Ativistas do MST e policiais entram em confronto na Praça dos Três Poderes. Ato ocorre na semana em que o Congresso debate projeto de lei que abre brecha para enquadrar manifestantes como terroristas
André Shalders, Daniela Garcia, Luiz Calcagno e Kelly Almeida
Menos de 24 horas depois de o projeto da chamada lei antiterrosismo ganhar corpo e voltar ao centro do debate no Executivo e no Legislativo, especialmente após a morte do cinegrafista Santiago Andrade durante protesto no Rio de Janeiro, a Praça dos Três Poderes foi palco de confronto entre policiais militares e integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na tarde de ontem. Segundo a corporação, 30 PMs e pelo menos três manifestantes ficaram feridos. Até mesmo a sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) teve de ser interrompida
Os problemas ocorreram no dia seguinte à mudança de discurso da bancada do PT no Senado para adiar a análise da lei antiterrorismo — que abre brechas para o endurecimento das punições a manifestantes. Uma das intenções do partido, orientado pelo próprio governo, é evitar que movimentos sociais, como o MST, acabem sendo criminalizados.
Entre os policiais feridos, oito precisaram de cuidados especiais, pois sofreram cortes profundos e tiveram que passar por pequenos procedimentos cirúrgicos, como sutura, em um hospital particular da Asa Norte. Um deles chegou a receber 30 pontos. Segundo o capitão Aguiar, da assessoria de comunicação da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), todos tiveram alta por volta das 21h30.
A desproporção entre o número de policiais e o de manifestantes pode ter sido uma das causas da violência. Segundo o capitão da PMDF Marcos Henrique, que coordenava a operação, o efetivo no local era de apenas 250 PMs, além de 20 soldados do Batalhão de Choque. Já o número de manifestantes, de acordo com o MST, era de 15 mil pessoas. Em conversa com jornalistas, o secretário-geral da Presidência, ministro Gilberto Carvalho, se mostrou surpreso com os problemas. “O espaço público tem que ser preservado, eles sabem disso, nós combinamos tudo direitinho. Só houve confusão porque alguns correram na frente e derrubaram o alambrado.”
O tumulto começou por volta das 16h10, quando ativistas derrubaram parte das grades em frente ao STF. Vinte minutos depois, o mesmo problema ocorreu em frente ao Palácio do Planalto. O objetivo do grupo era ocupar a pista e construir barracas de lona, além de colocar cruzes de madeira no asfalto. A PM reagiu com armas de choque e spray de pimenta. O Batalhão de Choque foi acionado e, mesmo assim, outro grupo derrubou o que restava das grades.
Minutos depois, uma discussão entre os sem-terra e policiais foi o estopim para as agressões. O conflito começou quando um ônibus do MST estacionou na Praça dos Três Poderes. Do veículo, integrantes do movimento retiraram cruzes para pôr em frente ao Palácio do Planalto para lembrar assassinatos em conflitos rurais. Policiais militares bloquearam o local em que o material estava sendo descarregado. Segundo o motorista do ônibus, Alairton Vargas, 40 anos, um policial entrou dentro da cabine e puxou com força a chave da ignição. A chave acabou sendo quebrada.
Em volta dos policiais, estavam centenas de manifestantes reclamando que não poderiam utilizar as cruzes. Foi então que começou o confronto, e integrantes do MST começaram a arremessar pedras e cruzes de madeira.
Durante a ação, um PM acertou a cabeça de um jovem, que não teve o nome divulgado. Outro militante, identificado apenas como Daves, levou um tiro de bala de borracha. Médicos do movimento prestaram atendimento ainda no local da confusão. Marcelo Ramires, 20 anos, também ficou ferido. A mãe do jovem, Simone Ramires, 39, se queixou da reação da polícia. “Ele estava na frente, por isso apanhou, mas não estava desafiando ou jogando nada em ninguém. Eu estava por perto e corri. Quando vi, não estávamos mais juntos”, relatou.
A PM negou que o efetivo destacado para acompanhar a marcha tenha sido pequeno. “Tudo havia sido informado à polícia. Sabíamos de onde os manifestantes eram, eles não omitiram informações. Se tivessem conduzido o protesto normalmente, estaria tudo certo, mas eles partiram para o vandalismo”, disse o major Marcelo Koboldt, um dos responsáveis pelo policiamento.
Fonte: Correio Braziliense
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