A votação inicial favorável na Câmara, na primeira semana de maio, da MP 665 do seguro-desemprego e do abono salarial – mesmo com as concessões que tiveram de ser feitas pela equipe econômica – sinalizou a remontagem de uma base governista capaz de propiciar viabilidade às medidas essenciais do ajuste das contas públicas dependentes do Congresso. Isso reabriu perspectivas de sucesso do articulador parlamentar do governo, Michel Temer, bem como de tal viabilidade – as duas variáveis político-institucionais indispensáveis para uma recuperação de condições de governabilidade da presidente Dilma Rousseff. Perspectivas que, embora incipientes e atropeladas por novos episódios de conflito entre os presidentes das duas Casas do Congresso e o Executivo, como a aprovação e rápida conversão em lei da PEC da Bengala, ensejaram um alívio à chefe do governo nos círculos político-partidários e atenuaram preocupações do mercado financeiro interno e externo. Com a contrapartida de estreitamento do espaço para o debate e o encaminhamento de propostas do “Fora Dilma”.
Mas esse clima começou a deteriorar-se na semana passada sob o efeito da derrota na Câmara do projeto de manutenção do Fator Previdenciário. Seguida de declarações do presidente do Senado, Renan Calheiros, antecipando postura semelhante dos senadores sobre a matéria. E desdobrada pela reemergência do risco de mais derrotas na sequência da tramitação das medidas do ajuste. Entre elas o projeto que restringe a desoneração da folha de pagamento das empresas. Esse projeto substitui MP devolvida pelo Senado, e com o início de sua vigência em 2015 o ministro Joaquim Levy busca, ou buscava, diminuir a perda já perto de R$ 4 bilhões da economia de R$ 18 bilhões programada para este ano no pacote do ajuste. Mais grave, porém, será a extinção do Fator Previdenciário, cuja confirmação agravará – na contramão por inteiro da proposta do ajuste –, e seriamente, os problemas fiscais do país. Num contexto em que a receita do INSS, em 2014, foi de R$ 337 bilhões, enquanto a despesa elevou-se a R$ 394 bilhões (ou 7,1% do PIB). Um déficit de R$ 56 bilhões que pode passar este ano de R$ 80 bilhões. Desastre institucional decorrente da incapacidade e da impossibilidade do governo de propor alternativa (até pelas agudas contradições entre o projeto e a retórica populista do lulopetismo e da campanha reeleitoral da presidente) e da persistência de sua fragilidade no Congresso.
O retorno da incerteza, nos meios políticos e econômicos, a respeito da viabilidade de consistência do ajuste se dá no cenário de um processo recessivo e de escalada do desemprego mas, também, contraditoriamente, de aumento da inflação, que impõe juros elevados. Processo a ser agravado por forte contingenciamento dos recursos federais (bem como dos estados e municípios), a ter seu tamanho determinado esta semana, e pela ampliação da já abusiva carga tributária.
Do cenário especificamente político que temos à frente podem ser destacados os ingredientes que seguem. Recuperação de condições mínimas de governabilidade pela presidente no caso da aprovação de parte ao menos razoável do pacote de ajuste, com melhora dessas condições e atenuação do isolamento dela; ou, sem isso, deterioração ainda maior de tais condições e do elevado grau de rejeição social que ela está sofrendo, com a contrapartida da retomada das manifestações de protesto e espaço político-institucional para a abertura de um processo de impeachment. Persistência de conflitos entre a chefe do Executivo e os presidentes da Câmara e do Senado e precariedade da base parlamentar governista, com jogo próprio, antipetista, do PMDB. Fortalecimento do PSDB de Aécio Neves e FHC como principal alternativa ao governo e ao PT. Reação do ex-presidente Lula com ações, ambíguas, de respaldo à sucessora e para distinguir-se dela por meio da montagem de uma “frente popular” do PT com a CUT, o MST e os chamados movimentos sociais. Disputa de protagonismo oposicionista através de propostas de terceira via apresentadas por partidos de porte médio reforçados por fusões (PTB-DEM e PSB-PPS), objetivo também do realinhamento do PDT. Desdobramentos da operação Lava-Jato com maior envolvimento dos governos Lula e Dilma; de par com o desencadeamento pelo STF de processos contra lideranças políticas com direito a foro privilegiado (inclusive os presidentes da Câmara e do Senado).
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Jarbas de Holanda é jornalista
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