- O Estado de S.Paulo
Decisões aparentemente contraditórias minam continuidade da operação
O Brasil precisa de um diploma de bacharel em Direito se quiser entender os muitos pesos e várias medidas e as decisões aparentemente contraditórias das últimas semanas determinadas pelas várias instâncias judiciais e, por vezes, dentro das mesmas cortes em relação ao andamento da Lava Jato. Afinal, quantas Lava Jato existem?
O Tribunal Regional Federal da 4.ª Região absolveu João Vaccari Neto por falta de provas numa das ações em que ele havia sido condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro. Na mesma ação, a mesma turma do TRF-4 agravou em muito a pena concedida pelo mesmo Moro a Renato Duque. Ocorre que o mesmo Duque já disse que coletava propina na Petrobrás para o PT, do qual o próprio Vaccari era tesoureiro. A diferença, para os desembargadores, é que no caso de Duque havia depósitos. Mas e se na delação – que está em curso – ele disser que repassou esses depósitos ao PT via Vaccari?
Na mesma semana, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento que manteve Edson Fachin como relator da denúncia contra Michel Temer e Rodrigo Rocha Loures. O mesmo Fachin, no entanto, retirou vários processos contra Lula, seus parentes e outros investigados das mãos do juiz Sérgio Moro – para as quais o próprio Fachin os havia remetido – por entender que não há relação com a Lava Jato. E por que no caso de Temer ela foi automática? A plateia, atônita, fica sem entender. E mesmo os bacharéis em Direito talvez tenham de fazer muita ginástica para explicar.
A Segunda Turma do STF concedeu, há mais de um mês, habeas corpus que levou à revogação da prisão de José Dirceu. Logo depois, Fachin remeteu o caso de Antonio Palocci ao plenário. Enquanto isso, na Primeira Turma, primeiro foi negado habeas corpus a Andrea Neves, irmã de Aécio. Uma semana depois, a mesma Primeira Turma soltou a mesma Andrea. O que mudou de uma semana para outra? O que distingue os casos de Dirceu e de Palocci? Afinal, a que colegiado cabe analisar habeas corpus? Ninguém sabe, ninguém diz.
Nesse Escravos de Jó processual promovido pelos senhores togados, nem a lógica parece prevalecer, quanto mais uma decisão juridicamente sólida e unificada.
Delcídio do Amaral era senador quando foi preso em flagrante sob a acusação de comprar o silêncio de Nestor Cerveró na Lava Jato e de arquitetar um tabajara plano de fuga para o ex-diretor da Petrobrás. Foi afastado do mandato e rapidamente cassado por seus pares. Aécio Neves foi gravado supostamente tramando contra a Lava Jato. Foi afastado do mandato, mas teve a prisão negada. Até aí ok: não havia o flagrante do caso Delcídio. Mas agora ele tem o mandato devolvido por outro ministro, que ainda faz elogios a sua conduta como parlamentar (!). A sociedade acha que os ministros estão fazendo alguma pegadinha.
Andrea Neves e demais investigados no caso Aécio tiveram seus processos remetidos à primeira instância pois não têm foro privilegiado. Porém, Rocha Loures segue sob os cuidados do STF, pois seu caso seria “indissociável” do de Michel Temer. Qual a diferença?
Ou as diferentes instâncias da nossa já tão lenta Justiça param de usar os atalhos da lei para justificar decisões que aos olhos dos leigos parecem contraditórias ou vão conseguir ter contra si a mesma desconfiança que já aniquilou o Executivo e o Legislativo.
Ou se determinam quais os entendimentos legais para questões como prisões preventivas, habeas corpus, prevenção de relatoria, foro e outras centrais da Lava Lato ou a maior investigação de corrupção da história do Brasil vai naufragar por si só, sem nem ser necessária nenhuma trama dos políticos.
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