- O Estado de S.Paulo
Não se faz ajuste sem dor e muito menos sem medidas impopulares
É bizarra a narrativa que as principais lideranças do Congresso tentaram construir logo após o emblemático rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s. É o primeiro downgrade do presidente Michel Temer e tudo indica não será o único a depender a reação dos caciques políticos da base governista. Menos um degrau o Brasil vai se juntar aos países de risco altamente especulativo para os investidores internacionais.
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Eunício Oliveira, correram para acusar o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de ter responsabilizado o Congresso pela queda da avaliação do País. Maia chegou a dizer que estava “magoado” e Eunício afirmou (sem contar com a memória) que o Congresso ultrapassou “todos os limites” para entregar o que a equipe econômica pedia.
Os dois dirigentes do Parlamento brasileiro e todos os senadores e deputados que se manifestaram ressentidos com Meirelles esqueceram de falar que foi a própria agência que culpou o Congresso pela incertezas em relação aos rumos da economia por conta dos desequilíbrios fiscais.
O tucano Marcus Pestana (MG) foi quem melhor resumiu o quadro sem pudores. Disse que a classificação de risco que interessa à esmagadora maioria dos deputados é o risco eleitoral.
A agência foi clara. Relembrando: o relatório da S&P diz que, apesar dos vários avanços, o governo não conseguiu apoio no Congresso para fortalecer a trajetória fiscal. E mais: O Congresso é complacente e não aprova as reformas e as medidas fiscais.
Não se trata somente do adiamento da reforma da Previdência. Mas também de todo o titubeio que os parlamentares têm manifestado em torno do enfrentamento da crise fiscal.
Em entrevista a Ricardo Leopoldo, correspondente do Estadão/Broadcast em Nova York, Lisa Schineller, diretora da S&P, afirmou com todas as letras que a redução da nota soberana do País não foi provocada exclusivamente pela não aprovação da reforma da Previdência Social pelo Congresso em dezembro, mas mais pelo padrão adotado, sobretudo, pela classe política de não se unir para combater problemas estruturais vitais na área fiscal.
Não se faz ajuste sem dor e muito menos sem medidas impopulares e pressão por aumentos de gastos. Há um descompasso sem solução em um Congresso que barra as tentativas de redução de gastos e ao mesmo tempo o aumento de tributos, inclusive para os brasileiros mais ricos do Brasil com aplicações em fundos exclusivíssimos de investimentos.
Até a noite da ultima quinta-feira, 11, quando a S&P anunciou o rebaixamento, a equipe econômica estava conseguindo postergar o downgrade lançando mão de uma série de “ativos” positivos. Eles vinham funcionando como um choque de expectativas a cada revés da política fiscal. Uma hora o encaminhamento de uma proposta dura de reforma da Previdência e a liberação das contas inativas do FGTS para ajudar na retomada. Outra hora a reforma trabalhista e o pacote fiscal com medidas de aperto nas despesas de pessoal.
Depois do adiamento da reforma da Previdência para 2018, o governo tinha em mãos um baita ativo, a divulgação no final do mês do resultado das contas públicas no ano passado, com a redução em cerca de R$ 40 bilhões do déficit previsto. O crescimento mais forte da economia era outro trunfo do governo como também a inflação e juros mais baixos.
Não deu certo. A S&P não quis esperar depois do acirramento do jogo político para as eleições entre os aliados que transformaram o ministro Meirelles em alvo. Candidato a candidato à presidência da República, o ministro não foi poupado de um ataque especulativo nem mesmo pelo presidente Temer.
Na tentativa de se colocar como o comandante do processo de escolha do candidato do centro às eleições, o presidente rifou Meirelles ao dizer para o Estado que o preferia no Ministério da Fazenda, descartando seu nome para o Palácio do Planalto nas eleições deste ano.
Até discreto nas repostas aos ataques e evitando o confronto, Meirelles pode dar o troco. Endurecer o discurso fiscal e cobrar mais do Palácio do Planalto. Se Meirelles revidar e for mais rigoroso com o ajuste, ele pode colocar o presidente Temer numa saia-justa em ano eleitoral.
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