O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que mercado já esperava redução de nota e cobrou apoio do Congresso para a Previdência.
Contenção de danos
Meirelles minimiza rebaixamento e cobra apoio à Previdência. Governo estuda mais corte de gastos
Martha Beck e Gabriela Valente / O Globo
BRASÍLIA - Um dia depois do rebaixamento do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P), o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, minimizou ontem os efeitos da decisão sobre a economia. Segundo ele, como o mercado já havia antecipado esse movimento, não houve impacto relevante sobre câmbio, juros e Bolsa. O país está hoje três graus abaixo do chamado grau de investimento (selo de bom pagador). Mesmo assim, o ministro aproveitou para pressionar o Congresso pela aprovação da reforma da Previdência — uma medida apontada pela S&P como essencial para o reequilíbrio fiscal.
— O dólar caiu um pouquinho, os juros de longo prazo caíram um pouco, a Bolsa está estável. Isso significa que basicamente o que a agência disse já estava nos preços. Os agentes já tinham levado tudo isso em conta no momento em que os fatos foram ocorrendo. Não há nenhuma surpresa no assunto — disse Meirelles.
O governo espera que a aprovação das mudanças no regime de aposentadorias e de medidas de ajuste fiscal — algumas que já estão no Congresso e outras que estão sendo preparadas pela equipe econômica — ajudem a reverter o rebaixamento. A redução da nota ocorreu mesmo após reunião do ministro com as agências no fim do ano passado. Entre os principais pontos citados pela S&P estão a demora na aprovação de medidas que possam resolver a crise fiscal e a incerteza política com as eleições deste ano.
NOVA VERSÃO DE PDV
Segundo técnicos do governo ouvidos pelo GLOBO, o presidente Michel Temer pediu que os ministérios da Fazenda e do Planejamento apresentem novas ações de redução de despesas, especialmente de pessoal. Uma alternativa é redesenhar o Programa de Desligamento Voluntário (PDV) dos servidores, que vai ser reeditado numa medida provisória (MP).
Segundo Meirelles, o governo está otimista com o avanço da agenda econômica no Legislativo e que a revisão da nota do país pela S&P é uma questão de tempo:
— A decisão de tudo isso me parece que será favorável. O Congresso aprovou o teto de gastos, a reforma trabalhista, a lei das estatais, a TLP (Taxa de Longo Prazo). Existe um histórico de aprovação de medidas relevantes que nos leva a continuar seguros de que essas melhoras continuarão ocorrendo e que a melhora do rating é uma questão de tempo. Continuamos confiantes que as reformas serão aprovadas.
O ministro disse que o debate sobre mudanças na regra de ouro (pela qual o governo não pode se endividar para pagar despesas correntes) — que provocou polêmica no mercado financeiro na última semana — não foi relevante para a decisão da S&P. Segundo Meirelles, já ficou claro que não há intenção de fazer um relaxamento na política fiscal. A ideia em debate na área econômica, disse ele, é criar um mecanismo de autocorreção que seria acionado quando a regra for descumprida:
— A regra de ouro não foi fator relevante (para a decisão da S&P). Isso está mais ou menos claro. Não há nenhuma intenção de relaxamento do controle fiscal. O que estamos discutindo é uma atualização da regra de ouro com a adoção de medidas de autocorreção — disse ele, acrescentando: — Todos estamos de acordo de que haja ajuste (na regra) em função do crescimento das despesas nos últimos anos. O importante é que está mantido o compromisso de fazer com que os mecanismos de controle sejam mais eficazes.
O debate sobre a regra de ouro, no entanto, acabou provocando um mal-estar entre governo e Congresso, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), dizendo que não colocará em votação qualquer proposta de mudança na norma. Diante do quadro, Temer preferiu adiar a discussão e pediu aos técnicos mais ações de controle de despesas.
Com isso, surgiu a ideia de que o novo PDV tenha limite de idade menor. Isso incentivaria a saída de mais pessoas do serviço público. Está em estudo também a reedição da MP 788, que prevê o resgate de valores pagos a falecidos de forma indevida.
Há, ainda, uma estimativa dentro do governo de que há R$ 15 bilhões por ano em desperdício por causa de sobrepreço em compras de materiais e serviços pelo governo federal. Assim, contratos com fornecedores poderiam ser renegociados.
Segundo interlocutores do Planalto, o presidente teria ficado irritado com o movimento da equipe econômica de querer debater a regra de ouro sem seu aval:
— Não dá para ter essa discussão sem o aval do presidente. Essa não era uma discussão para ser feita neste momento e dessa forma — disse um auxiliar de Temer.
Embora tenha minimizado a decisão da S&P, Meirelles trabalhou para tentar evitar o rebaixamento do país. Em dezembro, logo que o Congresso anunciou que a votação da reforma da Previdência seria adiada e ficaria para fevereiro de 2018, o ministro marcou conversas com as três principais agências de classificação de risco — S&P, Fitch e Moody’s — para manter o rating do país. Na época, ele argumentou que o adiamento aumentaria as chances de aprovação do texto, pois daria ao governo mais tempo para convencer parlamentares indecisos e contrários à proposta.
PAÍS PERDEU SELO DE BOM PAGADOR EM 2015
Ontem, perguntado se teria fracassado na tarefa, o ministro da Fazenda afirmou que faz o seu trabalho, enquanto as agências fazem o delas. Ele destacou ainda que a S&P deixou a perspectiva da nota brasileira estável. Segundo técnicos do governo, isso indica que não haverá novo rebaixamento por um período de 12 meses.
— Existiu de fato uma certa expectativa de alguns que todas as agências iriam fazer um downgrade imediatamente depois do adiamento da reforma da Previdência. Conversamos com as agências, elas entenderam, não houve essa movimentação, que é exatamente o correto. No caso da S&P, fizeram uma série de avaliações, e levou isso como um dos aspectos. Eles fizeram o movimento, mas já deixaram claras as condições para voltarem a subir o rating e não só um, mas mais de um degrau, para voltarmos ao investment grade (selo de bom pagador), que já tivemos — disse Meirelles. — Seguindo na atual direção, o Brasil será novamente investment grade, que é a situação normal de um país que cada vez mais tem um compromisso fiscal.
O Brasil perdeu o selo de bom pagador no fim de 2015, depois de o governo ter enviado ao Congresso a proposta orçamentária prevendo um rombo nas contas públicas. A primeira a tirar o grau de investimento do Brasil foi a S&P, depois seguida pelas demais. Como principal motivo para a retirada do grau de investimento do país, as agências apontam a deterioração das contas públicas, o aumento do endividamento público e a preocupação com a retomada do crescimento da economia.
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