O momento, para os tucanos, é de declarar guerra ao governo (como fez Aécio Neves ontem, na festa da Força Sindical) e selar a paz interna. Espera-se no partido que hoje, na convenção da seção paulista, o ex-governador e ex-ministro José Serra deixe claro que não sairá do PSDB para se filiar ao Mobilização Democrática nascido da fusão PPS-PMN. Naturalmente ele não pronunciará o "fico": assim como os maridos, um político não confessa ao partido que pensou em abandoná-lo. A pacificação teve início com as articulações do governador Geraldo Alckmin para garantir ao grupo serrista o comando do partido na capital e avançou a partir da conversa dura e franca entre Serra e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O grupo aecista fez também os pequenos mas necessários gestos de afago a Serra, avisando que, acertadas as arestas, o ex-governador será prestigiado e valorizado pelo novo comando partidário, que terá o próprio Aécio na presidência, segundo seus apoiadores para facilitar sua movimentação como pré-candidato. Exemplo de um afago com endereço certo, o beliscão do presidente do PSDB mineiro, deputado Marcus Pestana, no pré-candidato do PSB, governador Eduardo Campos, lembrando-lhe que seu slogan "é possível fazer mais" não passa de uma variação do lema "o Brasil pode mais", adotado por Serra em sua disputa com Dilma em 2010.
Na conversa da semana passada, Fernando Henrique fez uso da velha amizade com Serra, iniciada nos anos de exílio no Chile, para lhe dizer, com toda franqueza, que sua resistência à candidatura de Aécio e a hipótese de trocar o PSDB pelo MB revelavam um grande egoísmo partidário. O PSDB lhe possibilitou, teria recordado FH, sem criar qualquer dificuldade, disputar todos os cargos que quis, inclusive a presidência por duas vezes. E embora discordando da estratégia, aceitou que ele renunciasse à prefeitura paulistana, depois de dois anos no cargo, para concorrer ao governo do estado, deixando a seguir de disputar a reeleição para concorrer novamente à presidência em 2010. Agora era sua vez de ser recíproco, apoiando a candidatura de Aécio, que não enfrenta contestações internas. Teria ainda argumentado que Serra nada ganharia ao trocar um partido estruturado, de grande capilaridade, como o PSDB, por uma sigla pequena em busca de expansão. Ficando, o PSDB lhe garantiria o papel que quisesse em 2014. Exceto, é claro, o de candidato a governador (porque Alckmin quer se reeleger), o de presidente do partido e o de candidato a presidente, já pactuados pela maioria dos diretórios com Aécio. FH e Serra sempre tiveram uma relação pessoal e política complexa e conflitiva mas, indiscutivelmente, eles se respeitam.
Certamente contribuíram também para o esperado "fico" de Serra o fato de nenhum de seus mais leais seguidores tucanos estarem dispostos acompanhá-lo numa eventual migração para o MB. Isso ele ouviu pessoalmente, por exemplo, do senador Aloysio Nunes Ferreira e dos deputados Jutahy Júnior e Vaz de Lima.
Nova etapa
Confirmado o armistício interno, Aécio terá vencido um dos principais obstáculos à decolagem de sua candidatura. Mesmo preservando as relações amistosas com Eduardo Campos e Marina Silva, daqui para a frente ele tratará de se diferenciar dos dois dissidentes do lulo-petismo. Campos, com sua promessa de "fazer mais", busca passar a ideia de que não é "contra" os governos petistas, acha-se apenas mais competente. Marina, com sua pregação sonhática de que é possível fazer política de outro modo, também fica no campo da terceira-via. Seria apenas mais "pura", embora desejando para seu novo partido o tempo de televisão decorrente da cooptação de deputados de outros partidos. É o que se depreende dos protestos de seus seguidores e aliados contra o projeto de lei que põe ordem nas migrações. Um sinal de que Aécio tem outro plano de voo, como oposição e não como "terceira via", foi seu duro discurso ontem na festa sindical do deputado Paulinho da Força, acusando Dilma de ser tolerante com a inflação. O fogo alto na política econômica, por sinal, é um discurso que agrada a Serra. O teste da unidade será na convenção nacional do próximo dia 19, que colocará Aécio no comando do PSDB, abrindo a nova fase de sua pré-campanha e colocando mais fogo na disputa.
Anistia e Verdade
Finalmente o atual coordenador da Comissão da Verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, disse o esperado pelas entidades que representam vítimas e famílias de vítimas da ditadura: a prioridade é a identificação dos mortos e desaparecidos e a identificação das cadeias de comando do terror. No final, a comissão proporá a revisão da Lei da Anistia, para que possam ser punidos. Ainda que não o sejam, o Brasil Democrático precisar saber quem mandou jogar prisioneiros indefesos na Restinga de Marambaia, para que os jacarés apagassem os vestígios de suas vidas dedicadas à resistência. Ou quem mandou incinerar os corpos dos que foram mortos na Casa da Morte em Petrópolis. Quem comandou tantos horrores mais.
Militares perseguidos
Recebi correspondência da associação dos militares da Aeronáutica que foram punidos porque se recusaram a participar do golpe de 1964, em defesa da Constituição em vigor. Foram anistiados pelo governo Fernando Henrique 40 anos depois, mas em 2003, no início do governo Lula, os comandos militares não aceitaram que fossem reintegrados. A Aeronáutica e o Ministério da Justiça, de uma só vez, anularam 495 anistias. Todos eles, na faixa dos 70 anos, perderam os proventos e os benefícios, como o plano de saúde. No STJ e no STF, as ações recursais não andam. A presidente, tão atenta à verdade e à reparação, poderia conferir.
Fonte: Correio Braziliense
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