Barbara Nascimento, Danilo Fariello - O Globo
- BRASÍLIA - O governo anunciou que, ao longo de 2015, pagou R$ 72,4 bilhões que devia a bancos públicos e FGTS, quitando a fatura das “pedaladas” fiscais. O rombo nas contas públicas atingiu, assim, o recorde de R$ 118,6 bilhões este ano. -BRASÍLIA- O governo anunciou ontem o pagamento integral de todo o passivo das “pedaladas” fiscais, num total de R$ 72,4 bilhões: R$ 55,8 bilhões empurrados de anos anteriores e R$ 16,6 bilhões deste ano. Estes atrasos do Planalto nos repasses de dinheiro devido a bancos para melhorar artificialmente as contas públicas foram condenados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e são o motivo central do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
— Foram pagos todos os passivos devidos, sejam os relacionados ao levantamento do acórdão do TCU, sejam as despesas referentes a 2015 — afirmou o secretário interino do Tesouro Nacional, Otávio Ladeira.
A maior parte das “pedaladas”, R$ 70,9 bilhões, será paga com dinheiro da conta única (que reúne excedentes financeiros da União), sem emissão de novos títulos da dívida. Desse montante, R$ 21,1 bilhões sairão do colchão da dívida, que são os recursos de títulos emitidos anteriormente pelo governo e que não foram utilizados para a rolagem da dívida.
A exceção foi o R$ 1,5 bilhão devido ao Banco do Brasil, que exigirá uma nova emissão direta de títulos para a instituição financeira, por causa de uma especificidade da dívida. Segundo Ladeira, essa emissão vai ocorrer hoje, ou seja, ainda em 2015.
Um dos maiores problemas de zerar a conta das “pedaladas” é o aumento do endividamento do país, em R$ 55,6 bilhões, segundo o secretário:
— (Os pagamentos) Impactarão o resultado fiscal, a dívida bruta e a dívida líquida. O impacto na dívida pública é de R$ 55,6 bilhões em dezembro. Os gastos de R$ 16,8 bilhões já foram incorporados.
Quando o Tesouro Nacional paga os atrasados aos bancos, eles ficam com mais dinheiro para injetar na economia, o que pressiona a inflação. Para evitar isso, o Banco Central faz operações compromissadas, ou seja, compra títulos no mercado para revendê-los depois. Ao comprar os títulos, o BC aumenta o endividamento público.
Piora no perfil da dívida
A professora Margarida Gutierrez, doutora pelo Instituto de Economia da UFRJ, pondera que o aumento de operações compromissadas pode acarretar o encurtamento do prazo médio da dívida, o que, na prática, é uma piora na qualidade e na avaliação da dívida do país. Isso porque o BC negocia títulos a prazos menores do que o Tesouro. Logo, com mais operações compromissadas, a dívida total encurta. E dívida alta e vencendo mais rápido traz mais risco para o credor.
— Com isso, teremos uma piora no perfil da dívida pública. Ela vai ficar mais curta, mais difícil de ser controlada, e vai aumentar o giro do mercado interbancário, com megaoperações compromissadas do BC — diz Margarida.
A economista afirma também que o uso do colchão de liquidez só foi possível em razão de uma manobra do governo. O colchão da dívida deveria ser usado, originalmente, apenas para garantir o pagamento da dívida pública em condições de estresse do mercado, e não para quitar gastos primários. Foi por meio de medidas provisórias aprovadas no ano passado e neste que o governo federal conseguiu aval do Congresso para usar esse caixa para pagar dívidas primárias. Para Margarida, o mais acertado seria o governo emitir mais títulos públicos de mais longo prazo para pagar as dívidas imediatamente.
O pagamento das “pedaladas” referentes aos anos anteriores será abatido da meta de superávit primário (receitas menos despesas, sem contar gastos com juros) aprovada pelo Congresso, mas em valor menor do que os R$ 57 bilhões previstos. Se esse valor fosse integralmente descontado, o governo fecharia o ano com um déficit de R$ 119,9 bilhões (considerando um rombo de R$ 51,82 bilhões nas contas do governo central e R$ 11,05 bilhões em frustração de receitas de concessões). Com o abatimento menor, o déficit será de até R$ 118,6 bilhões. Ladeira explicou que o montante foi menor porque a conta das “pedaladas” ficou abaixo do projetado em outubro, quando o Orçamento de 2015 foi enviado ao Congresso.
— Tínhamos um espaço de R$ 57 bilhões calculado em cima de uma estimativa. Trabalhamos com uma certa folga, quando fomos pagando, vimos que o passivo era menor.
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