Rafael Martins de Souza* - O Globo
Entre as alternativas discutidas no governo para o ajuste fiscal, uma das opções é fazer com que os gastos discricionários (aqueles não carimbados como obrigatórios) recuem aos níveis de 2013. O desafio, porém, é mais complexo do que parece, pois as despesas obrigatórias e os gastos mínimos garantidos por lei fazem com que as verbas não contingenciáveis correspondam a cerca de 90% do total do Orçamento da União.
As despesas classificadas como obrigatórias, como os benefícios previdenciários (que podem crescer, com a mudança no fator previdenciário), serviço da dívida, funcionalismo, entre outras, não podem ser cortadas. Há ainda demandas do Congresso, como a obrigatoriedade de execução de emendas parlamentares e o aumento do fundo partidário, aprovadas este ano. A margem de manobra é curta.
Para que a despesa discricionária de 2015 seja igual à de 2013 (corrigida pela inflação), seria necessária uma economia igual ou superior a R$ 80 bilhões, nível discutido pela equipe econômica e o dobro do anunciado no início do ano passado, R$ 44 bilhões. Os ministérios com mais recursos discricionários autorizados são as pastas de Educação, Cidades, Saúde e Transportes, que juntos contribuiriam com economia próxima a R$ 50 bilhões do esforço fiscal.
O problema é que a redução de serviços de educação e saúde tende a gerar reações e esbarra nos limites legais de gastos mínimos. Com isso, é possível que mais sacrifícios recaiam sobre os ministérios das Cidades e dos Transportes, impactando ainda mais os investimentos públicos, finalidade da maior parte dos recursos livres desses ministérios.
Diante de tal quadro, tudo indica que a sociedade brasileira tem boas chances de lidar com as formas mais recorrentes de reequilíbrio orçamentário: corte de investimentos e aumento de tributos. Com uma carga tributária superior a 35% (a maior entre os países emergentes), a combinação apresentada não é a ideal para o Brasil, embora necessária. Mas o que realmente ajudaria a colocar o Brasil a caminho do futuro que todos desejam é a melhoria do processo orçamentário, como maior transparência e melhor compreensão das escolhas que ele representa.
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(*) Coordenador de pesquisa da FGVDAPP
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