Segurança é missão de prefeito
AGENDA RECIFE - COMBATE AO CRIME
O que o morador do Recife espera do futuro prefeito? Qual o principal problema do bairro onde vive? O Instituto Maurício de Nassau foi às ruas da capital ouvir quais são as prioridades do recifense. A voz do cidadão coloca o dedo na ferida. Traz para o centro do debate um tema que costuma ficar, estrategicamente, esquecido nas campanhas municipais. Para 35% das 2.879 pessoas ouvidas na pesquisa, realizada em maio deste ano, é a segurança pública o maior problema do município. A preocupação com o combate à violência fica muito à frente do segundo ponto apontado pelos eleitores: saneamento, citado por 13% dos entrevistados. O JC inicia hoje uma série de reportagens que vai debater a cidade a partir da ótica de quem mais interessa: o recifense. Até o próximo domingo, é a opinião do eleitor que pautará a discussão. Na agenda, o futuro de uma das principais capitais do País.
Ciara Carvalho
Maria Helena da Cruz é dona de casa. Tem 43 anos, nasceu e se criou na Várzea, na Zona Oeste do Recife. Adora o bairro, mas a rua onde ela mora é um breu. No escuro, a via costuma ser palco de assaltos. Maria Helena reclama: “O prefeito tinha que cuidar da segurança. Botar luz é proteger o cidadão dos bandidos”. A dona de casa tem razão. Não está escrito em lugar algum que cuidar da segurança é uma responsabilidade exclusiva do governador ou do presidente da República. O que o artigo 144 da Constituição diz, com todas as letras, é que a “segurança pública é dever do Estado”. O Estado, leia-se aqui a autoridade governamental, o gestor público. Uma interpretação que a maioria dos prefeitos insiste em ignorar. Mas o recifense não quer saber de desculpa. Ele quer segurança. E, ao eleger o combate à violência o principal problema da cidade, joga o tema direto no colo do futuro prefeito da capital.
A cobrança é ainda mais forte, dependendo do local onde o entrevistado mora. Seguindo a mesma divisão da cidade adotada pela Prefeitura do Recife, a pesquisa consultou os eleitores de acordo com as regiões político-administrativas onde vivem, as chamadas RPAs. Ao todo, são seis no Recife. A grita maior veio dos bairros da RPA 2, que inclui locais como Encruzilhada, Rosarinho, Campo Grande, Água Fria e Bomba do Hemetério. Para 41% dos moradores dessa área, a segurança é o principal calo do recifense. “À noite, essa região fica abandonada. Por causa da prostituição e do ponto de venda de drogas que existem em torno do Mercado da Encruzilhada, evito sair de casa quando escurece. Minha filha já foi assaltada e temo a ação dos marginais”, diz o militar aposentado Erandir Pereira de Freitas, 70 anos.
O que o morador da Encruzilhada reclama não se resolve apenas com policiamento, mas com ordenamento urbano e acompanhamento social. É nesse viés que o gestor municipal se insere no debate da segurança. Defensor da ideia de que criminalidade também é assunto para as prefeituras, o coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e consultor na área de segurança pública José Vicente da Silva Filho aponta uma omissão dos gestores municipais nessa área. “Muitos prefeitos preferem lavar as mãos até por não saber o que fazer. Mas a experiência tem mostrado que quando há a participação das prefeituras os resultados são muito mais eficientes”, avalia. Para o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Adriano Oliveira, um dos coordenadores da pesquisa realizada pelo Instituto Maurício de Nassau, o resultado da consulta coloca, de forma definitiva, o tema da segurança na agenda dos prefeitos. “Não há mais como transferir essa responsabilidade apenas para o governador e o presidente.”
Os exemplos, ainda que raros no Brasil, ratificam esse entendimento. Cidades como Diadema, em São Paulo, e Canoas, no Rio Grande do Sul, viraram referência no enfrentamento à violência justamente por terem tomado para si a responsabilidade na promoção da segurança pública. Não só com políticas de prevenção, mas sobretudo com uma atuação integrada junto aos órgãos de segurança e uma intervenção territorial focada nas áreas mais degradadas. Uma parceria ainda bem distante da realidade do Recife.
Silêncio emblemático
Em fevereiro deste ano, a Secretaria de Defesa Social promoveu uma reunião do Gabinete de Gestão Integrada com representantes das prefeituras da Região Metropolitana, propondo uma minuta de convênio para que os municípios entrassem de forma mais incisiva no combate à violência. Foi entregue a cada uma das cidades um CD mostrando áreas que favorecem a criminalidade e que poderiam ser tratadas de forma prioritária pelas prefeituras. A ideia era que os municípios apresentassem propostas que poderiam ser implantadas em conjunto com as Polícias Civil e Militar. Cinco meses depois, nenhuma resposta da Prefeitura do Recife foi dada à SDS. Uma omissão que fica ainda mais grave por se tratar da capital, pela relevância e liderança natural que a cidade ocupa na RMR.
Os números da criminalidade do Recife exigem pressa nas ações integradas. Detentora em 2000 do incômodo posto de capital mais violenta do País, hoje a cidade ocupa o 5ª lugar no ranking nacional. Apesar da redução, a quantidade de homicídios ainda é alarmante. No ano passado, 692 pessoas foram assassinadas no Recife. Em números absolutos, a região recordista em mortes, em 2011, foi a RPA 6, que inclui bairros como Boa Viagem, Ibura e Jordão. Foram 148 assassinatos nessa região. Quando o critério é a taxa de mortalidade, quem dispara no mapa da violência da capital é a RPA 1, que engloba bairros como Santo Amaro, Coelhos e Boa Vista. É, de longe, a taxa mais alta, com 85,93 mortes por 100 mil habitantes. Praticamente o dobro do percentual do Recife, cujo índice é de 43,87 mortes por 100 mil habitantes.
Responsável pela execução do Pacto pela Vida, programa do governo do Estado criado para reduzir a criminalidade em Pernambuco, o secretário de Defesa Social, Wilson Damásio, diz que as prefeituras são o ente governamental que está faltando nas ações integradas de segurança. “No Recife a gente ainda precisa avançar muito. Por enquanto, há propostas, mas nada de concreto. Nós temos feito um bom trabalho com a Secretaria de Segurança Cidadã e com a Dircon, mas ainda é uma ação muito restrita”, analisa. O secretário diz que essa parceria é essencial para atingir índices maiores de redução da violência. “De forma alguma a gente vai conseguir uma segurança de 1º mundo sem a participação das prefeituras”, defende. “Qualquer gestão municipal moderna não pode mais excluir a questão da segurança no debate da cidade. O prefeito precisa reconhecer que esse também é um problema dele.”, reforça o coronel José Vicente. A população, pelo que indica a pesquisa, vai cobrar esse compromisso.
FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)
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