sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Período de dura convivência

• Primeiro semestre de 2004 foi marcado por rebeliões contra o governo no Congresso

Chico de Gois – O Globo

A declaração do doleiro Alberto Youssef, de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva permaneceu três meses sob forte pressão, diante da rebelião da base aliada para nomear Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento da Petrobras, é corroborada em parte pelos acontecimentos da época. Costa foi nomeado em 24 de maio de 2004 para o cargo, embora sua escolha tenha sido sacramentada pelo Conselho de Administração da Petrobras em 14 de maio. Entre janeiro e maio daquele ano, vários eventos aconteceram no Congresso, demonstrando a insatisfação da base aliada, sobretudo de PMDB, PP, PL (atual PR) e PTB.

O Senado havia sido convocado extraordinariamente em janeiro de 2004 - geralmente, o ano legislativo tem início em fevereiro - para apreciar projetos como a emenda constitucional da reforma do Judiciário, a lei de falências e proteção à Mata Atlântica, entre outros. Os senadores, apesar da convocação, não votaram as matérias. No decorrer do mês, a medida provisória que transformava o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em autarquia acabou trancando a pauta.

Março foi um dos meses mais tensos para o governo. Os parlamentares se rebelaram contra o Palácio do Planalto, exigindo a liberação de emendas; no fim daquele mês, Lula prometeu a liberação imediata de R$ 300 milhões para tentar domar a base. Estava em pauta a votação da medida provisória que proibia os bingos. Setores de PMDB, PP, PTB e PL impediram a votação da MP, que acabou rejeitada depois.

Naquele período, outra dor de cabeça se abatia sobre o governo: Waldomiro Diniz, que trabalhava na Casa Civil, ao lado do então ministro José Dirceu, havia sido flagrado em fevereiro exigindo dinheiro do bicheiro Carlos Cachoeira para campanhas do PT. A oposição fazia força para a criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI), que acabou instalada, com apoio de alguns parlamentares da base.

Quando achou que o assunto estava encerrado, e a rebelião contida, o governo foi, mais uma vez, pressionado pelo PMDB. Dessa vez, por conta de outra medida provisória, a que fazia mudanças na estrutura do Executivo e criava 2.800 cargos de confiança. Os peemedebistas achavam que o Palácio do Planalto queria ocupar as vagas apenas com petistas, e reivindicavam sua parte.

Na Câmara, PP e PTB também voltaram à carga: suas bancadas (106 deputados somados) se recusaram a registrar presença no plenário, forçando o encerramento da sessão por falta de quórum. As reclamações eram as mesmas: verbas não liberadas, indicações para cargos não efetivadas e insatisfação com o tratamento dado por ministros.

Externamente, os presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), reclamavam do excesso de medidas provisórias enviadas pelo governo e diziam que isso dificultava a independência dos poderes. Em abril, mais uma demonstração de descontentamento pelos mesmos partidos: PMDB, PP, PTB e PL e, uma vez mais, pelas mesmas razões, a falta de nomeação de cargos e liberação de verbas.

Somente a partir de maio os ânimos se acalmaram. Naquele mês, não houve registro de rebelião desses partidos.

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