• Dependência de obras estatais, que estão paradas e causam demissões, tende a atingir mais a região, dizem especialistas
• Para cientista político, assistencialismo de Lula e Dilma não criou base para crescimento sustentável nordestino
- Folha de S. Paulo
SALVADOR, SÃO PAULO - Depois do boom de empregos, renda e dos programas sociais nos anos Lula (2003-2010), os nordestinos ainda tiveram um período relativamente próspero sob Dilma 1 (2011-2014).
Agora, neste início de segundo mandato da presidente, preparam-se para cortes nos gastos pessoais diante da redução de investimentos e oportunidades na região.
No Polo Industrial de Camaçari (BA), não há nenhum novo projeto em vista, só a conclusão de fábricas iniciadas durante o boom.
Já a fábrica da montadora chinesa JAC Motors, que teve sua pedra fundamental lançada há mais de dois anos, ficou só na terraplanagem.
Grandes obras de infraestrutura como a transposição do rio São Francisco, a ferrovia Oeste-Leste e o estaleiro Enseada do Paraguaçu, no recôncavo baiano, agora demitem. Neste último, sociedade entre Odebrecht, OAS, UTC e Kawasaki, foram mais de 5.000 cortes em seis meses.
Segundo o sindicato dos trabalhadores, restaram apenas 120 funcionários atuando na área industrial.
Um dos demitidos é Jaílton Souza Ribeiro, 48, dispen- sado em fevereiro com seus dois filhos, de 21 e 22 anos, que também trabalhavam no estaleiro. "Fica um sentimento de frustração. Não vamos encontrar vagas com o mesmo nível na região", afirma Ribeiro.
A doméstica Jaguaraci Freitas, 43, que vive na Ilha de Itaparica, na Grande Salvador, também viu a oferta de empregos na sua região diminuir. Desempregada, vive de bicos, da coleta de mariscos e de R$ 160 do Bolsa Família.
Assistencialismo
Para o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, boa parte da popularidade de Lula e de Dilma (que venceram eleições no Nordeste) estava lastreada em políticas assistencialistas que não formaram as bases para um crescimento sustentável na região.
José Márcio Camargo, professor da PUC-Rio e economista da Opus Gestão de Recursos, acrescenta que, por ser muito dependente de obras do governo federal e de políticas assistencialistas, o Nordeste tende a sofrer mais agora com a inflação e corte de gastos estatais. O fato deve levar a uma queda forte no consumo regional.
Mas há quem mesmo na crise mantenha o ritmo de expansão. Caso da rede de farmácias Pague Menos, criada no Ceará e que já tem 755 lojas pelo país.
A empresa cresceu 17,7% no ano passado e mantém uma meta de avançar 18% em 2015, com 90 novas lojas.
Presidente do grupo, o empresário Deusmar Queiróz diz que o mercado não pode ser visto de maneira uniforme e que há espaço para crescer.
O empresário João Carlos Paes Mendonça, presidente do Grupo JCPM, com dez shoppings no Nordeste, vai na mesma linha e pretende abrir nova unidade em Fortaleza e expandir duas unidades em Salvador e Aracaju.
"Já vimos muitas crises. Esta é das fortes, pois envolve política, economia e corrupção. Mas vamos em frente."
Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, afirma que a desvalorização do dólar também pode ajudar indústrias que criaram ou ampliaram operações no Nordeste (para estar mais próximas dos consumidores) a se voltar neste momento de crise ao mercado exportador.
Na Bahia, a Cooperativa Agrícola de Juazeiro, produtora de frutas, pretende tomar esse rumo diante da queda de faturamento no Brasil.
"Hoje, 80% da produção é para o mercado interno. Vamos ter de focar as exportações, mas isso não acontece da noite para o dia", diz.
Segundo pesquisa do instituto Data Popular, 68% dos nordestinos esperam um 2015 pior do que o ano passado.
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