- Folha de S. Paulo
Com provável vitória de Bolsonaro, turma dos meio-liberais está em vias de chegar ao poder
No país da meia-entrada, não surpreende que prosperem também os meio-liberais, a turma que aceita os postulados do liberalismo na economia, mas os rejeita nas outras esferas da vida. Esse pessoal está em vias de chegar ao poder, com a provável vitória de Jair Bolsonaro.
Como liberal pleno, acredito que cada um deve ser tão livre quanto possível para fazer o que quiser, o que inclui misturar manga com leite, marxismo com teologia cristã e liberalismo com autoritarismo. Julgo, porém, que, em situações assim, é nosso dever apontar as contradições que tornam essas combinações incongruentes. Analisemos o caso de nossos meio-liberais.
O liberalismo aparece em diversos tamanhos e sabores. Inclui desde Kant até Stuart Mill, passando por Rawls e Keynes. De comum, todos eles fazem uma aposta metafísica na liberdade do indivíduo, seja como valor intrínseco, seja como ferramenta para resolver problemas.
No caso da economia, temos evidências de que a aposta instrumental é correta. Sistemas de mercado, em que cada agente atua de forma mais ou menos livre, funcionam melhor do que as economias organizadas por um planejador central.
E não temos nenhuma razão física ou metafísica para restringir ao campo da economia a aposta na liberdade. É no mínimo exótico achar que o indivíduo é o melhor juiz para escolher qual carreira ele deve seguir e onde vai vender seus produtos, mas não para decidir como e com quem vai fazer sexo consensual, que substâncias ingerirá e que livros poderá ler.
O meio-liberal que defende ou tolera restrições à liberdade sexual, intromissões do Estado na privacidade e censura precisa no mínimo explicar por que a aposta que ele exalta na economia não valeria para as outras dimensões da vida. Em outras palavras, precisa explicar como concilia seu liberalismo econômico com o iliberalismo comportamental tão escancarado na agenda de seu candidato.
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