Por doença ou expurgo o PT perde quadros. Mas se renova
Diante de paineis com as fotos do ex-ministro Luiz Gushiken e do governador Marcelo Déda, mortos em 2013 vítimas de câncer, militantes petistas fizeram ato de desagravo a José Genoino, José Dirceu, Delúbio Soares e João Paulo Cunha, ex-dirigentes do PT condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão. Triste saldo para o PT neste ano: dois líderes importantes mortos e quatro condenados - três deles já presos.
As homenagens que marcaram o 5º Congresso Nacional do PT, no início do mês, em Brasília, são emblemáticas. Nos seus 33 anos de existência, o partido acumula perdas. Seja por doença, morte, envolvimento em corrupção ou expurgo, provocado por divergência da cúpula, foram muitas as baixas de companheiros de Luiz Inácio Lula da Silva na fundação da legenda.
Petistas reconhecem: o poder tem custado caro ao PT. Um custo maior do que o processo natural de envelhecimento de um partido. O PSDB ficou oito anos no governo e até hoje, 11 anos após ter deixado o Palácio do Planalto, mantém lideranças históricas em seus quadros.
"Lamentavelmente, perdemos muita gente no meio do caminho, como Chico Mendes [ativista ambiental do Acre, assassinado em 1988], Luiz Gushiken, Marcelo Déda. Parte saiu para criar outros partidos, como Marina Silva [ex-ministra de Lula, que trocou o PT pelo PV e hoje está no PSB, enquanto tenta viabilizar o Rede sustentabilidade]. Lá atrás, perdemos Bete Mendes [atriz, uma das fundadoras do PT, do qual foi afastada por ter votado em Tancredo Neves para presidente da República, no Colégio Eleitoral, quando deputada federal]", lembra o senador Jorge Viana.
Coordenador das campanhas presidenciais de Lula em 1989 e 98, Gushiken foi chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência, quando houve denúncias de irregularidades nas verbas. Incluído na ação penal 470 (mensalão), foi absolvido por falta de provas. Morreu em setembro de 2013, aos 63 anos, em consequência de um câncer no aparelho digestivo.
Aos 53 anos, Marcelo Déda morreu em decorrência de um câncer gastrointestinal, em dezembro. Compadre de Lula (o ex-presidente é padrinho de uma filha de Déda), estava no segundo mandato de governador de Sergipe. Lula perdeu outros aliados muito próximos. O então prefeito de Santo André, Celso Daniel, que iria coordenar a campanha presidencial de 2002, foi morto a tiros meses antes da eleição, num crime nunca envolto em suspeitas.
Antonio Palocci, então prefeito de Ribeirão Preto, ocupou a coordenação que seria de Celso Daniel. Foi um dos ministros mais influentes de Lula e teve seu nome cotado para disputar o governo de São Paulo e até a Presidência da República, em 2010. Mas foi politicamente abatido não uma, mas duas vezes.
O êxodo petista começou antes da primeira eleição de Lula. Em 85, junto com Bete Mendes, foram expurgados os deputados Airton Soares e José Eudes. Em 2003, foram expulsos a senadora Heloísa Helena e os deputados Luciana Genro e João Batista, o Babá, por votarem contra a reforma da Previdência. A expulsão levou petistas históricos a deixar a legenda, como Leandro Konder, Milton Temer e Carlos Nelson Coutinho.
Um dos casos traumáticos de baixa petista é o de Luiza Erundina, eleita prefeita de São Paulo em 1988. Uma das fundadoras do PT, aceitou convite de Itamar Franco para assumir a Secretaria da Administração Federal, após o impeachment de Fernando Collor. Teve os direitos e deveres partidários suspensos por um ano. Em 97, após 17 anos de militância no PT, Erundina deixou o PT. Está no PSB.
"As perdas fazem parte da construção de um partido. Especialmente como o PT, genuíno na sua criação, que não veio na trilha dos partidos convencionais", avalia o senador Jorge Viana, do Acre, que foi companheiro de Marina e Chico Mendes. "Não tem como um partido se manter com a pureza dos seus fundamentos, se ele vira uma alternativa de poder e, mais do que isso, governa", diz. Para Viana, embora "lamentáveis", alguns afastamentos ajudam o partido a "ficar melhor, porque fica mais coeso".
Em 2013, o deputado federal Domingos Dutra, ex-dirigente do PT no Maranhão, deixou o partido por divergir da determinação de apoiar o nome que for lançado pela família Sarney a governador, em vez de aderir à candidatura de Flávio Dino (PCdoB), também aliado do governo Dilma. Em 2010, fez greve de fome de dez dias pelo mesmo motivo. "Está chegando 2014 e o PT do Maranhão continua no curral do Sarney. Diante dessa situação não posso continuar no partido", disse, em discurso. Filiou-se ao SDD.
Há os que divergem, os que se calam, os que são calados, os que saem do PT e os que são abatidos por doença. É o caso, por exemplo, do ex-senador José Eduardo Dutra, que foi um dos coordenadores da campanha de Dilma e teve de deixar a presidência do PT por problemas de saúde. Hoje, ele está bem, mas menos envolvido nas atividades partidárias. "É claro que essa atividade política teve um custo de saúde, mas eu faria tudo de novo", diz.
O ex-deputado Paulo Delgado, "franco atirador" na bancada do PT, acredita que a política pode causar problemas à saúde. "O corpo reflete o sentido de ordem da política. Ele se desorganiza com a desorganização política", diz. Delgado está recolhido. "É preciso voltar às ideias originais do PT, que o partido distorceu para poder aumentar o grau de controle da sociedade."
Na avaliação de petistas, Lula, liderança inconteste no partido, é responsável por sufocar vozes e não dar espaço para concorrentes. Dirigentes do PT importante na década de 80, Olívio Dutra foi ministro das Cidades do governo Lula e em julho de 2005 foi demitido para dar lugar a Márcio Fortes, do PP. Continua no PT, mas afastado da direção partidária e crítico da conduta do partido no caso do mensalão.
O outro lado da moeda é a renovação do PT. Por estratégia política ou sobrevivência, Lula estimula a formação de uma nova geração petista e o partido constrói novos quadros. Inventou as candidaturas de Dilma para presidente, Fernando Haddad para prefeito e Alexandre Padilha para governador, em 2014. É Lula pensando no PT pós 2018.
Fonte: Valor Econômico
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