• Ano pode ser ainda mais difícil devido a rombo fiscal, desemprego e instabilidade política
Marcello Corrêa - O Globo
A crise que fez de 2015 um ano perdido para a economia brasileira pode se intensificar em 2016. Entre analistas já há quem espere recessão mais profunda nos próximos 12 meses. Os motivos para o pessimismo são as dificuldades para lidar com as contas públicas, o quadro político incerto e o mercado de trabalho, que tende a piorar, segundo os especialistas. Para quem defende a linha desenvolvimentista — mais gastos públicos e incentivo ao consumo —, a aposta está na gestão de Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda. Ele assumiu o cargo com a missão de aliar o ajuste fiscal à retomada do crescimento.
O Boletim Focus, do Banco Central, prevê que o Produto Interno Bruto (PIB) encolherá 3,7% em 2015. Nas contas da economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, o ano já começa “no negativo” em 1,8% —é o chamado carregamento estatístico. Não significa, no entanto, que esse será o desempenho da economia em 2016. O Focus, que reúne previsões de cerca de cem analistas do mercado financeiro, indica recessão de 2,81% no ano que vem. Zeina não descarta um número pior que esse e ainda mais intenso que o de 2015, embora não trabalhe com projeções fechadas.
— Hoje, o que está contratado é que 2016 seja ainda pior que 2015. Mesmo que eu esteja errada, mesmo que as cosias mudem, do ponto de vista de sensação térmica é um quadro mais delicado. Uma coisa é contrair quando tinha ainda alguma gordura, como em 2015. Agora perdemos essa gordura — avalia a economista.
Mercado de trabalho preocupa
Claudio Frischtak, economista e sócio da Inter.B Consultoria, também está pessimista. Acha que a economia encolherá de 3,5% a 4% neste ano. Com um forte risco, portanto, de ser ainda pior que em 2015. Para ele, a situação do mercado de trabalho é preocupante. Represada em 2014, a piora no emprego foi um dos destaques negativos do ano. Só até novembro, o país perdeu 1,5 milhão de vagas formais. O especialista avalia que essa deterioração vai cobrar a conta no ano que vem, com perdas sociais que aprofundarão o quadro recessivo.
— Existe uma rede de proteção do mercado de trabalho, um pacote para amortecer a transição. Esse pacote (que inclui reservas e seguro-desemprego, por exemplo) é capaz de sustentar alguém entre três e seis meses. Mas esse colchão vai se exaurir em meados deste ano. O desemprego deve chegar a 12% — afirma.
Para Fernando Nogueira, professor do Instituto de Economia da Unicamp, há esperança por causa das mudanças da equipe econômica. Defensor de uma corrente de pensamento desenvolvimentista, Nogueira diz que o resultado das contas públicas — o rombo previsto para 2015 é de R$ 118,6 bilhões — mostra que o ajuste, como foi idealizado pelo ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, não é a melhor solução para a economia.
— Esse projeto, que priorizou cortar gastos, refletiu a queda da arrecadação fiscal. Dada a experiência que não foi bem-sucedida, a dedução óbvia é que tem que retomar o crescimento econômico. Não será possível fazer o ajuste fiscal, a não ser com um ônus de desemprego enorme, que aumentaria o desarranjo da economia — argumenta.
Seja qual for a corrente de pensamento, economistas concordam que o caminho para resolver a maior urgência do país — o desequilíbrio fiscal — está no crescimento da economia. A divergência aparece é na forma de atacar o problema. Nogueira defende reformas que busquem o consumo, sem incentivar o descontrole da economia. Ele vê na retomada do crescimento a chave para aumentar a arrecadação e, dessa forma, começar a resolver a situação das contas públicas:
— O Nelson Barbosa não vai priorizar apenas corte de gastos, mas apontará sinalização em investimento, infraestrutura e logística. Apressar as concessões, para criar um horizonte otimista.
Impacto do salário mínimo
Raul Velloso, especialista em contas públicas, destaca que muito pouco poderá ser feito ao longo deste ano para resolver o quadro fiscal. Ele criticou a decisão de aumentar o salário mínimo em 11,6%. Velloso estima que a folha de pagamento, que inclui Previdência, assistência e gasto com pessoal, representa 75% dos gastos do governo:
— Os problemas já estão contratados. Estamos caminhando para um desastre fiscal em 2016. A única coisa que o governo sinaliza é que vai brigar pela CMPF para ter vigência lá para setembro.
Para Zeina, mesmo sem melhora nos indicadores fiscais, há trabalho a ser feito. O desafio, diz, é mostrar aos investidores compromisso:
— A questão não é entregar um bom número em 2016: isso é muito improvável. Teremos déficit. Mas se (o governo) der uma sinalização boa, evita um quadro mais dramático e gera um ambiente com expectativas mais favoráveis no fim do ano. Era a intenção de Joaquim Levy no início de 2015.
Estimular a confiança é a chave para a retomada, na avaliação de Aloísio Campelo, responsável pelas sondagens do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/ FGV). Os indicadores de confiança estão nos níveis mais baixos da série histórica iniciada em 2001. Sem confiança, não há investimento, o que se reflete nos números do PIB. O indicador de investimentos cai há nove trimestres.
Campelo lembra que, por ora, as boas notícias devem vir para segmentos ligados ao mercado externo. Com o dólar alto, os produtos brasileiros ficam mais baratos e ganham competitividade no comércio internacional. As exportações respondem por 11,2% da economia brasileira.
— Quando separamos as empresas voltadas para o mercado interno e as que exportam muito, percebemos que a confiança já melhorou para o grupo que exporta muito. Mas no líquido, no total da empresa, a gente não percebe isso — analisa Campelo.
Outra boa notícia é que, para o economista, o pior já passou para o setor. A produção industrial deve cair 7,69% em 2015, segundo o Boletim Focus. Este ano, o recuo deve ser metade disso: 3,5%.
— A indústria viveu o pior dos mundos. O período de ajuste já aconteceu — afirma Campelo.
Os analistas esperam retomada rápida no caso de sinais de melhora econômicos ou na política.
— O país está louco para sair disso. A lógica do mercado é não perder o ponto de entrada — diz Frischtak.
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