Flávio Ferreira – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - O Ministério Público de São Paulo investiga se a empreiteira OAS buscou favorecer o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao reservar para a família dele um apartamento triplex no Guarujá (litoral de SP) e pagar por uma reforma estrutural no imóvel no valor de R$ 700 mil.
A Promotoria colheu depoimentos de engenheiros e funcionários do condomínio que apontam que apenas familiares de Lula estiveram no triplex durante as fases de construção e reforma do imóvel e que as visitas envolveram medidas para esconder a presença do ex-presidente e parentes no condomínio.
A família do ex-presidente desistiu de ficar com o triplex depois da publicação de reportagens sobre o imóvel.
Uma das visitas teria ocorrido em 2014 com o então presidente da OAS José Aldemário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, que chegou a ser preso na Lava Jato, acusado de corrupção na Petrobras.
O zelador do prédio disse que um funcionário da OAS orientou-o a não falar da ligação de familiares do ex-presidente com o imóvel.
Os promotores investigam a transferência de empreendimentos da cooperativa habitacional Bancoop, entre eles o triplex do Guarujá, para a OAS em 2009. Apuram também se a construtora usou apartamentos do prédio, na praia de Astúrias, para lavar dinheiro ou beneficiar pessoas indevidamente.
Um dos testemunhos foi o do engenheiro e ex-funcionário da OAS Wellington Aparecido Carneiro da Silva, que trabalhou na fase final de construção do triplex.
Ele contou que o imóvel era destinado a Lula, que chegou a fazer uma "vistoria padrão" no imóvel, concluído no fim de 2013. Silva disse que abriu a porta do triplex para que Lula entrasse, mas dentro da unidade ele foi acompanhado pelo coordenador de engenharia da OAS, Igor Pontes.
Outros depoimentos apontam indícios da ligação de Lula e familiares com as reformas no triplex a partir de abril de 2014.
Surpresa
Armando Magri, sócio da construtora Tallento, executora da reforma, disse que estava no triplex em uma reunião com Igor Pontes e um diretor da OAS chamado Roberto quando foi surpreendido com a chegada da mulher de Lula, Marisa Letícia, acompanhada de três homens.
Segundo Magri, ele posteriormente identificou que eram Pinheiro, um dos filhos de Lula, Fábio Luís, e outro engenheiro da OAS.
Conforme o dono da Tallento, as obras de 2014 "praticamente refizeram o apartamento".
Houve mudança do desenho original da unidade e trocas de acabamento, pintura, piso, instalações elétricas e hidráulicas, além da instalação de um elevador privativo entre o primeiro e o terceiro andar do triplex.
Arranjos
O zelador, José Afonso Pinheiro, disse que durante a reforma Lula e Marisa estiveram no triplex duas vezes. Segundo ele, a OAS limpou o condomínio e decorou o local com "arranjos florais" nos dias das visitas.
Nessas ocasiões, seguranças de Lula seguravam o elevador do prédio enquanto o ex-presidente estava no imóvel, o que gerou reclamações de outros moradores, de acordo com o zelador.
O funcionário do condomínio relatou ainda que nenhuma outra pessoa ou corretor visitou o imóvel.
Outro lado
A assessoria do ex-presidente Lula e a OAS negam irregularidades ligadas ao triplex no Guarujá. O petista e a empresa não se manifestaram especificamente sobre os depoimentos de engenheiros e do zelador do imóvel.
Segundo a assessoria de Lula, Marisa Letícia chegou a visitar o empreendimento algumas vezes, mas o imóvel nunca foi adquirido.
Lançado pela Bancoop, o prédio foi transferido para a OAS em 2009 após a cooperativa habitacional entrar em crise financeira.
A OAS relatou que não teve acesso à investigação. Por isso, não iria comentar.
A construtora disse que visitas a unidades prontas são frequentes e não significam fechamento de negócios. E que nunca houve promessa de compra e venda para qualquer interessado na unidade em questão.
A defesa de Léo Pinheiro, em depoimentos na Lava Jato, negou envolvimento do ex-presidente da OAS com irregularidades.
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