abdicam de sua adesão ao Ibas, que, em virtude mesmo de sua composição, permite que se aprofundem as afinidades entre as três democracias que integram os Brics".

Para o professor Clovis Brigagão, do Centro de Estudos das Américas da Ucam e professor-visitante do Programa de Mestrado em Relações Internacionais da Uerj, "nesse novo espaço internacional que está em crise, por um lado, e pelo ritmo e aceleração da globalização, por outro, vem, impressionantemente, crescendo o papel dos Estados emergentes, que têm o G-20 (substituto do plano regulatório do sistema financeiro do pouco democrático G-7), os Brics, bem como as plataformas do comércio inter e intrablocos regionais, além das redes sociais, da imagética criativa dos serviços digitais.

Ele destaca que temos, em comparação com os outros Brics, consolidada a democracia, como forma e regime político, uma cultura diversa, plural e com formas ativas, artística, musical.

"Isso é o que o Brasil leva ou tem que ter como estratégia política e diplomática, na sua inserção internacional, que garanta benefícios agora e para o futuro."

Brigagão lembra que o Brasil tem, com a Amazônia, o seu rico e complexo ecossistema - muito pouco explorado no seu essencial, que é o DNA dos recursos naturais para a produção de fármacos indispensáveis à saúde.

Ele destaca também o que chama de "a plataforma mais homogênea":

"Língua e pertencimento a essa ilha continental, ocidental no que se pode ser, comportamentos mais modernos e contemporâneos, muito atinados com o mundo, resultado de três fatores: a redemocratização, os projetos e realizações da integração regional (hoje ainda mais integrada fisicamente - transporte, energia e comunicação), e a globalização."

Na coluna de sexta-feira, cometi um equívoco que merece ser reparado: não foram os policiais federais que recusaram a proposta de suborno para liberar o traficante Nem, mas policiais militares do Batalhão de Choque da PM do Rio de Janeiro.

FONTE: O GLOBO

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