- O Estado de S. Paulo
Com o governo Dilma Rousseff paralisado e o ex-presidente Lula, ao contrário, se mexendo freneticamente, parte do PT e diferentes setores da esquerda discutem como se descolar da crise política, econômica e ética e se movem em direção a um projeto ambicioso: a criação de um novo partido.
As articulações, restritas aos bastidores do Congresso e a reuniões fechadas em apartamentos funcionais, partem da constatação de que o Brasil vive o fim de um ciclo político. Depois de 13 anos no poder, do fiasco do governo Dilma e do imenso desgaste da imagem do PT e até do próprio Lula, pesquisa Ibope indica que o partido passou a ter a maior rejeição do País. É hora de mudar e de resgatar as teses da esquerda que afundam junto com a era petista.
Além da avaliação política, há também uma ameaça objetiva. Atrás dos diretores e gerentes da Petrobrás, dos donos e executivos das maiores empreiteiras, dos doleiros e dos políticos, os próximos da fila da Lava Jato, em 2016, serão os três partidos envolvidos no chamado “petrolão”: PT, PMDB e PP.
Esses partidos devem ser chamados a contribuir para o ressarcimento da Petrobrás por perdas que, segundo o Estado, podem chegar a R$ 42 bilhões. E há ainda a possibilidade de multas, bloqueio do Fundo Partidário e até suspensão do próprio registro de funcionamento – em pleno ano da eleição municipal. Golpes que podem ser mortais.
Participam das conversas parlamentares do PT, PSOL, PDT e PSB e da Rede da Marina Silva, mas também líderes de movimentos sociais identificados com as esquerdas, mas não braços do PT, como são CUT, MST e UNE. Na semana passada, por exemplo, o coordenador-geral do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), Guilherme Boulos, viajou a Brasília para trocar figurinhas sobre os rumos da esquerda e a falta de rumos do PT. Reuniu-se com pelo menos dois senadores, Lindbergh Farias, lulista do PT do Rio, e Randolfe Rodrigues, ex-PT, ex-PSOL e atual Rede do Amapá.
A fila é grande e inclui o deputado Alessandro Molon, que foi 18 anos do PT e foi o deputado mais votado do partido no Rio, mas não teve paciência para esperar o novo partido e pulou na Rede Sustentabilidade. Mudou de partido, mas não abandonou as conversas com as esquerdas.
Uma das grandes questões, aliás, é qual o papel de Marina Silva e da Rede. Com a política brasileira tão polarizada entre PT e PSDB, com a Polícia Federal e o Ministério Público aproximando-se perigosamente de Lula e com a falta de novos líderes no horizonte, Marina é considerada um personagem-chave de qualquer articulação das esquerdas.
Em 1985, nos estertores do ciclo militar, a dissidência do PDS apostou em Aureliano Chaves pelo Colégio Eleitoral indireto e, quando a aposta furou, partiu para o plano B: aderiu à eleição do pemedebista Tancredo Neves, contra Paulo Maluf, e depois lançou o PFL, atual DEM.
Em 1988, com a Constituinte encerrando o ciclo da transição, a dissidência à esquerda do PMDB jogou suas fichas: nas primeiras eleições diretas para presidente, em 1989, apoiaria a candidatura do deputado Ulysses Guimarães, mas não a do governador Orestes Quércia. Acabou dando Ulysses, mas era tarde: FHC, Montoro, Covas, Serra, Richa já tinham decidido criar o PSDB.
Desde a chegada de Lula ao Planalto, em 2003, o PT já perdeu um pedaço para o PSOL, outro quando Marina trocou de legenda e mais um agora com a ida de Marta Suplicy para o PMDB e de Molon para a Rede. Mas todas essas cisões foram congressuais, sem impacto real nas bases. Em 2016, os dissidentes querem abandonar a tese de “refundação do PT” e partir para algo mais concreto, estratégico e abrangente: um novo partido que possa, além de resgatar um discurso de esquerda, devolver a esperança ao imenso mar de desesperança em que se debatem os petistas e a esquerda. É um balão de ensaio, mas faz sentido.
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